João Paulo Lawall Valle é Advogado da União

Professor da EBEJI

ebeji

Prezados Alunos,

O Direito Processual Civil é uma matéria com grandes chances de ser cobrada com profundidade na prova da segunda fase para os cargos de Advogado da União e Procurador da Fazenda Nacional. A cobrança deverá ser mais ampla do que apenas o desenvolvimento da peça processual. Por este motivo estudar os temas e os precedentes afetos ao Processo Civil é providência urgente para todos que pretendam ter sucesso nos certames.

Imaginemos que a banca faça a segunda pergunta: é possível que o valor de multa cominatória exigido seja superior ao montante da obrigação principal?

A solução desta questão passa, sobretudo, pelo conhecimento da jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema. Vejamos como o STJ decidiu em decisão veiculada no Informativo 562:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXEQUIBILIDADE DE MULTA COMINATÓRIA DE VALOR SUPERIOR AO DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL.

O valor de multa cominatória pode ser exigido em montante superior ao da obrigação principal. O objetivo da astreinte não é constranger o réu a pagar o valor da multa, mas forçá-lo a cumprir a obrigação específica. Dessa forma, o valor da multa diária deve ser o bastante para inibir o devedor que descumpre decisão judicial, educando-o. Nesse passo, é lícito ao juiz, adotando os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, limitar o valor da astreinte, a fim de evitar o enriquecimento sem causa, nos termos do § 6º do art. 461 do CPC. Nessa medida, a apuração da razoabilidade e da proporcionalidade do valor da multa diária deve ser verificada no momento de sua fixação em cotejo com o valor da obrigação principal. Com efeito, a redução do montante total a título de astreinte, quando superior ao valor da obrigação principal, acaba por prestigiar a conduta de recalcitrância do devedor em cumprir as decisões judiciais, bem como estimula a interposição de recursos com esse fim, em total desprestígio da atividade jurisdicional das instâncias ordinárias. Em suma, deve-se ter em conta o valor da multa diária inicialmente fixada e não o montante total alcançado em razão da demora no cumprimento da decisão. Portanto, a fim de desestimular a conduta recalcitrante do devedor em cumprir decisão judicial, é possível se exigir valor de multa cominatória superior ao montante da obrigação principal. REsp 1.352.426-GO, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 5/5/2015, DJe 18/5/2015.

O fundamento legal para esta decisão está nos seguintes artigos do Código de Processo Civil vigente:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

  • 4oO juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
  • 5oPara a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

Cabe destacar que os §4º e §5º acima transcritos aplica-se tanto para as decisões que cominem obrigação de fazer ou não fazer (Art. 461 CPC), como para as que determinem a entrega de coisa (Art. 461-A CPC).

É bom destacar que a multa cominatória ou astreinte tem a finalidade de pressionar o devedor a cumprir a decisão judicial, sendo um meio de coerção indireta adotada pelo judiciário para ver as suas decisões cumpridas. A mesma não tem qualquer finalidade indenizatória ou ressarcitória, sendo a mesma imposta com a única finalidade de forçar o devedor a cumprir a obrigação imposta na decisão judicial.

Ou seja, diante de uma decisão judicial descumprida (ou mesmo antes do descumprimento, servindo como meio de coerção prévio ao cumprimento da decisão judicial) o Poder Judiciário tem a sua disposição a aplicação da multa para o devedor, sendo que o valor devido a título de astreintes será, conforme jurisprudência também do STJ, revertido para a parte vencedora do processo.

Por último destaco a inteligência do §6º do artigo 461, que assim determina:

  • 6oO juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.

Ou seja, o Código de Processo Civil entrega para o julgador outra importante atribuição, qual seja, analisar a proporcionalidade da multa e o seu poder de coerção, podendo o juiz modificar tanta a periodicidade da mesma, como o seu valor, buscando sempre que esta coerção atinja a sua finalidade, qual seja esta, que a parte cumpra com o que foi decidido.

Pois bem. A resposta para a indagação feita acima é positiva. É possível sim que o valor da multa cominatória atinja patamar superior ao valor da obrigação principal, sendo devido à parte vencedora do processo tanto o bem da vida pretendido inicialmente como o valor da multa arbitrada. Destaco, ainda, o dever do Poder Judiciário de estar atento à proporcionalidade da multa para, no caso concreto, reduzi-la ou amplia-la buscando, antes de tudo, a prestação da tutela jurisdicional adequada.

Bons Estudos!!!!

João Paulo Lawall Valle