Olá, pessoal! Espero que estejam todos bem.
No post de hoje vou falar sobre a intervenção anômala do Poder Público e, em seguida, tratarei da possibilidade de utilização do pedido de suspensão pelo interveniente. A abordagem envolve dois instrumentos processuais específicos da Fazenda Pública, o que torna a leitura indispensável para aqueles que se submetem a concursos da advocacia pública.
De início, insta esclarecer, que a intervenção anômala se cuida de prerrogativa processual exclusiva da Fazenda Pública, a qual possui com escopo resguardar o interesse público, encontrando-se prevista no art. 5º da Lei nº 9.469/97, in verbis:
Art. 5º A União poderá intervir nas causas em que figurarem, como autoras ou rés, autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas federais.
Parágrafo único. As pessoas jurídicas de direito público poderão, nas causas cuja decisão possa ter reflexos, ainda que indiretos, de natureza econômica, intervir, independentemente da demonstração de interesse jurídico, para esclarecer questões de fato e de direito, podendo juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria e, se for o caso, recorrer, hipótese em que, para fins de deslocamento de competência, serão consideradas partes.
Conforme se extrai da leitura do parágrafo único do art. 5º da Lei 9.469/97, as pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios, autarquias e fundações de direito público) poderão intervir nas causas cuja decisão lhes possa ocasionar reflexos, ainda que indiretos, bastando para tanto a demonstração de interesse econômico. Sob esse prisma, são características marcantes de tal modalidade de intervenção a prescindibilidade do interesse jurídico e a ausência de limitação em razão dos sujeitos envolvidos na lide, podendo se dar na hipótese de figurarem nos polos processuais particulares.
Com efeito, dentre os poderes conferidos ao interveniente, prevê o parágrafo único do art. 5° da Lei 9.469/1997a possibilidade de a pessoa jurídica de direito público interpor recurso de decisão que lhe seja desfavorável.
Especificamente no que diz respeito ao pedido de suspensão, prevalece na doutrina se tratar de incidente processual, não possuindo natureza recursal, na medida em que não objetiva a reforma da decisão, mas tão somente a suspensão de sua eficácia.
Nesse contexto, surge o seguinte questionamento, a autorização para interpor recurso abrange também a possibilidade de ajuizamento de pedido de suspensão?
Bem, tendo em vista a omissão do art. 5º da Lei 9.469/97,é possível que se confira interpretação restritiva ao dispositivo, entendendo-se incabível a propositura do pedido de suspensão. Nada obstante, soa despropositado pensar que o legislador garantiu à Fazenda Pública o poder de recorrer e, por outro lado, excluir-lhea possibilidade de apresentação do pedido de suspensão. Em razão disso, prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que a previsão que concede ao ente público a oportunidade de ingressar no feito para recorrer traz implícita, em si, a possibilidade também o pedido de suspensão.
Como fundamento para a conclusão de cabimento do pedido de suspensão, sustenta Leonardo Carneiro da Cunha,que a norma inscrita no inc. XXXV do art. 5° da Constituição Federal,segundo a qual “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, atrai para o Estado não apenas o dever de julgar a lide que lhe é apresentada, mas, ainda, a obrigação de disponibilizar instrumentos paragarantir a eficácia do direito objeto de debate judicial.
Desse modo, ao conferir às pessoas jurídicas de direito público o poder de recorrer de decisões que lhes acarretem prejuízo econômico, o parágrafo único do art. 5° da Lei 9.469/1997 autoriza o direito de manejar os instrumentos processuais destinados a assegurar o resultado útil do processo, o que abrange o pedido de suspensão.
Nesse sentido decidiu a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL. LEGITIMAÇÃO DA UNIÃO. INTERESSE ECONÔMICO. INTELIGÊNCIA DO ART. 5º DA LEI Nº 9.469/97. SUSPENSÃO DE LIMINAR – SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. REQUISITOS PREENCHIDOS. SUSPENSÃO DEFERIDA. AGRAVO DESPROVIDO.
– A União tem legitimidade para intervir nos feitos em que sociedade de economia mista figure como parte, mesmo que seu interesse na causa seja apenas econômico (art. 5º da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997).
– A legitimidade para apresentar recursos concedida à União autoriza, nesse caso, o direito do uso dos meios indispensáveis para assegurar o resultado útil do processo, entre os quais figura a possibilidade de requerer a suspensão de liminar ou de antecipação de tutela.
– Sociedade de economia mista da administração indireta tem legitimidade ativa ad causam para requerer suspensão de decisão (Lei nº 4.348/64). Precedente da Segunda Turma (REsp nº 50.284/SP).
– A magnitude da expressão econômica envolvida na causa em desfavor da empresa, o risco de que os efeitos da decisão possam potencializar crise no setor elétrico com a paralisação de usina térmica e a repercussão imediata em região que convive com a dificuldade gerada pelo racionamento de energia são pressupostos que autorizam a contracautela requerida.
– Agravo interno conhecido e desprovido. (AgRg na Pet 1.621/PE, Rel. Ministro NILSON NAVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 24/06/2002, DJ 14/04/2003, p. 165)
Sendo assim, de acordo com a doutrina majoritária e com a jurisprudência do STJ, é possível, nos casos do parágrafo único do art. 5° da Lei9.469/1997, o ajuizamento de pedido de suspensão pela pessoa jurídica de direito público.
Até a próxima!
Referências bibliográficas
CUNHA, Leonardo Carneiro da. A Fazenda Pública em juízo. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
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