Olá pessoal, tudo certo?

Hoje vamos trabalhar com um tema extremamente importante e complexo. Tentarei, porém, tecer considerações o mais didaticamente possível, vez que tenho absoluta convicção que será assunto enfrentado em provas vindouras. Trata-se da natureza jurídica da ação penal desafiada pelo crime de estupro de vulnerável.

Em uma primeira leitura, a questão pode parecer (muito) simples. Isso porque a resposta (aparentemente segura) nos é dada pelo parágrafo único do artigo 225 do CPB, ao firmar que, diferentemente da regra nos crimes contra a dignidade sexual, “procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável”. Perceba que, a um só tempo, o legislador previu ser a ação penal pública condicionada à representação a regra tanto para os crimes contra a liberdade sexual e para os crimes sexuais contra vulnerável, como também indicando que para nesse último caso ela seria pública incondicionada (parágrafo único)!

A grande questão se põe quando estivermos diante de um estupro de vulnerável quando a incapacidade for transitória. Isso porque, em um julgado da 6ª Turma do STJ (HC 276.510/RJ), afirmou-se que “em relação à vítima possuidora de INCAPACIDADE PERMANENTE de oferecer resistência à prática dos atos libidinosos, a ação penal seria sempre incondicionada. Mas, em se tratando de pessoa incapaz de oferecer resistência apenas na ocasião da ocorrência dos atos libidinosos, a ação penal permanece condicionada à representação da vítima, da qual não pode ser retirada a escolha de evitar o strepitus judicii. (…). No caso em exame, observa-se que, embora a suposta vítima tenha sido considerada incapaz de oferecer resistência na ocasião da prática dos atos libidinosos, esta não é considerada pessoa vulnerável, a ponto de ensejar a modificação da ação penal. Ou seja, a vulnerabilidade pôde ser configurada apenas na ocasião da ocorrência do crime. Assim, a ação penal para o processamento do crime é pública condicionada à representação”. 

A partir desse precedente, a jurisprudência parecia delinear um tratamento diferente para os casos de estupro de vulnerável, quando a vulnerabilidade tivesse raízes (i) permanentes e (ii) transitórias. Assim, na primeira hipótese, o delito desafiaria ação penal pública INCONDICIONADA, ao passo que a segunda situação seria de ação penal pública CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO. Ilustrando, imagine que uma pessoa completamente alcoolizada ou durante um sono profundo fosse alvo de atos libidinosos. Estaríamos, certamente, diante do crime do artigo 217-A do CPB, mas – considerando a incapacidade transitória – o crime seria de ação penal pública condicionada à representação da vítima!

Bacana, Pedro! Você já tinha falado disso em aulas e também em uma postagem aqui no blog da EBEJI! Houve alguma novidade?

Sim! É que recentemente, de maneira unânime, a 5ª Turma abriu divergência ao entendimento acima esposado pela 6ª Turma. Daí porque precisaremos aguardar a posição da 3ª Seção para termos uma definição sobre a posição do STJ! Até lá, teremos que ter muito cuidado, ok?

Certo, Pedro! Mas o que a 5ª Turma falou?

No julgamento do HC 389.610/SP, apreciando a natureza jurídica da ação penal a ser aplicada no delito de estupro de vulnerável quando a vítima estava incapaz de oferecer resistência por dormir no curso dos fatos praticados, deliberou-se estar diante de um caso de ação penal pública INCONDICIONADA, ainda que a incapacidade fosse transitória! Segundo o colegiado, “em casos de vulnerabilidade da ofendida, a ação penal é pública incondicionada, nos moldes do parágrafo único do art. 225 do Código Penal. Constata-se que o referido artigo não fez qualquer distinção entre a vulnerabilidade temporária ou permanente, haja vista que a condição de vulnerável é aferível no momento do cometimento do crime, ocasião em que há a prática dos atos executórios com vistas à consumação do delito”.

Temos, pois, DIVERGÊNCIA entre a 5ª e 6ª Turmas! Apesar de entender o posicionamento da 6ª Turma como o mais correto e adequado ao caso (pelo curto espaço, não vou declinar as razões desse meu entendimento), deveremos acompanhar de perto a evolução do tema no STJ, bem como aguardar eventual futuro posicionamento da 3ª Seção!

Espero que tenham entendido e, sobretudo, gostado!

Vamos em frente!