Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4357 e 4425: sistemática dos juros de mora.

 

No que concerne aos critérios de atualização monetária e de juros incidentes sobre as condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, dispõe o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 (com redação dada pela Medida Provisória 2.180-35/2001):

Art. 1º-F Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança

Quanto aos índices aplicados à caderneta de poupança, a Lei nº 8.177/91, em seu art. 12, estipula:

Art. 12. Em cada período de rendimento, os depósitos de poupança serão remunerados:

I – como remuneração básica, por taxa correspondente à acumulação das TRD, no período transcorrido entre o dia do último crédito de rendimento, inclusive, e o dia do crédito de rendimento, exclusive;

II – como adicional, por juros de meio por cento ao mês. (Grifo nosso).

Assim, com a edição da Medida Provisória 2.180-35/2001, em 24/8/2001, passou a vigorar a incidência de juros de mora a 6% (seis por cento) ao ano nas condenações impostas à Fazenda Pública.

Confira a seguinte decisão proferida no AgRg no REsp 1193062/RJ:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. VERBAS REMUNERATÓRIAS. DEMANDA AJUIZADA EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA MP N. 2.180-35/2001. JUROS DE MORA EM 12% AO ANO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N. 1.086.944/SP. VÍCIO FORMAL DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. INEXISTÊNCIA. ARTIGO 406 DO NOVO CÓDIGO CIVIL. INAPLICABILIDADE. INCIDÊNCIA DA LEI N. 11.960/2009. INVIABILIDADE. ADOÇÃO DO ENTENDIMENTO DO TST SOBRE O TEMA. INOVAÇÃO RECURSAL.

1. Agravo regimental interposto contra a decisão da Presidência do STJ que negou seguimento ao recurso especial, ao argumento de que a jurisprudência desta Corte é no sentido de que nas ações ajuizadas antes da MP n. 2.180-35/2001, os juros de mora são devidos ao percentual de 12% ao ano. Aponta violação dos artigos 2º, 5º, XXXV, XXXVI e LV, 37, caput, 97, 102, § 2º, 167, II e 169, § 1º e II, da CF/88, acerca da interpretação equivocada dos princípios da isonomia, do direito adquirido, ato jurídico perfeito, retroatividade da lei e cláusula de reserva de plenário, como também dos institutos da competência jurisdicional e aumento de despesa sem dotação orçamentária. Pugna pela aplicação, na espécie, do artigo 406 do Novo Código Civil, da Lei n. 11.960/2009, e do entendimento do TST sobre o tema.

2. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça com fundamento no artigo 543-C do CPC no julgamento do REsp n. 1.086.944/SP firmou entendimento no sentido de que o disposto no artigo 1º-F da Lei n. 9.494/1997, que fixou em 6% ao ano os juros moratórios sobre as condenações impostas à Fazenda Pública para pagamento de verbas remuneratórias devidas a servidores e empregados públicos, é aplicável apenas nas ações ajuizadas após a entrada em vigor da MP 2.180-35/2001, ou seja, 24/8/2001. Isso porque, a norma em referência, que acrescentou o artigo 1º-F ao texto da Lei n. 9.494/1997, por ser norma instrumental-material, com reflexos na esfera jurídico-material das partes, não é aplicada aos processos iniciados antes da sua edição. Não havendo falar em violação dos princípios da isonomia, do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da retroatividade da lei.

3. A Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça não declarou a inconstitucionalidade do artigo 1º-F da Lei n. 9.494/1997. Apenas conferiu interpretação diversa ao dispositivo, face à competência do Tribunal para zelar pela interpretação do direito infraconstitucional. Inexistente, portanto, a alegada afronta do preceito em tela, previsto no artigo 97 da Constituição Federal, quando não há, ao menos implicitamente, declaração de inconstitucionalidade de qualquer lei.

(…) (AgRg no REsp 1193062 / RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data do Julgamento 21/10/2010, Data da Publicação/Fonte DJe 28/10/2010) g/n

 

Resta claro, assim, que a legislação e a jurisprudência, sem qualquer divergência, aplica à Fazenda Pública juros de mora de 0,5% a.m., desde agosto de 2001.

Essa constatação não é modificada com o julgamento das ADI 4357 e 4425.

Analisando-se a Ata de Julgamento das referidas ADIs, bem como a síntese do que foi decidido, majoritariamente, pelo Supremo Tribunal Federal, verifica-se que a Excelsa Corte declarou parcialmente inconstitucional o §12 do art. 100 da CF/88, no tocante às expressões “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança” e “independentemente de sua natureza” e, por arrastamento, essas mesmas expressões constantes do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.

Procedendo-se ao cotejo entre as expressões declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal e a redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, verifica-se que a inconstitucionalidade declara pela Excelsa Corte refere-se, exclusivamente, ao índice de correção monetária, não se estendendo aos juros de mora.

As decisões posteriores emanadas são no mesmo sentido: a declaração de inconstitucionalidade abrangeria a atualização pela taxa referencial. E nada mais.

