Olá, pessoal. Como estão?

Hoje vou abordar a tutela de evidência prevista no NCPC sob a perspectiva do litígio contra a Fazenda. Como as provas de concurso da Advocacia Pública têm explorado bastante as tutelas provisórias, vou aproveitar o post para fazer uma breve revisão acerca da tutela de evidência e no fim farei a abordagem sob a ótica do Poder Público.

De início, importa ressaltar que a evidência não se trata propriamente de um tipo de tutela jurisdicional, mas sim de técnica para obtenção de tutela satisfativa, constituindo-se em pressuposto que serve tanto à tutela definitiva quanto à provisória.

Especificamente no que concerne à tutela provisória de evidência, esta se diferencia da tutela de urgência por exigir apenas a evidência do direito, não havendo necessidade de que seja demonstrada urgência, na medida em que não se relaciona com a urgência ou com o risco de inutilidade da tutela definitiva.

Nas palavras de Leonardo Carneiro da Cunha:

“A concessão da tutela provisória de evidência depende da prova das alegações de fato e da demonstração de probabilidade do acolhimento do pedido formulado pela parte. As afirmações de fato e de direito põem-se em estado de evidência, justificando-se a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional postulada, com concretização do princípio da duração razoável. O ônus do tempo do processo é melhor avaliado, beneficiando a parte que aparenta ter razão, por ser muito evidente a probabilidade de acolhimento de sua pretensão.”

O CPC/15 prevê hipóteses genéricas de concessão de tutela de evidência no art. 311, in verbis:

Art. 311.  A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;

II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante[1];

III – se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa[2];

IV – a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.

Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

Conforme se depreende da leitura do artigo, os incisos I e III não trazem hipóteses novas de tutela de evidência, na medida em que coincidem com o previsto no inc. II do art. 273 do CPC/73 (tutela antecipada concedida em razão do abuso do direito de defesa) e nos arts. 901 a 906 do Código revogado (procedimento especial da ação de depósito).

Nesse contexto, pode-se afirmar que a tutela de evidência não é propriamente uma inovação do NCPC, já que existiam hipóteses de concessão desta no CPC/73. O que o CPC/15 traz de novo é rubrica e duas hipóteses novas de tutela de evidência que o Código anterior não previa, contidas nos incisos II e IV do art. 311.

Especificamente no que concerne à Fazenda Pública, sabe-se que existem vedações à concessão de tutelas provisórias em face do Poder Público, conforme se extrai do art. 1º da Lei 8.437/92, dos arts. 1º e 2º-B da Lei 9.494/97 e dos arts. 7º e 14 da Lei 12.016/09.

Embora antecedam ao NCPC, tais vedações foram acolhidas pelo mesmo, que dispõe no art. 1.059: “À tutela provisória requerida contra a Fazenda Pública aplica-se o disposto nos arts. 1o a 4o da Lei no 8.437, de 30 de junho de 1992, e no art. 7o, § 2o, da Lei no 12.016, de 7 de agosto de 2009.”

Sem embargo, a doutrina majoritária entende que as vedações à concessão de tutela antecipada contra o Poder Público NÃO se aplicam à tutela de evidência.

A esse respeito, confira-se o enunciado nº 35 do FPPC:

Enunciado n. 35: As vedações à concessão de tutela provisória contra a Fazenda Pública limitam-se às tutelas de urgência. (g.n.)

Assim, é possível a concessão de tutela de evidência em face da Fazenda Pública, quando esta abusar de seu direito de defesa, quando houver provas documentais e tese firmada em julgamento de repetitivos ou súmula vinculante e, ainda, caso proposta ação de depósito contra o Poder Público.

Por outro lado, no que diz respeito ao inc. IV do art. 311 do CPC, o enunciado deve ser lido com a devida adaptação. Tal inciso dispõe ser possível a concessão da tutela de evidência quando “a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.” Tal previsão objetiva afastar o efeito suspensivo da apelação (art. 1012, §1º, V, CPC). Nesse caso, advertem Leonardo Carneiro da Cunha e Guilherme Freire de Melo Barros que as vedações legais à concessão de tutela provisória devem ser aplicadas, de modo a impedir a realização de pagamento, porquanto indispensável o trânsito em julgado para a expedição de precatório ou requisição de pequeno valor.

Desse modo, podemos concluir pela possibilidade de concessão de tutela de evidência em face do Poder Público, não se aplicando, inclusive, as vedações à concessão de tutela antecipada contra o Poder Público, ressalvando-se a impossibilidade de expedição de precatório/RPV, haja vista o regime próprio de pagamento a que se submete a Fazenda.

Por hoje é só. Bons estudos!

Bibliografia:

BARROS, Guilherme Freire de Melo. Poder Público em juízo para concursos. 6ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016.

CUNHA, Leonardo Carneiro da. A Fazenda Pública em juízo. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.

[1] Enunciado n. 30 da ENFAM: É possível a concessão da tutela de evidência prevista no art. 311, II, do CPC/2015 quando a pretensão autoral estiver de acordo com orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle abstrato de constitucionalidade ou com tese prevista em súmula dos tribunais, independentemente de caráter vinculante.

Enunciado n. 31da ENFAM: A concessão da tutela de evidência prevista no art. 311, II, do CPC/2015 independe do trânsito em julgado da decisão paradigma.

[2] Enunciado n. 29 da ENFAM: Para a concessão da tutela de evidência prevista no art. 311, III, do CPC/2015, o pedido reipersecutório deve ser fundado em prova documental do contrato de depósito e também da mora.