Olá alunos da EBEJI, como estão?

Espero que os estudos estejam se desenvolvendo bem. O assunto de hoje é sobre a existência (ou não) de danos morais quando ocorre abandono material por parte do genitor em relação ao seu filho.

O art. 229 da Constituição Federal determina que “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.”

O descumprimento dos deveres elencados no dispositivo mencionado, além por óbvio, dos abalos que gera na família e especialmente na criança ou adolescente, pode ensejar a configuração do delito previsto no art. 244 do Código Penal, o qual dispõe da seguinte forma:

Art. 244: Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo:

Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Tal tipo penal cuida especificamente do abandono material. O que seria, então esse abandono material? O abandono material é o ato de deixar de prover a subsistência do filho, no caso, um dos sujeitos passivos, sem justa causa. É dizer, deixar de prover as necessidades materiais deste, não o assistindo economicamente.

Nos dizeres de Katia A. Maciel, in Curso de Direito da Criança e do Adolescente, pag. 191,

O dever de sustentar o filho menor de 18 anos, resultante do poder familiar, configura-se na provisão da subsistência material, ou seja, no fornecimento de alimentação, vestuário, moradia, educação, medicamentos, de condições de sobrevivência e desenvolvimento do menor.”

Este munus alimentar dos pais aos filhos menores está estatuído, além da previsão constitucional, no art. 22 do ECA c/c arts. 1.566, inciso IV, 1.568 e 1.724 do Código Civil. Cessa o dever de sustento, a princípio, com a maioridade civil ou a emancipação, porque estas rompem com o poder familiar.

Assim, mesmo que o filho menor de idade trabalhe ou disponha de recursos financeiros para manter-se através de bens próprios, aos pais incumbe o dever de sustentar a prole, pois se presume a sua necessidade diante da incapacidade de gerir sua pessoa e suas rendas.

O dever de sustento inerente ao poder familiar, em regra, pode e deve ser prorrogado até que o filho atinja a idade de 24 anos, desde que esteja cursando nível superior, valorizando-se, desta forma, o filho que deseja se aperfeiçoar nos estudos e preparar-se para a vida independente.

Pois bem. Visto que a assistência material é dever inerente aos genitores, decorrente do poder familiar, a sua falta enseja, muitas vezes, como exposto acima, a prática de infração penal, a qual existe apenas na modalidade dolosa. No entanto, a reprovação de tal comportamento omisso não se restringe à seara penal, mas também é alvo de reprovação no âmbito civil. Assim, verificada a existência de um dano,  admite-se, então, a reparação em virtude da não prestação da assistência econômica.

É dizer, não prestar o suporte material devido enseja o pagamento de danos morais e/ou materiais, a depender do caso e do que se tem por comprovado, pois a afeta a integridade como um todo da criança ou adolescente.

É o que decidiu a Quarta Turma do STJ no seguinte julgado:

Info 609 STJ

REsp 1.087.561-RS, Rel. Min. Raul Araújo, por unanimidade, julgado em 13/6/2017, DJe 18/8/2017.

Família. Abandono material. Menor. Descumprimento do dever de prestar assistência material ao filho. Ato ilícito. Danos morais. Compensação. Possibilidade.

A omissão voluntária e injustificada do pai quanto ao amparo material do filho gera danos morais, passíveis de compensação pecuniária. Cinge-se a controvérsia a definir se é possível a condenação em danos morais do pai que deixa de prestar assistência material ao filho. Inicialmente, cabe frisar que o dever de convivência familiar, compreendendo a obrigação dos pais de prestar auxílio afetivo, moral e psíquico aos filhos, além de assistência material, é direito fundamental da criança e do adolescente, consoante se extrai da legislação civil, de matriz constitucional (Constituição Federal, art. 227). Da análise dos artigos 186, 1.566, 1.568, 1.579 do CC/02 e 4º, 18-A e 18-B, 19 e 22 do ECA, extrai-se os pressupostos legais inerentes à responsabilidade civil e ao dever de cuidado para com o menor, necessários à caracterização da conduta comissiva ou omissiva ensejadora do ato ilícito indenizável. Com efeito, o descumprimento voluntário do dever de prestar assistência material, direito fundamental da criança e do adolescente, afeta a integridade física, moral, intelectual e psicológica do filho, em prejuízo do desenvolvimento sadio de sua personalidade e atenta contra a sua dignidade, configurando ilícito civil e, portanto, os danos morais e materiais causados são passíveis de compensação pecuniária. Ressalta-se que – diferentemente da linha adotada pela Terceira Turma desta Corte, por ocasião do julgamento do REsp 1.159.242-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi – a falta de afeto, por si só, não constitui ato ilícito, mas este fica configurado diante do descumprimento do dever jurídico de adequado amparo material. Desse modo, estabelecida a correlação entre a omissão voluntária e injustificada do pai quanto ao amparo material e os danos morais ao filho dali decorrentes, é possível a condenação ao pagamento de reparação por danos morais, com fulcro também no princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal). (grifos meus)

Note-se que o fundamento da responsabilidade civil aqui analisada é justamente a dignidade do filho, que resta invariavelmente afetada pela ausência de suporte material em todos os âmbitos de sua vida, atingindo sua integridade física, psicológica, moral e intelectual.

A falta de afeto, por outro lado, é tema diverso, já havendo julgado do STJ (REsp 1.159.242-SP) no sentido de que não enseja a indenização pecuniária. Assim, podemos concluir que a indenização material, seja ela por danos morais ou por danos materiais causados, existe na hipótese em que o genitor negligencia o filho, deixando-lhe de fornecer amparo econômico capaz de suportar suas despesas. Ressalte-se, por oportuno, que a obrigação que aqui se discute não impõe que o genitor arque in totum com todos os gastos, mas de acordo com sua possibilidade, lembrando-se do binômio que rege a prestação alimentícia, necessidade-possibilidade (art. 1.694, §1º, CC).

Ademais, além disto, importante frisar que o dever de sustento compete a ambos os genitores, como destacado no art. 1.566, IV, do CC (Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges: IV – sustento, guarda e educação dos filhos.), o que determina, portanto, que as despesas dos filhos devem ser custeadas pelos pais conjuntamente, e não apenas por um ou por outro ente familiar, ensejando esta falta, então, o pagamento dos danos aqui discutidos.

Como a decisão do tema é recente, pois veiculada no informativo nº 609, importante conhecer o posicionamento sobre a questão para os concursos vindouros.

Boa semana e bons estudos a todos!