Frederico Rios Paula é Procurador Federal e

Professor da EBEJI

EBEJI

Prezados,

Neste final de semana, foram realizadas as provas discursivas do concurso para o cargo de Advogado da União, segunda etapa do certame.

 A EBEJI, auxiliando os candidatos nesta etapa tão relevante, através de seus professores, analisou as provas e traz os comentários sobre as questões.

Prova P2

Questão 3

A questão aborda o tópico do ponto 10 (“unidades de conservação.”) de Direito Ambiental do EDITAL Nº 1 – AGU, de 13 de julho de 2015, especificamente o art. 225, § 1º, III, da Constituição Federal e a Lei n.º 9.985/2000, tendo certa semelhança com o item 90 da P1 (prova objetiva).

O candidato deveria redigir um texto dissertativo que atendesse as seguintes determinações e questionamentos:

  • Apresente a definição legal de parque nacional, os objetivos desse tipo de unidade de conservação e as atividades nele permitidas [valor 1,50 ponto]
  • Aponte o dispositivo constitucional relativo ao dever do poder público na definição de espaços territoriais especialmente protegidos [valor: 2,00 pontos]
  • Indique o instrumento jurídico-normativo adequado à ampliação de parque nacional e esclareça se há necessidade de realização de consulta prévia para formalizar essa ampliação [valor: 3,00 pontos]
  • Há possibilidade de inclusão, nos novos limites de parque nacional amplificado, do subsolo e de uma zona de amortecimento em seu entorno? Justifique sua resposta [valor: 3,00 pontos]

A sensação é, mais uma vez, de dever cumprido! A questão foi tangenciada nas rodadas do GEAGU.

Além disso, abordei a temática especificamente em publicação no Blog da EBEJI, que pode ser acessada pelo seguinte link: https://blog.ebeji.com.br/a-alteracao-do-regime-juridico-dos-espacos-territoriais-especialmente-protegidos-esta-sujeita-ao-principio-da-reserva-da-lei/

Vamos aos comentários de cada um dos quatro pontos.

EBEJI

Ponto 1: Apresente a definição legal de parque nacional, os objetivos desse tipo de unidade de conservação e as atividades nele permitidas.

O primeiro ponto exige do candidato conhecimento da chamada “letra da lei”, bastando a consulta e a transcrição indireta dos dispositivos da Lei n.º 9.985/2000, que regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII, da Constituição Federal, e institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC.

O Parque Nacional, espaço territorial especialmente protegido, é uma categoria que compõe o grupo de Unidades de Conservação de proteção integral, cujo objetivo é preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, aquele que não envolve consumo, coleta, dano ou destruição. No art. 11, a referida Lei traz a definição legal, os objetivos e as atividades permitidas referentes à essa unidade:

“Art. 11. O Parque Nacional tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.

1oO Parque Nacional é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.

2oA visitação pública está sujeita às normas e restrições estabelecidas no Plano de Manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração, e àquelas previstas em regulamento.

3oA pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em regulamento.

4oAs unidades dessa categoria, quando criadas pelo Estado ou Município, serão denominadas, respectivamente, Parque Estadual e Parque Natural Municipal.”

EBEJI

Ponto 2: Aponte o dispositivo constitucional relativo ao dever do poder público na definição de espaços territoriais especialmente protegidos.

Para assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a Constituição Federal atribui, no art. 225, § 1°, III, a incumbência ao Poder Público de definir espaços territoriais especialmente protegidos:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

1º – Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

(…);

III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;”

EBEJI

Ponto 3: Indique o instrumento jurídico-normativo adequado à ampliação de parque nacional e esclareça se há necessidade de realização de consulta prévia para formalizar essa ampliação.

De acordo com o regramento constitucional acima referenciado, a DELIMITAÇÃO (ou a criação) dos espaços territoriais especialmente protegidos pode ser feita por lei ou por decreto. Já a ALTERAÇÃO e a SUPRESSÃO de seu regime jurídico estão sujeitas ao princípio da reserva da lei.

