– Da Hipótese de Responsabilidade Solidária da Administração Pública pelos Encargos Previdenciários devidos por Construtoras Contratadas.

A questão que este post se propõe a refletir é: quando a Administração Pública contratar um construtor para a realização de obras de construção, reforma ou acréscimo, e não havendo cessão de mão de obra na execução do serviço, haverá responsabilidade solidária em relação aosencargos previdenciários eventualmente não pagos pelo construtor?

A resposta é não, pelas razões a seguir.

De acordo com o plasmado no art. 71, caput, da Lei n. 8.666/93, o contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.

Todavia, o § 2º do mesmo art. 71 dispõe que a Administração Pública é solidariamente responsável com o contratado pelos encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, nos termos do art. 31 da Lei nº 8.212/91.

No que pertine à Lei nº 8.212/91, tal norma apresenta duas situações absolutamente distintas em relação às responsabilidades tributárias dos contratantes de obras de engenharia civil:

– nos contratos de construção, reforma ou acréscimo, o dono da obra é solidariamente responsável com o contratado pelas contribuições previdenciárias por este devidas (art. 30, VI);

– nos contratos de serviços executados mediante cessão de mão-de-obra, o contratante deve reter onze por cento do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços e recolher a importância retida à Previdência Social (art. 31).

Sendo assim, da leitura atenta da parte final do § 2º do art. 71 da Lei n. 8.666/93 combinada com o art. 31 da Lei n. 8.212/91, é de se concluir que, apenas, nas contratações de construtoras que realizarão seus serviços mediante cessão de mão de obra, é que se aplica à Administração Pública a referida responsabilidade solidária pelas contribuições previdenciárias eventualmente devidas pela construtora.

A propósito, é desta forma o posicionamento da Advocacia-Geral da União que, no Parecer n. AGU/MS 08/2006, aprovado pelo Advogado-Geral da União e posteriormente pelo Presidente da República[1], assim está ementado:

PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. CONTRATOS. OBRAS PÚBLICAS. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E RETENÇÃO. DEFINIÇÃO.

I – Desde a Lei nº 5.890/73, até a edição do Decreto-Lei nº 2.300/86, a Administração Pública respondia pelas contribuições previdenciárias solidariamente com o construtor contratado para a execução de obras de construção, reforma ou acréscimo de imóvel, qualquer que fosse a forma da contratação.
II – Da edição do Decreto-Lei nº 2.300/86, até a vigência da Lei nº 9.032/95, a Administração Pública não respondia, nem solidariamente, pelos encargos previdenciários devidos pelo contratado, em qualquer hipótese. Precedentes do STJ.
III – A partir da Lei nº 9.032/95, até 31.01.1999 (Lei nº 9.711/98, art. 29), a Administração Pública passou a responder pelas contribuições previdenciárias solidariamente com o cedente de mão-de-obra contratado para a execução de serviços de construção civil executados mediante cessão de mão-de-obra, nos termos do artigo 31 da Lei nº 8.212/91 (Lei nº 8.666/93, art. 71, § 2º), não sendo responsável, porém, nos casos dos contratos referidos no artigo 30, VI da Lei nº 8.212/91 (contratação de construção, reforma ou acréscimo).
IV – Atualmente, a Administração Pública não responde, nem solidariamente, pelas obrigações para com a Seguridade Social devidas pelo construtor ou subempreiteira contratados para a realização de obras de construção, reforma ou acréscimo, qualquer que seja a forma de contratação, desde que não envolvam a cessão de mão-de-obra, ou seja, desde que a empresa construtora assuma a responsabilidade direta e total pela obra ou repasse o contrato integralmente (Lei nº 8.212/91, art. 30, VI e Decreto nº 3.048/99, art. 220, § 1º c/c Lei nº 8.666/93, art. 71).
V – Desde 1º.02.1999 (Lei nº 9.711/98, art. 29), a Administração Pública contratante de serviços de construção civil executados mediante cessão de mão-de-obra deve reter onze por cento do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços e recolher a importância retida até o dia dois do mês subseqüente ao da emissão da respectiva nota fiscal ou fatura, em nome da empresa contratada, cedente da mão-de-obra (Lei nº 8.212/91, art. 31). <>

Na mesma trilha interpretativa a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que no RESP n. 866152, da Relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, assim se pronunciou, in verbis:

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. EMPREITADA GLOBAL POR OBRA. ART. 71, § 2º, DA LEI N. 8.666/91. NÃO-INCIDÊNCIA. CONTRATO DE CESSÃO DE MÃO DE OBRA NÃO CARACTERIZADO (ART. 31 DA LEI N. 8.212/91). 1. O art. 73, § 2º, da Lei n. 8.666/91, com a redação conferida pela Lei n. 9.032/95, dispõe expressamente que “a Administração Pública responde solidariamente com o contratado pelos encargos previdenciários resultantes da execução do contrato, nos termos do art. 31 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991”. 2. O art. 31 da Lei n. 8.212/91 refere-se à responsabilidade da empresa contratante de serviços executados mediante cessão de mão de obra, inclusive em regime de trabalho temporário, em relação às obrigações tributárias previdenciárias devidas pelo executor. 3. A partir dos elementos constantes do acórdão recorrido não se observa a existência de contrato de cessão de mão de obra ou equiparado, de modo que não se aplica ao ente municipal a responsabilidade solidária prevista no art. 71, § 2º, da Lei n. 8.212/91 c/c 31 da Lei n. 8.212/91. 4. O princípio da estrita legalidade tributária não permite dar à regra de responsabilidade tributária alcance nela não compreendido inicialmente, nem mesmo por analogia (art. 108, § 1º, do CTN). 5. Recurso especial não provido.

É de se concluir, portanto, que Administração Pública não responde, nem solidariamente, pelas obrigações para com a Seguridade Social devidas pelo construtor ou subempreiteira contratados para a realização de obras de construção, reforma ou acréscimo, qualquer que seja a forma de contratação, desde que não envolvam a cessão de mão de obra, ou seja, desde que a empresa construtora assuma a responsabilidade direta e total pela obra ou repasse o contrato integralmente.


[1] O parecer do Advogado-Geral da União, quando aprovado pelo Presidente da República e publicado juntamente com o despacho presidencial, adquire caráter normativo e vincula todos os órgãos e entidades da Administração Federal, que ficam obrigados a lhe dar fiel cumprimento, nos termos do § 1º do art. 40 da Lei Complementar n. 73/93 (Lei Orgânica da AGU).