Caros leitores do blog, conversaremos hoje sobre a forma de cálculo da aposentadoria por invalidez quando precedida de auxílio-doença, tema cuja compreensão entendo muito importante para os postulantes ao ingresso na carreira da AGU e DPU, porquanto ambos concursos exploram detalhes do direito previdenciário.

Antes de enfrentarmos o cerne da questão, entendo oportuno pontuar alguns conceitos básicos que envolvem os benefícios previdenciários em geral, quais sejam, salário de contribuição, salário de benefício e renda mensal inicial.

Em linguagem simples, salário de contribuição é aquela quantia que é vertida mensalmente pelo segurado e tem como parâmetro o salário recebido mês a mês, ou seja, é a contribuição aos cofres do INSS propriamente dita. Quanto maior a contraprestação pelo labor, maior será o salário de contribuição, respeitados os limites legais.

Salário de benefício, por sua vez, é o resultado de uma determinada média dos salários de contribuição, grandeza que servirá de base para o cálculo da renda mensal inicial. No caso das aposentadorias por idade e por tempo de contribuição corresponderá à “média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário. Já nos casos de invalidez, auxílio-doença, aposentadoria especial e auxílio-acidente, a regra sofre uma pontual adaptação, visto que não incide o fator previdenciário.

Prosseguindo, renda mensal é o valor do benefício em manutenção, ou seja, o montante que, efetivamente, será pago mensalmente ao titular da benesse. Em termos matemáticos, o salário de benefício é o limite do que poderá ser pago ao segurado (respeitando-se o teto previdenciário), pelo que a renda mensal poderá corresponder até 100% deste valor.

Pois bem, delimitados estes conceitos basilares, extraídos do art. 20 da Lei n° 8.212/91 e arts. 29 e 33 da Lei n° 8.213/91, dentre outros, estamos aptos a compreender esse ponto que reputo importante em provas que envolvem alto conhecimento em Direito Previdenciário.

Ab initio, é conhecimento ordinário que a RMI (renda mensal inicial) da aposentadoria por invalidez equivale a 100% do salário de benefício. Por seu turno, o auxílio-doença é calculado no percentual de 91% sobre esta mesma base de cálculo (SB). Será que o segurado sempre terá direito ao cálculo da aposentadoria por invalidez como se fosse “benefício novo?”. Em outras palavras, como funciona o cálculo do SB e da RMI quando a invalidez for precedida de auxílio-doença?

Um dos propósitos deste artigo, portanto, é apontar a exegese adequada ao enunciado n° 557 da Súmula do STJ, assim vazado:

“A renda mensal inicial (RMI) alusiva ao benefício de aposentadoria por invalidez precedido de auxílio-doença será apurada na  forma do art. 36, § 7º, do Decreto n. 3.048/1999, observando-se, porém, os critérios previstos no art. 29, § 5º, da Lei n. 8.213/1991, quando intercalados períodos de afastamento e de atividade laboral.”

Em sendo constatada a incapacidade total (requisito que é flexibilizado pela jurisprudência) e temporária para a atividade laboral, aquele que possui qualidade de segurado estará apto ao recebimento de auxílio-doença. Em havendo cessação das moléstias incapacitantes, ocorre o exaurimento do benefício temporário, retomando o segurado ao trabalho e, portanto, ao recebimento de remuneração e recolhimento de contribuições previdenciárias. Entretanto, esta incapacidade provisória pode evoluir para permanente, situação em que o auxílio-doença pode ser convertido em aposentadoria por invalidez.

A grande polêmica que se instaurou na jurisprudência – assunto que foi pacificado pelo STJ – era se, no último caso citado (conversão de auxílio-doença em invalidez), o 36, § 7º, do Decreto n. 3.048/1999 extrapolava os limites do poder regulamentar no ponto em que determinava o aproveitamento do mesmo salário de benefício que ensejou a concessão do auxílio-doença, para efeito de conversão em aposentadoria por invalidez.

