Pedro Coelho é Defensor Público Federal

Professor da EBEJI

EBEJI

Prezados leitores, tudo bem?

Hoje, tratarei de um tema importantíssimo, vinculado ao conflito de atribuições envolvendo especificamente o Ministério Público, cujo entendimento majoritário foi alterado em recente deliberação exarada pelo Supremo Tribunal Federal, especificamente no julgamento da ACO 924/MG, Rel. Min. Luiz Fux, em maio de 2016.

Por se tratar de um tema bastante peculiar e delicado, entendo pertinente fazermos uma rápida revisão de conceitos e pressupostos necessários para a efetiva compreensão da antiga posição e do recente e novo entendimento do STF.

Ao tentar analisar um conflito de atribuições NÃO podemos nos confundir com o conflito de competências! Enquanto esse último envolve a divergência de dois ou mais juízes, o conflito de atribuições se dá entre um órgão judicial e outro administrativo ou simplesmente entre órgãos administrativos!

Pedro, pode dar um exemplo para ficar mais evidente?

Claro! O exemplo, aliás, será essencial para a compreensão da controvérsia! Se o conflito entre um juiz federal e um juiz de direito (estadual) representa um conflito de competências (exatamente por envolver 2 ou mais órgãos judiciais, que detêm competência), a divergência instaurada entre o membro do Ministério Público Federal e o do Ministério Público estadual – que não ostentam “competência” tecnicamente falando – exemplifica um típico conflito de ATRIBUIÇÕES!

Em nossas aulas de processo penal aqui da EBEJI, nós estudamos detidamente esses conflitos de atribuição envolvendo membros do Ministério Público e, de maneira simplificada, assim podíamos indicar a realidade sobre quem resolveria tais conflitos, variando de acordo com os “MP´s” envolvidos! Vejamos como ERA:

  • (a) MPF com atuação no município/estado X x MPF com atuação no município/estado Y? É resolvido pela Câmara de Coordenação e Revisão do MPF (Art. 62, VII da LC 75/93);
  • (b) Conflito entre “braços” diferentes do MPU (MPT, MPF, MPM): É resolvido pelo PGR (art. 26, VII da LC 75/93);
  • (c) MP de um Estado x MP do mesmo Estado: É resolvido pelo Procurador Geral de Justiça (art. 10, X da Lei nº 8.625/93);

Você (provavelmente) deve estar se perguntando: Tudo bem, Pedro! Mas e o conflito entre MPF e MPE? E entre Ministérios Públicos de Estados diferentes?

É AQUI QUE HOUVE MUDANÇA DE ENTENDIMENTO!

Até meados de maio de 2016, conforme sempre destacava nas aulas, as mencionadas situações tinham duas posições divergentes de destaque apontando para o responsável pela resolução do conflito. De maneira minoritária, e por todos podíamos apontar o professor Eugênio Pacelli, deveria haver o chamado conflito virtual de competência. Assim, deveria haver a virtual imaginação de efetiva atuação entre os respectivos juízos, razão pela qual para a resposta desse questionamento deveríamos (pres)supor o conflito de competência. Em se tratando de um conflito entre MP/MG e MP/PE, deveríamos virtualizar um conflito de competência entre TJ/MG e TJ/PE, razão pela qual caberia ao STJ dirimir o conflito.

Contudo, a POSIÇÃO QUE SEMPRE PREVALECEU no STF era a de que os Ministérios Públicos representariam o próprio ente federativo aos quais estavam vinculados. Um conflito entre MPE´s diversos ou entre um MPE e MPF seria na verdade um conflito entre estados da federação ou entre Estado e União. Dessa maneira, de acordo com o artigo 102, I, f da Constituição, caberia ao STF resolver o referido conflito, já que cabe à Suprema Corte processar e julgar originariamente as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta”. Nesse sentido, vale conferir o precedente ACO 853[1].

Compreendida a histórica e clássica compreensão do STF sobre a matéria, qual foi a grande guinada no entendimento? De quem seria a responsabilidade agora de resolver conflitos entre MPE´s diversos ou entre MPE e MPF?

A partir do julgamento de ACO 924/MG (publicação ainda pendente) o Supremo Tribunal Federal, modificando seu anterior entendimento, consolidou a compreensão de que os conflitos de atribuição entre MPF e MPE´s não mais deverão ser solucionados pelo STF, tampouco pelo STJ! A atribuição para a solução da controvérsia é do PROCURADOR GERAL da REPÚBLICA (PGR).

Apesar de o PGR não ser chefe institucional dos demais MPE´s, mas apenas do MPU, tais conflitos de atribuição seriam interna corporis e, portanto, deveria ser resolvidos à luz do postulado da unidade e indivisibilidade. Ademais, conforme destacou o Ministro Relator, não há que se cogitar dessa conclusão qualquer superioridade hierárquica do MPU em detrimentos aos MPE´s. Para justificar seu raciocínio, o ministro se valeu analogicamente da Súmula 150 do STJ pela qual se extrai que compete ao juiz federal dizer se há interesse ou não da União em determinado processo judicial.

Apesar da série de argumentos levantados, particularmente, não me convence qualquer deles! Inclusive, há evidências que as razões de fato da modificação do entendimento se deu por questões outras, como a superlotação da pauta dos Ministros da Corte! De toda forma, você precisa atentar para o seguinte fato: a partir de agora, veja como solucionar as seguintes situações:

  • (i) Conflito entre MPF e MPE – de acordo com o novo entendimento do STF, a solução deverá se dar pelo PGR;
  • (ii) Conflito entre MPE´s de diferentes unidades da federação – de acordo com o novo entendimento do STF, a solução deverá se dar pelo PGR.

Espero que tenham entendido e gostado! Vamos em frente!

Grande abraço,

Pedro Coelho – Defensor Público Federal

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[1] EMENTA: 1. COMPETÊNCIA. Atribuições do Ministério Público. Conflito negativo entre MP federal e estadual. Feito da competência do Supremo Tribunal Federal. Conflito conhecido. Precedentes. Aplicação do art. 102, I, “f”, da CF. Compete ao Supremo Tribunal Federal dirimir conflito negativo de atribuição entre o Ministério Público federal e o Ministério Público estadual. 2. COMPETÊNCIA CRIMINAL. Atribuições do Ministério Público. Ação penal. Formação de opinio delicti e apresentação de eventual denúncia. Fatos investigados atribuídos a ex-Governador de Estado. Incompetência do Superior Tribunal de Justiça. Matéria de atribuição do Ministério Público estadual. Inconstitucionalidade dos §§ do art. 84 do CPP, introduzidos pela Lei n° 10.628/2002. Conflito negativo de atribuição conhecido. É da atribuição do Ministério Público estadual analisar procedimento de investigação de atos supostamente delituosos atribuídos a ex-Governador e emitir a respeito opinio delicti, promovendo, ou não, ação penal. (ACO 853, Relator(a):  Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 08/03/2007, DJe-004 DIVULG 26-04-2007 PUBLIC 27-04-2007 DJ 27-04-2007 PP-00056 EMENT VOL-02273-01 PP-00025 RTJ VOL-00202-01 PP-00032 RT v. 96, n. 863, 2007, p. 485-488 RMP n. 33, 2009, p. 185-189).