Na última semana, durante uma reunião da ONU, o Brasil foi submetido a uma prática internacional conhecida como naming and shaming. Se isso chamou a nossa atenção, por certo, também chamou a atenção do nosso examinador. Vamos descobrir do que se trata?

Naming and shaming é uma prática que não traz quaisquer sanções formais, consistente em colocar em evidência o País violador de Direitos Humanos sob holofote da imprensa internacional e de Organizações Não-Governamentais, apontando-lhe o dedo direto às violações.

Cuida-se de exemplo de costume como fonte do Direito no âmbito da ONU, pois não se encontra expressamente prevista da Declaração Universal dos Direitos do Homem ou na Carta das Nações Unidas, não sendo confundida com a recomendação, esta sim prevista. A ideia da prática é constranger e pressionar, a fim de que sejam corrigidas as causas das mazelas. Já as recomendações podem ser definidas na forma abaixo:

No âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU), o mais importante exercício de monitoramento é realizado pelo Conselho de Direitos Humanos (órgão composto por 47 Estados-membros, eleitos para um mandato de três anos, com possibilidade de uma reeleição consecutiva). O Conselho se reúne em três sessões por ano, durante as quais realiza a chamada Revisão Periódica Universal (RPU).

A RPU é uma espécie de sabatina pela qual todos os 193 países da ONU devem passar a cada quatro anos e meio, na qual cada um deles deve apresentar um relatório sobre as ações que tenham empreendido para promover, internamente, os direitos humanos. Uma vez apresentado o relatório, cada país deve ouvir as recomendações dos Estados-membros do Conselho para aprimorar sua atuação e informar sobre o cumprimento dessas recomendações em seu relatório seguinte.

Além do Conselho de Direitos Humanos e de seu mecanismo de RPU, existem, no âmbito da ONU, os chamados órgãos de monitoramento de tratados de direitos humanos. Trata-se de uma série de comitês responsáveis pelo monitoramento de convenções específicas (por exemplo, o Comitê de Direitos Humanos, que monitora o cumprimento do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos; o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que monitora o cumprimento do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; e o Comitê dos Direitos da Criança, que monitora o cumprimento da Convenção sobre os Direitos da Criança, entre outros Comitês). Cada país signatário deve apresentar, periodicamente, um relatório sobre o cumprimento do instrumento internacional monitorado por cada Comitê, que, em seguida, fará recomendações que devem ser levadas em conta pelo país em seu próximo relatório[1]

Durante a Reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, ocorrida em 05 de maio do corrente ano, o Brasil foi publicamente envergonhado pelos seguintes fatos: falta de proteção adequada aos povos indígenas, com menções ao incidente no Maranhão em que há relatos de torturas de índios e notícia de decepamento de membros superiores[2]; os episódios de descontrole sobre a política pública prisional (na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, em Roraima, 33 presos foram mortos; no Complexo Anísio Jobim, em Manaus-AM, foram 56 mortos)[3]; além de ter sido recordista mundial de homicídios no ano de 2015.

Sem exercer juízo de valor sobre as práticas apontadas, a doutrina diverge acerca da efetividade desta medida. Para Emilie M. Hafner-Burton, as estatísticas demonstram que os governos postos em evidência acabam perpetrando os abusos ou mascarando ainda mais outros que tenham escapado aos holofotes. Já Ray Pawsson considera a medida importante, desde que acompanhada de outras mais efetivas, que podem ir de embargos econômicos a condenações internacionais, além de ressaltar o risco da manipulação política de uso das informações.