Esse mero aumento de percentual (91% sobre o SB, no caso do auxílio, para 100% em face do mesmo salário de benefício) poderia ocasionar prejuízos aos segurados, ante a desconsideração dos valores percebidos no interregno de vigência do auxílio-doença como salários de contribuição. A alegação dos segurados era de que sempre haveria o direito ao cálculo da aposentadoria por invalidez como se se tratasse de benefício novo, apto a aproveitar os 80% maiores salários de contribuição, inclusive dos pagamentos percebidos a título de auxílio-doença, que deveriam ser considerados, de forma ficta, como salários de contribuição.

A tese dos segurados prevaleceu? Não. Como visto, o STJ superou as divergências existentes entre os Tribunais Regionais Federais e firmou o entendimento de que o Decreto n° 3.048/99, no ponto, estava consoante os limites legais, validando a forma de cálculo pelo incremento de 9% do mesmo salário de benefício que deu ensejo à concessão do auxílio-doença (de 91% para 100%).

Muita atenção ao detalhe que segue: nem todos os casos de recebimento anterior de auxílio-doença geram o deferimento da invalidez lastreada no mesmo salário de benefício. Se houver alternância entre o auxílio-doença e o retorno ao trabalho, o cálculo da aposentadoria por invalidez seguirá o critério do art. 29, §5º, da Lei nº 8.213/91, que determina o cálculo de benefício novo (não o simples incremento percentual do último auxílio), considerando-se os pagamentos de auxílio-doença como salários de contribuição de maneira ficta. Esta hipótese está tratada na última parte do verbete do STJ.

Vamos ilustrar, considerando a situação jurídica de dois segurados hipotéticos:

Períodos

01/2014 a 12/2014

01/2015 a 09/2015

10/2015

 Segurado 1

Auxílio-doença

SB – R$ 2.000,00

RMI – R$ 1.820,00 (91%)

Mesmo benefício em vigor, constatação, sem solução de continuidade, da incapacidade total e permanente

Auxílio convertido em aposentadoria por invalidez, mesmo SB (primeira parte da súmula 557).

 

Benefício derivado

RMI – R$ 2.000,00

Segurado 2

Auxílio-doença

SB – R$ 2.000,00

RMI – R$ 1.820,00 (91%)

Recuperação da capacidade e retorno à atividade profissional

Recebimento de salários

Constatação de incapacidade total e permanente – cálculo de aposentadoria por invalidez como se fosse benefício novo, cujo período de cálculo abarcará os valores recebidos nos meses de 01/2012 a 12/2012 como salário de contribuição (última parte da súmula)

 

E como isso pode ser explorado em concursos?

Os candidatos podem se deparar com questionamentos sobre a validade da regra que determina a mera conversão do AD em AI, explorando o conhecimento da jurisprudência do STJ, ou mesmo do distinguishing, nos casos em que houver AD’s intercalados ao retorno ao trabalho, quando incidirá a regra do art. 29, §5º, da Lei n° 8.213/91 (cálculo de benefício novo):

§ 5º Se, no período básico de cálculo, o segurado tiver recebido benefícios por incapacidade, sua duração será contada, considerando-se como salário-de-contribuição, no período, o salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal, reajustado nas mesmas épocas e bases dos benefícios em geral, não podendo ser inferior ao valor de 1 (um) salário mínimo.”

Em provas subjetivas, o conhecimento pode ser cobrado na elaboração de peça processual em face de sentença que tenha deferido aposentadoria por invalidez de um ou outro modo. Pensando em provas para ingresso na DPU, pode ser explorado o error in judicando em se conceder aposentadoria por invalidez que tenha aproveitado o mesmo SB, não obstante períodos intercalados de retorno ao labor. Já no caso da PGF, o exemplo também se aplica, mas de forma invertida, ou seja, deferimento pela sentença de cálculo novo e indevido à aposentadoria por invalidez.

Abraços e bons estudos a todos!!

 

Bruno Luiz Dantas de Araújo Rosa

Advogado da União