ISSQN e IPTU NO CONTEXTO DA CONCESSÃO DE AEROPORTOS – Caiu para PGM Recife.

 

Como fica a incidência e imunidade constitucional no contexto da concessão de aeroportos, tendo como figurantes jurídicos a União e a empresa concessionária do serviço aeroportuário.

Algumas observações preliminares:

– Os temas abordados abaixo foram cobrados na prova para Procurador do Município de Recife.

– Eu não tive acesso à prova, mas apenas ao tema, de forma abstrata.

– Confesso que pela novidade quanto aos pontos tratados abaixo, alerto aos colegas do Blog que se tratam de opiniões preliminares que tem um fundamento, mas que não pretendem servir de ‘verdade’ ou como resposta certa.

CONTEXTO: Concessão de aeroportos pelo Governo Federal.

1 – Incide IPTU sobre os imóveis da União (aeroportos), operados por empresa privada?

Não. O tema não é recente; já foi tratado com outra roupagem em concursos públicos.

Vejamos, por exemplo, a seguinte questão que fora cobrada para Juiz Federal:

Entendimento do CESPE/UNB – Prova do TRF da 5o Região (Juiz Federal/2007): “A União, almejando facilitar o escoamento da produção nacional de biocombustível para o exterior, construiu estrutura portuária em imóvel integrante do seu domínio econômico, situado em determinado Município brasileiro. Para se viabilizarem as atividades do porto, os serviços portuários foram delegados à pessoa jurídica de direito privado que se utiliza do acervo patrimonial portuário da União. Nessa situação, o referido Município não pode cobrar IPTU da empresa delegatária, a qual, todavia, é contribuinte de taxa de limpeza urbana.” (Gabarito: CERTO)

Mutatis Mutandi, a mesma razão deve ser aplicada aos Aeroportos. O acervo patrimonial é da União e a finalidade do imóvel permanece a mesma.

Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a respaldar o entendimento do enunciado acima, há os seguintes precedentes: RE 253.394, 597.563 e o AI 458.856 (talvez este último tenha sido a ‘inspiração do CESPE para a prova de Juiz Federal/2007).

Por todos, a ementa do RE 253.394:

“TRIBUTÁRIO. IPTU. IMÓVEIS QUE COMPÕEM O ACERVO PATRIMONIAL DO PORTO DE SANTOS, INTEGRANTES DO DOMÍNIO DA UNIÃO. Impossibilidade de tributação pela municipalidade, independentemente de encontrarem-se tais bens ocupados pela empresa delegatária dos serviços portuários, em face da imunidade prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal. Dispositivo, todavia, restrito aos impostos, não se estendendo às taxas.”

O Superior Tribunal de Justiça, de igual modo, tem entendimento semelhante, ainda que por outro argumento:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.381.034 – RJ: (trecho da ementa, no que nos interessa) TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ACÓRDÃO FUNDAMENTADO EM MATÉRIA CONSTITUCIONAL E INFRACONSTITUCIONAL. CABIMENTO DO RECURSO ESPECIAL PARA ANÁLISE DA QUESTÃO SOB ENFOQUE INFRACONSTITUCIONAL. IPTU. IMÓVEL PERTENCENTE À UNIÃO. CONCESSÃO DE USO. RELAÇÃO DE DIREITO PESSOAL. NÃO INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. 3. Nos termos da jurisprudência do STJ, somente é contribuinte do IPTU o possuidor que tenha animus domini. O cessionário não pode ser taxado de contribuinte do aludido imposto, por não exercer nenhum direito de propriedade sobre o imóvel.

4. Hipótese em que a ora agravada não é contribuinte do IPTU, haja vista que é possuidora por relação de direito pessoal, não exercendo o domínio, sendo possuidora do imóvel como simples detentora de coisa alheia.

Agravo regimental improvido.

Esse processo trata exatamente do caso do aeroporto do Rio de Janeiro.

CONCLUSÃO 1: Há imunidade para o IPTU – de todas as dependências do Aeroporto, ainda que explorado por empresa de Taxi Aéreo (hangar utilizado por aeronaves), lojas de conveniências alugadas, ou ainda explorado o serviço por completo por concessionária privada (delegatária contratual da União).

 

2 – ISS sobre as chamadas “receitas tarifárias e não-tarifárias”. Incidência, no contexto da concessão do serviço aeroportuário?

Primeiro: quais são as receitas decorrentes da exploração de um serviço aeroportuário?

Utilizo aqui a doutrina de Leandro Paulsen, em “Impostos Federais, Estaduais e Municipais”, 2012, Livraria do Advogado:

“Ademais, são também cobradas taxas de aluguel de bens taxas de utilização de infraestrutura portuária e terrestre, e taxas de serviços gerais.

