E aí pessoal, tudo certo?

Completamos nessa semana 10 anos da Lei 11.340/2006 (Lei da Maria da Penha) e alguns entendimentos já foram comentados por mim aqui no blog. Essa lei – que surgiu sob muita polêmica (ainda existente, porém em menor grau) e questionamentos quanto a sua constitucionalidade – é muito relevante da tessitura legal criminal dentro da ordem jurídica brasileira.

Pedro, você poderia lembrar quem foi a Maria da Penha e por qual razão essa lei recebe essa alcunha? Claro.

 A Lei 11.340/2006 inseriu no sistema jurídico pátrio o que se passou a chamar de microssistema protetivo específico para as mulheres e a Maria da Penha, com sua história e batalha para a superação da violência de gênero, foi muito importante para a efetivação dessa proteção legislativa. É que, em 1983, ela foi agredida enquanto dormia, tendo sido alvejada por disparo de espingarda executado pelo seu então marido, resultando em invalidez física (tetraplegia), tendo ainda sofrido outras agressões. Nesse caminhar, o autor dos delitos fora denunciado em 1984, mas, pela lentidão do sistema de persecução criminal, somente fora preso em 2002. Diante dessa evidente violação de direitos humanos, os fatos foram levados à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, tendo resultado no Relatório 54/2001[1]. A partir dele, 5 anos mais tarde, adveio a Lei 11.340/2006 visando a coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

Em razão da data especial, sempre atentando aos alunos e aqueles que nos acompanham pelo blog e pelas redes sociais, resolvi selecionar – dentre os julgados disponibilizados no “Jurisprudências em Teses” do STJ – os 10 principais entendimentos sobre a Lei Maria da Penha!

 Um entendimento para cada aniversário! Um deles vai cair na sua prova, tenho certeza! Espero que gostem! Vamos a eles:

(1) A Lei nº 11.340/2006, denominada Lei Maria da Penha, objetiva proteger a mulher da violência doméstica e familiar que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico, e dano moral ou patrimonial, desde que o crime seja cometido no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto.

(2) A Lei Maria da Penha atribuiu às uniões homoafetivas o caráter de entidade familiar, ao prever, no seu artigo 5º, parágrafo único, que as relações pessoais mencionadas naquele dispositivo independem de orientação sexual (REsp 1183378/RS).

(3) O sujeito passivo da violência doméstica objeto da Lei Maria da Penha é a mulher, já o sujeito ativo pode ser tanto o homem quanto a mulher, desde que fique caracterizado o vínculo de relação doméstica, familiar ou de afetividade, além da convivência, com ou sem coabitação.

(4) Para a aplicação da Lei n. 11.340/2006, há necessidade de demonstração da situação de vulnerabilidade ou hipossuficiência da mulher, numa perspectiva de gênero (AgRg no REsp 1430724/RJ,Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Julgado em 17/03/2015,DJE 24/03/2015).

(5) A agressão do namorado contra a namorada, mesmo cessado o relacionamento, MAS QUE OCORRA EM DECORRÊNCIA DELE, está inserida na hipótese do art. 5º, III, da Lei n. 11.340/06, caracterizando a violência doméstica (REsp 1416580/RJ,Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA,Julgado em 01/04/2014,DJE 15/04/2014).

(6) Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher têm competência cumulativa para o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do art. 14, da Lei n. 11.340/2006.

(7) O descumprimento de medida protetiva de urgência não configura o crime de desobediência, em face da existência de outras sanções previstas no ordenamento jurídico para a hipótese.

(8) Não é possível a aplicação dos princípios da insignificância e da bagatela imprópria nos delitos praticados com violência ou grave ameaça no âmbito das relações domésticas e familiares.

(9) O crime de lesão corporal, ainda que leve ou culposo, praticado contra a mulher no âmbito das relações domésticas e familiares, deve ser processado mediante ação penal pública incondicionada.

(10) Nos crimes praticados no âmbito doméstico e familiar, a palavra da vítima tem especial relevância para fundamentar o recebimento da denúncia ou a condenação, pois normalmente são cometidos sem testemunhas.

Espero que tenham gostado! Vamos em frente!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal

https://www.facebook.com/Profpedrocoelho/

 

[1] Em 2001 a Comissão emitiu o relatório nº 54/2001responsabilizando o Brasil por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica contra as mulheres. Entenderam que a violação seguia um padrão discriminatório em razão da violência doméstica contra mulheres no Brasil. Dessa forma, foram feitas recomendações ao Estado Brasileiro, a saber:

  1. Completar rápida e efetivamente o processamento penal do responsável pela agressão;
  2. Realizar uma investigação séria, imparcial e exaustiva para apurar as irregularidades e atrasos injustificados que não permitiram o processamento rápido e efetivo do responsável;
  3. Adotar, sem prejuízo das ações que possam ser instauradas contra o agressor, medidas necessárias para que o Brasil assegure à vítima uma reparação simbólica e material pelas violações;
  4. Prosseguir e intensificar o processo de reforma para evitar a tolerância estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica;
  5. Medidas de capacitação/sensibilização dos funcionários judiciais/policiais especializados para que compreendam a importância de não tolerar a violência doméstica;
  6. Simplificar os procedimentos judiciais penais;
  7. O estabelecimento de formas alternativas às judiciais, rápidas e efetivas de solução de conflitos intrafamiliares;
  8. Multiplicar o número de delegacias policiais especiais para a defesa dos direitos da mulher e dotá-las dos recursos especiais necessários, bem como prestar apoio ao MP na preparação de seus informes judiciais;
  9. Incluir em seus planos pedagógicos unidades curriculares destinadas à compreensão da importância do respeito à mulher e a seus direitos reconhecidos na Convenção de Belém do Pará;
  10. Apresentar à Comissão, dentro do prazo de 60 dias – contados da transmissão do documento ao Estado, um relatório sobre o cumprimento destas recomendações para os efeitos previstos no artigo 51(1) da Convenção Americana;