Ocorre que a Lei n.º 9.985/2000, que regulamenta a matéria no âmbito do Sistema Nacional de Unidade de Conservação, assim dispõe:

“Art. 22. As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público.

1o(VETADO)

2oA criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento.

3oNo processo de consulta de que trata o § 2o, o Poder Público é obrigado a fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local e a outras partes interessadas.

4oNa criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é obrigatória a consulta de que trata o § 2odeste artigo.

5oAs unidades de conservação do grupo de Uso Sustentável podem ser transformadas total ou parcialmente em unidades do grupo de Proteção Integral, por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a unidade, desde que obedecidos os procedimentos de consulta estabelecidos no § 2odeste artigo.

6oA ampliação dos limites de uma unidade de conservação, sem modificação dos seus limites originais, exceto pelo acréscimo proposto, pode ser feita por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a unidade, desde que obedecidos os procedimentos de consulta estabelecidos no § 2odeste artigo.

7oA desafetação ou redução dos limites de uma unidade de conservação só pode ser feita mediante lei específica.”

Em que pese a literalidade do inciso III do §1º do art. 225 da Constituição Federal, a Lei n.º 9.985/2000, nos §§ 5° e 6° do art. 22, prevê a possibilidade de alteração do regime jurídico de um dos espaços territoriais especialmente protegidos, qual seja, a Unidade de Conservação da Natureza, no caso o Parque Nacional, por outros instrumentos normativos que não a lei em sentido estrito, desde que seja para ampliação da proteção ambiental.

Assim, segundo o regramento legal específico, se uma Unidade de Conservação foi criada por decreto pode ser feito por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que a criou, isto é, por decreto: i) a alteração do regime jurídico com sua transformação, total ou parcial, de uso sustentável em de proteção integral; e ii) a ampliação de sua área sem a modificação de seus limites originais.

Portanto, a alteração do regime jurídico de Unidade de Conservação, isto é, a transformação de um grupo menos protetivo (de uso sustentável) para outro mais protetivo (de proteção integral), pode ser feita por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que a criou (decreto, por exemplo), não sendo exigido lei em sentido estrito.

a ampliação dos limites de uma Unidade de Conservação por decreto somente é admitida quando há estrita manutenção de sua limitação originária. Isso porque, pode ocorrer a situação em que haja ampliação da área total de uma Unidade de Conservação via supressão de parcela de sua área originária e compensação da parte suprimida com a nova área acrescida. Nesse caso em que há supressão de parte da área da UC original, a referida alteração somente será permitida através de lei específica, na forma do § 7° do referido dispositivo legal.

Ademais, a ampliação dos limites de uma unidade de conservação, sem modificação dos seus limites originais, no caso o Parque Nacional, está condicionada a realização de consulta pública que permitam identificar a localização a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, conforme determinado na parte final do § 6º em referência ao § 2º.

EBEJI

Ponto 4: Há possibilidade de inclusão, nos novos limites de parque nacional amplificado, do subsolo e de uma zona de amortecimento em seu entorno?

Outro ponto que exige do candidato conhecimento de “letra da lei”, especificamente dos arts. 24 e 25 da Lei n.º 9.985/20005:

“Art. 24. O subsolo e o espaço aéreo, sempre que influírem na estabilidade do ecossistema, integram os limites das unidades de conservação. 

Art. 25. As unidades de conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e Reserva Particular do Patrimônio Natural, devem possuir uma zona de amortecimento e, quando conveniente, corredores ecológicos.”

Verifica-se que há possibilidade de inclusão, nos novos limites do Parque Nacional amplificado, do subsolo, se este influir na estabilidade do ecossistema protegido (art. 24).

Igualmente, é possível incluir uma zona de amortecimento em seu entorno, por expresso mandamento legal (art. 25). A ruptura entre o meio ambiente natural, protegido pela UC, e o meio ambiente externo deve ser gradativa. Essa é a principal função da zona de amortecimento, área que circunda as unidades e que, devido ao seu relevante papel, também é protegida. Vale ressaltar que a zona de amortecimento não faz parte da Unidade de Conservação, mas fica sujeita a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre ela (art. 2º, XVIII).

Frederico Rios Paula, Procurador Federal