A utilização dos aeroportos e suas instalações, equipamentos, facilidades e serviços, implicam remunerações por preços que incidem sobre a parte utilizada, a serem pagos ao Ministério da Aeronáutica, ou às entidades de Administração Federal Indireta, responsáveis pela administração dos aeroportos, mediante a) tarifas aeroportuárias (aplicação geral em todo território nacional); e b) preços específicos (áreas civis de cada aeroporto).”

Percebemos que da exploração do serviço aeroportuário decorrem as chamadas RECEITAS TARIFÁRIAS e RECEITAS NÃO TARIFÁRIAS.

Em um artigo na Revista Carta Capital, colhi que “Já as receitas são constituídas de tarifas e de atividades não-tarifárias – exploração do espaço interno e externo do aeroporto, serviços adicionais para passageiros e companhias aéreas etc.” (In, Economia. Carta Capital. O novo desenho dos aeroportos. https://www.cartacapital.com.br/economia/o-novo-desenho-dos-aeroportos)

Analisando o Relatório de Administração da Concessionária do Aeroporto Internacional de Guarulhos S.A., temos as seguintes Receitas enumeradas: Receitas de Serviços, Receita de Juros e Receita de Construção. (https://www.valor.com.br/sites/default/files/upload_element/27-03_concessionaria_aeroporto_guarulhos_balanco_todos.pdf)

Por sua vez, a Receita de Serviços se divide em: Tarifárias e Não-Tarifárias.

Diz o referido relatório: “a) Receita de serviços: A receita de serviços é mensurada com base no valor justo da contraprestação recebida, excluindo descontos, abatimentos e impostos ou encargos sobre vendas, sendo registrada no momento da prestação dos serviços. Receita de serviços tarifários: os serviços tarifários incidem sobre a efetiva utilização dos serviços, dos equipamentos, das instalações e das facilidades disponíveis no aeroporto. Contemplam as tarifas de embarque, conexão, pouso, permanência, armazenagem e capatazia. Receita de serviços não tarifários: os serviços não tarifários contemplam quaisquer procedimentos caracterizados como retrabalho ou atividades não previstas, classificados e remunerados na legislação realizados nas dependências dos complexos logísticos por solicitação de clientes.”

Percebemos que a concessão do aeroporto significa a exploração do serviço aeroportuário em si e das comodidades que atendam aos clientes/usuários que o utilizam.

Aqui não vale – ao meu ver – o debate sobre a locação como fato gerador do ISSQN, mas de um serviço aeroportuário com todas as suas variáveis, explorado da forma mais ampla e completa (basta ver o conceito acima, contido no relatório de administração colacionado, de receitas não-tarifárias).

Ou seja: há a concessão de um serviço pela União, a ser prestado aos usuários de aeroportos, com as comodidades que lhes sejam úteis (alimentação, lojas, conveniências, bancas de revistas e etc), além – é claro – dos procedimentos de embarque do passageiro e bagagens.

Tudo isso consiste em um SERVIÇO.

Serviço aeroportuário, com receitas tarifárias e não-tarifárias.

Aqui – confesso – tenho uma pequena dúvida se a locação de determinado espaço (e a receita daí decorrente) seria tarifárias ou não-tarifárias. Isso porque as “facilidades disponíveis no aeroporto” são elencadas no relatório citado como receitas tarifárias.

Para efeito de incidência do ISS é irrelevante.

Permitam-me, como arremate, citar outra vez o relatório da Concessionária do Aeroporto Internacional de Guarulhos S.A., quando trata dos tributos incidentes:

“A Companhia possui serviços de diferentes naturezas e tributados pelo ISS a 2% para receitas tarifárias e 5% para receitas não tarifárias.”

O próprio relatório diz que incide ISS sobre essas receitas.

CONCLUSÃO 2: INCIDE ISSQN sobre as receitas decorrentes dos serviços aeroportuários prestados pelas concessionárias – seja ele tarifário ou não tarifário.

Incidirá o ISS sobre as receitas que a concessionária receba pela ‘locação’ de bens a lojas diversas e os valores repassados a título de tarifa aeroportuária.

Por fim, algumas questões interessantes.

Tomarei como exemplo o Aeroporto de Viracopos: o site oficial fala no ‘aumento’ de arrecadação do ISS, noticiado no próprio site – https://www.viracopos.com.br/noticias/viracopos/viracopos-aumenta-arrecadacao-de-iss

O site G1 também comentou o aumento do ISS: https://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2013/04/prefeito-diz-que-reducao-de-iss-para-viracopos-e-injusta-e-exige-estudo.html

Estou à disposição, renovando as ressalvas dos entendimentos contrários.

Abraços!

Renato Cesar Guedes Grilo