No âmbito continental, levando em consideração os precedentes da Corte Interamericana de Direitos Humanos, e o fato de ter a OAB levado à questão dos presídios à Corte, não será difícil ver o Brasil condenado novamente[4]. No Caso Presídio Urso Branco (Caso nº 12.568), o Brasil restou condenado por tortura e morte de quase cem presos. Vamos conhecer o dispositivo da condenação e enriquecer nossos estudos:

  1. Requerer ao Estado que: a) adote de forma imediata todas as medidas que sejam necessárias para proteger eficazmente a vida e integridade pessoal de todas as pessoas detidas na Penitenciária Urso Branco, assim como as de todas as pessoas que ingressem nesta, entre elas os visitantes e os agentes de segurança que prestam seus serviços na mesma; b) adeque as condições da mencionada penitenciária às normas internacionais de proteção dos direitos humanos aplicáveis à matéria7 ; c) remeta à Corte uma lista atualizada de todas as pessoas que se encontram detidas na penitenciária e, ademais, indique com precisão: 1) as pessoas que sejam colocadas em liberdade; 2) as pessoas que ingressem no referido centro penal; 3) o número e nome dos reclusos que se encontram cumprindo condenação; 4) o número e nome dos reclusos sem sentença condenatória; e 5) se os reclusos condenados e os não condenados se encontram localizados em diferentes seções; d) investigue os acontecimentos que motivam a adoção das medidas provisórias com o fim de identificar os responsáveis e impor-lhes as sanções correspondentes, incluindo a investigação dos acontecimentos graves ocorridos na penitenciária depois da Corte ter emitido a Resolução de 18 de junho de 2002; e e) no máximo em 6 de novembro de 2005, apresente à Corte o décimo primeiro relatório sobre o cumprimento das medidas indicadas nos anteriores incisos deste ponto resolutivo e nos pontos resolutivos segundo e terceiro, particularmente sobre as medidas que adote de forma imediata para que não se produzam privações de vida nem atos que atentem contra a integridade das pessoas detidas na penitenciária e das que por qualquer motivo ingressem na mesma. 2. Requerer ao Estado que realize todas as gestões pertinentes para que as medidas de proteção sejam planificadas e implementadas com a participação dos peticionários das medidas, de tal maneira que as referidas medidas sejam brindadas de forma diligente e efetiva e que, em geral, o Estado mantenha os peticionários informados sobre o avanço de sua execução. 3. Requerer aos peticionários das medidas e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos que apresentem suas observações ao relatório solicitado no ponto resolutivo primeiro desta Resolução dentro do prazo de dois e quatro semanas, respectivamente, contados a partir de seu recebimento. 4. Requerer ao Estado que continue informando à Corte Interamericana de Direitos Humanos, a cada dois meses, sobre o cumprimento e implementação das medidas indicadas nos pontos resolutivos primeiro e segundo da presente Resolução. 5. Requerer aos peticionários das medidas e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos que apresentem suas observações aos relatórios bimestrais do Estado dentro dos prazos de quatro e seis semanas, respectivamente, contados a partir de seu recebimento. 6. Notificar a presente Resolução à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, aos peticionários das medidas e ao Estado”.

Agora que conhecemos o naming and shaming, tivemos uma noção do que diz respeito à nossa Nação na última reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, além de conhecer um importante leading case internacional envolvendo o Brasil, que tal aprofundar estudando os demais casos envolvendo o Brasil?

Com esta exposição, espero tê-los ajudado a um possível enfrentamento em concursos.

Bons estudos!

[1] http://www.observadh.sdh.gov.br/portal/sistema/o-que-sao-as-recomendacoes-internacionais

[2] CAMPELO, Lilian. Indígena Gamela teve mãos decepadas e joelhos cortados durante massacre. Belém, 2017. Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2017/05/02/indigena-gamela-teve-maos-decepadas-e-joelhos-cortados-durante-massacre/

[3] Notícia extraída do sítio eletrônico http://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/2017/01/rebeliao-no-compaj-chega-ao-fim-com-mais-de-50-mortes-diz-ssp-am.html, acesso em 22/02/2017

[4] Nota CFOAB de 06/01/2017, acessível através do link: http://www.oab.org.br/noticia/54633/apos-mais-uma-chacina-em-presidios-oab-ira-a-corte-interamericana-de-direitos-humanos.