O Superior Tribunal de Justiça e os limites de atuação do Juiz Federal Corregedor de presídio federal na decisão a respeito de inclusão de preso no sistema penitenciário federal.

 

Como regra, os investigados ou réus presos, cautelarmente ou de forma definitiva, pela Justiça Federal são encaminhados ao sistema penitenciário estadual, sob os cuidados do Juízo de Execução Penal. Excepcionalmente, porém, em face da grave crise de insegurança dos presídios “comuns”, que permitiam que os presos continuassem controlando o crime organizado de dentro de suas celas, foram construídos presídios federais de segurança máxima, com o objetivo de abrigar justamente aqueles presos considerados os mais perigosos, notadamente vinculados a organizações criminosas.

Para os concurseiros, menciono que o tema consta do Edital para a Magistratura Federal, assim como já foi cobrado na prova do 26º concurso do MPF, valendo, portanto, a leitura literal da Lei n. 11.671/08.

Coube a ela regulamentar o procedimento de inclusão e exclusão do preso no sistema penitenciário federal. De acordo com a regulamentação, o procedimento, basicamente, consiste em um pedido dirigido ao Juízo Federal Corregedor do presídio federal, para que um determinado preso seja remetido àquela penitenciária.

E é aqui o ponto principal do presente texto: A quem compete decidir se os pressupostos para inclusão do preso estão presentes no caso concreto? Ao juiz da causa ou ao Juiz Federal responsável pelo presídio? Em outras palavras, pode o Juiz Federal rejeitar o pedido, sob o fundamento de que não se trata de hipótese de inclusão do preso no sistema federal?

O entendimento adotado pelo Superior Tribunal Justiça é no sentido de que compete ao Juiz da causa decidir se é, ou não, caso de remessa do preso para presídio federal, não competindo ao Juiz Federal esta análise. Assim, as únicas hipóteses em que o Juiz Federal pode rejeitar o encaminhamento são (1) se as formalidades não foram observadas, e (2) se o presídio já estiver com sua capacidade máxima atingida, por força da vedação expressa da Lei (art. 11).

Trazemos à baila decisões do STJ:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. TRANSFERÊNCIA DE PRESO PARA PRESÍDIO FEDERAL DE SEGURANÇA MÁXIMA. ALTA PERICULOSIDADE DO APENADO E RISCO PARA A SEGURANÇA PÚBLICA. GRAVIDADE DOS FATOS SUSCITADOS PELO JUÍZO SOLICITANTE: JUÍZO DE VALOR QUE NÃO CABE AO MAGISTRADO FEDERAL. PRECEDENTES. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO JUÍZO FEDERAL SUSCITADO. 1. A transferência e inclusão de presos em estabelecimento penal federal de segurança máxima justifica-se (i) no interesse da segurança pública ou (ii) do próprio preso, nos termos do art. 3.º da Lei n.º 11.671/2008, sendo medida de caráter excepcional. 2. Hipótese em que o Juízo Suscitante, após requerimento do Secretário de Estado de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro e parecer favorável do Ministério Público Estadual, afirmou que a alta periculosidade do apenado denota justo receio de abalo à segurança pública, mormente porque estaria ele envolvido na orquestração de fuga de 30 detentos da unidade carcerária fluminense. 3. O Juízo Suscitado reconheceu ser “inequívoco que a feição do preso se amolda às exigências da legislação para a inclusão”, limitando sua insurgência a suposta não demonstração, pelo Juízo Estadual, de circunstância emergencial capaz de ensejar a remoção do apenado a presídio federal de segurança máxima. 4. A jurisprudência desta Corte Superior considera que, em casos como o presente, ao Juízo Federal não compete realizar juízo de valor sobre as razões de fato emanadas pelo Juízo solicitante, sendo-lhe atribuído pelo art. 4.º da Lei n.º 11.671/2008, tão-somente, o exame da regularidade formal da solicitação. 5. Conflito de competência conhecido para, na linha do parecer da Douta Subprocuradoria da República, declarar competente o Juízo Federal de Mossoró/RN (suscitado). (STJ, CC127981, Rel. Min. Laurita Vaz, p. 09/12/2013)

 

PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. INGRESSO DE PRESO NO SISTEMA PENITENCIÁRIO FEDERAL. POSSIBILIDADE. LEI N. 11.671/2008. NECESSIDADE DE FUNDADA MOTIVAÇÃO PELO JUÍZO DE ORIGEM. PERSISTÊNCIA DOS MOTIVOS ENSEJADORES DO PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA ORIGINÁRIO. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO OBJETIVA DO JUÍZO FEDERAL PARA RECUSA DO PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA. 1) 1. Nos termos do art. 10, § 1º, da Lei nº 11.671/2008, o período de permanência do preso em estabelecimento penal federal de segurança máxima não poderá ser superior a 360 (trezentos e sessenta) dias, podendo ser renovado, excepcionalmente, quando solicitado motivadamente pelo juízo de origem. 2. Persistindo as razões e fundamentos que ensejaram a transferência do preso para o presídio federal de segurança máxima, como afirmado pelo Juízo suscitante, notadamente em razão da periculosidade concreta do apenado que desempenha função de liderança em organização criminosa, bem como por ter participado de rebeliões e motins, inclusive com assassinatos de outros presos de forma cruel, dentre outros motivos, a renovação da permanência é providência indeclinável, como medida excepcional e adequada para resguardar a ordem pública. 3. Não cabe ao Juízo Federal discutir as razões do Juízo Estadual, quando solicita a transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima, assim quando pede a renovação do prazo de permanência, porquanto este é o único habilitado a declarar a excepcionalidade da medida (CC n. 120.929/RJ, Ministro Marco Aurélio Bellizze Terceira Seção, DJe 16/8/2012). 2) No caso de conflito entre o Juiz da vara solicitante de transferência de preso para o sistema penitenciário federal e o Juiz da seção judiciária responsável por presídio federal, a recusa do segundo ao pedido de prorrogação do prazo de permanência do preso no sistema penitenciário federal pode ocorrer se devidamente fundamentada em fatos concretos e objetivos. 3) Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo suscitado, Juízo Federal da Seção de Execução Penal de Catanduvas – SJ/PR, e determinar a permanência do preso, Darley Vasques da Silva, na Penitenciária Federal de Catanduvas/PR. (STJ, CC119935, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, p. 01/02/13)