Observem os seguintes julgados:

E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO – IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE OFICIAL DE REMUNERAÇÃO BÁSICA DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA DOS DÉBITOS FAZENDÁRIOS SUJEITOS AO REGIME DE EXECUÇÃO INSCRITO NO ART. 100 DA CF/88 – DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO § 12 DO ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, NA REDAÇÃO DADA PELA EC Nº 62/2009 – DIRETRIZ JURISPRUDENCIAL FIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
(RE 747727 AgR, Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 06/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 05-09-2013 PUBLIC 06-09-2013)

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INCONSTITUCIONALIDADE DA EXPRESSÃO “ÍNDICE OFICIAL DE REMUNERAÇÃO BÁSICA DA CADERNETA DE POUPANÇA”. CORREÇÃO MONETÁRIA: NECESSIDADE DE ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. (RE 747702 AgR, Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 13/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-171 DIVULG 30-08-2013 PUBLIC 02-09-2013)

Nesse sentido, merece destaque o que foi efetivamente publicado a respeito da decisão do STF, quando da finalização do julgamento:

Decisão: Prosseguindo no julgamento, o Ministro Luiz Fux concluiu seu voto declarando a inconstitucionalidade do § 15 do art. 100 e do art. 97 do ADCT. O Ministro Teori Zavascki votou no sentido da improcedência da ação. O Tribunal resolveu questão de ordem suscitada pelo Ministro Marco Aurélio no sentido de serem apreciadas em primeiro lugar as impugnações ao art. 100 da Constituição Federal, vencidos os Ministros Teori Zavascki, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Presidente. Em seguida, o Tribunal julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da expressão “na data de expedição do precatório”, contida no § 2º; os §§ 9º e 10; e das expressões “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança” e “independentemente de sua natureza”, constantes do § 12 [rectius: §16], todos dispositivos do art. 100 da CF, com a redação dada pela EC nº 62/2009, vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Teori Zavascki e Dias Toffoli. Votou o Presidente, Ministro Joaquim Barbosa. Em seguida, o julgamento foi suspenso. Plenário, 13.03.2013.

Foi declarada a inconstitucionalidade (declaração de inconstitucionalidade com redução do texto) dos trechos “independentemente de sua natureza” e “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança”, remanescendo o restante. Em outras palavras, o dispositivo supracitado passou a dever ser lido da seguinte forma:

“Art. 100 § 16. A partir da promulgação desta Emenda Constitucional, a atualização de valores de requisitórios, até o efetivo pagamento, independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, e, para fins de compensação da mora, incidirão juros simples no mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios.”

Já o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, deve ser assim considerado, com a mesmo lógica acima disposta:

Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança. (Grifou-se).

Realmente, referida declaração de inconstitucionalidade, da forma como consta da ata de julgamento, impossibilitou a atualização monetária de precatórios com base nos índices oficiais da poupança (Taxa Referencial), mas deixou incólume a parte que concerne a aplicação de juros de mora da poupança, ou seja 0,5%.

Nesse sentido decidiu recentemente o Superior Tribunal de Justiça em decisão assim ementada:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ N.º 08/2008.   ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. INCORPORAÇÃO DE QUINTOS. MEDIDA PROVISÓRIA N.º 2.225-45/2001. PERÍODO DE 08.04.1998 A 05.09.2001. MATÉRIA JÁ DECIDIDA NA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. POSSIBILIDADE EM ABSTRATO. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL NO CASO CONCRETO. RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO. AÇÃO DE COBRANÇA EM QUE SE BUSCA APENAS O PAGAMENTO DAS PARCELAS DE RETROATIVOS AINDA NÃO PAGAS.

(…)

14. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, ao examinar a ADIn 4.357/DF, Rel. Min. Ayres Britto.

15. A Suprema Corte declarou inconstitucional a expressão “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança”contida no § 12 do art. 100 da CF/88. Assim entendeu porque a taxa básica de remuneração da poupança não mede a inflação acumulada do período e, portanto, não pode servir de parâmetro para a correção monetária a ser aplicada aos débitos da Fazenda Pública.

16. Igualmente reconheceu a inconstitucionalidade da expressão “independentemente de sua natureza” quando os débitos fazendários ostentarem natureza tributária. Isso porque, quando credora a Fazenda de dívida de natureza tributária, incidem os juros pela taxa SELIC como compensação pela mora, devendo esse mesmo índice, por força do princípio da equidade, ser aplicado quando for ela devedora nas repetições de indébito tributário.

17. Como o art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação da Lei 11.960/09, praticamente reproduz a norma do § 12 do art. 100 da CF/88, o Supremo declarou a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, desse dispositivo legal.

18. Em virtude da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 5º da Lei 11.960/09: (a) a correção monetária das dívidas fazendárias deve observar índices que reflitam a inflação acumulada do período, a ela não se aplicando os índices de remuneração básica da caderneta de poupança; e (b) os juros moratórios serão equivalentes aos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicáveis à caderneta de poupança, exceto quando a dívida ostentar natureza tributária, para as quais prevalecerão as regras específicas.

(…)

(REsp 1270439/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/06/2013, DJe 02/08/2013)

 

Portanto, a decisão do Supremo Tribunal Federal, nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4357 e 4425 não afetou ou alcançou de forma alguma a previsão de juros de 0,5% devidos em obrigações da fazenda pública, atingindo apenas a atualização monetária pela Taxa Referencial.