Intervenção de Terceiros entre Entes Federativos – Chamamento ao processo

Quando o Estado aparta-se da autopreservação do seu microssistema nefário.

 

A Intervenção de Terceiro sem dúvida é o tema mais complexo do códex de rito, vez que permite várias interpretações, o que por si representa um risco a segurança jurídica.

Poderíamos a título exemplificativo questionar o leitor se o mesmo tem absoluta certeza da diferença entre os institutos contidos no tema ora tratado, quais sejam:

  •  Assistência:
  • Oposição;
  • Nomeação à Autoria;
  • Denunciação à Lide;
  • Chamamento ao Processo.

De forma objetiva os livros trazem a denominação de cada um, induzindo acreditar que os institutos são de fácil tratamento.

Ainda que seja um tema muito interessante, trataremos apenas o contido no art. 77, III do CPC:

“Art. 77. É admissível o chamamento ao processo:

(…)

III – de todos os devedores solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns deles, parcial ou totalmente, a dívida comum.” (sem grifos no original)

Este instituto é um direito do réu, quando por uma dívida comum, for demandado de forma unitário.

Desta feita, em busca da economia processual o devedor solidário não demandado, poderia ser chamado ao processo, para que de forma solidaria fosse condenado; ou até mesmo o réu originário possa saldar a dívida e ter para si um título executivo.  (ASSIS, Araken de. Manual do Processo de Execução. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.)

Outrossim, a Constituição Federal aduz:

“Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.” (sem grifos no original)

Por corolário lógico, considerando que a Constituição afirma ser um dever do Estado em seu sentido lato, de forma objetiva trouxe a solidariedade para todas todos os entes, União, Distrito Federa, Estado e Município.

Isto é, a aplicação do art. 77,III do CPC estar-se-ia amplamente observada, se não fosse uma norma maior, o art. 5 em seu caput:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:” (sem grifos no original)

Destarte, o ente público, ainda que não tenha criado com este fim o seu sistema de autopreservação, popularmente conhecido como meio oficial de protelar os direitos dos cidadãos, quando trata a vida humana, em um lapso de justiça afasta a técnica pura, com o fito de aplicar aquilo que por sua exegese deveria ser a regra, como podemos observar neste acordão do Superior Tribunal de Justiça, no qual afastou aplicação do art. 77, III do CPC:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CHAMAMENTO AO PROCESSO EM AÇÃO DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO MOVIDA CONTRA ENTE FEDERATIVO. RECURSO REPE-TITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ) Não é adequado o chamamento ao processo (art. 77, III, do CPC) da União em demanda que verse sobre fornecimento de medicamento proposta contra outro ente federativo. Com efeito, o instituto do chamamento ao processo é típico das obrigações solidárias de pagar quantia. Entretanto, a situação aqui controvertida representa obrigação solidária entre os Municípios, os Estados, o Distrito Federal e a União, concernente à prestação específica de fornecimento de medicamento. Neste contexto, por se tratar de hipótese excepcional de formação de litisconsórcio passivo facultativo, não se admite interpretação extensiva do referido instituto jurídico para alcançar prestação de entrega de coisa certa. Além do mais, a jurisprudência do STJ e do STF assentou o entendimento de que o chamamento ao processo (art. 77, III, do CPC) não é adequado às ações que tratam de fornecimento de medicamentos, por ser obstáculo inútil ao cidadão que busca garantir seu direito fundamental à saúde. Precedentes citados do STJ: AgRg no AREsp 13.266-SC, Segunda Turma, DJe 4/11/2011; e AgRg no Ag 1.310.184-SC, Primeira Turma, DJe 9/4/2012. Precedente do STF: RE 607.381 AgR-SC, Primeira Turma, DJe 17/6/2011. REsp 1.203.244-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 9/4/2014. (sem grifos no original)

Senhores e senhoras, sendo esta uma exceção a regra, com contornos de transcendência de norma, recomenda-se um estudo apurado, pois poderá ser objeto de questões para concursos públicos.

Carlos Arthur Ferrão Júnior – Advogado.