 

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO PENAL. TRANSFERÊNCIA DE PRESO. PRIMEIRA RENOVAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE. LEI Nº 11.671/2008. DURAÇÃO DO PROCESSO DE RENOVAÇÃO DA PERMANÊNCIA. RETROATIVIDADE DO TERMO INICIAL. ALTERAÇÃO DO REGIME DE EXECUÇÃO PENAL. EXCEÇÃO. CONFLITO TECNICAMENTE INEXISTENTE. JUSTIFICATIVAS DO JUÍZO FEDERAL. EXCESSO. JUÍZO MERAMENTE CIRCUNSTANCIAL DESTA CORTE. INTERMEDIAÇÃO DA SOLUÇÃO. CONFLITO CONHECIDO. RENOVAÇÃO AUTORIZADA. AÇÃO DE TRANSFERÊNCIA PREJUDICADA. I – A inclusão do preso em estabelecimento prisional federal deve estender-se pelo prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias, e a renovação somente ocorrerá excepcionalmente. II – Admite-se a retroatividade do termo inicial do prazo ao dia seguinte ao término do prazo anterior, aplicável tanto no caso de aceitação da renovação pelo magistrado federal, quanto, no caso de renovação da permanência decidida por meio de conflito de competência, até seu julgamento. III – A alteração do regime de execução penal estabelecido pela Lei nº 11.671/2008, permitindo a transferência e inclusão de preso oriundo de outro sistema penitenciário para o sistema penitenciário federal de segurança máxima constitui exceção e está inspirada em fatos e fundamentos a serem necessariamente considerados por ocasião do pedido e da admissão correspondente. IV – Não cabe ao Juízo Federal exercer qualquer juízo de valor sobre a gravidade ou não das razões do solicitante, mormente, como no caso, quando se trata de preso provisório sem condenação, situação em que, de resto, a lei encarrega o juízo solicitante de dirigir o controle da prisão, fazendo-o por carta precatória. V – A divergência entre os juízes não constitui tecnicamente conflito de competência como conceitua a lei, pois na verdade há apenas discussão administrativa entre as autoridades judiciais com competência material própria, cabendo a este Superior Tribunal apenas avaliar as justificativas de cada parte (que a outra não pode questionar) e intermediar a solução mais adequada. VI – Na presente hipótese as justificativas do Juízo Federal exorbitam dos limites que lhe tocaria considerar, em virtude do que a renovação solicitada pode ser atendida pois fundada em respeito aos argumentos objetivos do juízo solicitante. VII – Conflito de competência conhecido nos limites expostos para autorizar a renovação da permanência do preso provisório Nei da Conceição Cruz na Penitenciária Federal de Campo Grande/MS, por mais 360 dias, a partir do dia seguinte do encerramento do prazo anterior, ficando prejudicada a tramitação da Ação de Transferência entre Estabelecimentos Penais nº 0013008-52.2009.403.6000 (STJ, CC118834, Rel. Min. Gilson Dipp, p. 01/12/2011)

 

Consta, no inteiro teor deste último acórdão, que “O Juízo Federal só pode justificar a recusa se evidenciadas condições  desfavoráveis ou inviáveis da unidade prisional, tais como lotação ou incapacidade de receber  novos presos ou apenados. Fora daí, a recusa não é razoável nem tem apoio na lei. De outra  parte, se se afirma a falta dessas condições, não poderá o Juízo solicitante estadual ou federal,  nem lhe cabe, questioná-las.”

Mas, então, quer dizer que a decisão do Juiz da causa não é passível de qualquer controle? Claro que é, não pelo Juiz Federal Corregedor, mas sim na própria via recursal (agravo em execução, apelação – penso que se trata de decisão com força de denitiva) ou pelo uso de Habeas Corpus. Através destas medidas, o Ministério Público ou o defensor do preso poderão questionar a necessidade de sua transferência para o regime penitenciário federal.

Concluindo:

(a) na visão do STJ, não cabe ao Juiz Corregedor do presídio federal analisar as razões de mérito da solicitação de inclusão do preso no sistema penitenciário federal;

(b) segundo o STJ, o Juiz Corregedor só pode negar a inclusão com base em circunstâncias objetivas, tais como se as formalidades não forem cumpridas ou se o presídio não tiver condições físicas de receber novos