Inicialmente, é preciso dizer que a AGU, por meio de sua Súmula 46 de 2009, veja eu disse 2009, já entendia que:

“Será liberada da restrição decorrente da inscrição do município no SIAFI ou CADIN a prefeitura administrada pelo prefeito que sucedeu o administrador faltoso, quando tomadas todas as providências objetivando o ressarcimento ao erário.”

O STJ editou a Súmula 615 com o seguinte teor:

“Não pode ocorrer ou permanecer a inscrição do município em cadastros restritivos fundada em irregularidades na gestão anterior quando, na gestão sucessora, são tomadas as providências cabíveis à reparação dos danos eventualmente cometidos.”

Perceba, inicialmente uma diferença, a Súmula 46 da AGU libera a restrição enquanto que a Súmula 615 do STJ informa não poder ocorrer a inscrição ou, caso já realizada, não deve permanecer o Município em cadastros restritivos. Os dois normativos condicionam a necessidade de providências para o devido ressarcimento ao erário por parte do novo gestor.

Pois bem! Vamos entender o caso.

Imagine que um Município está inscrito no SIAFI (CAUC/CADIN) da União Federal pela não prestação de contas de um convênio X, firmado com o Ministério do Turismo. Considere que essa ausência de prestação de contas se deu na gestão do Prefeito Y e perdura mesmo quando da assunção ao cargo de um novo Prefeito. Todos sabemos que, a inscrição do Município em cadastro de inadimplência do governo federal impossibilita a realização de transferências voluntárias da União para o ente menor, o que impossibilita a sobrevivência municipal que depende muito desses repasses, vejamos.

LEI COMPLEMENTAR 101/2000

Art. 25. Para efeito desta Lei Complementar, entende-se por transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde.

1o São exigências para a realização de transferência voluntária, além das estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias:

(…)

IV – comprovação, por parte do beneficiário, de:

a) que se acha em dia quanto ao pagamento de tributos, empréstimos e financiamentos devidos ao ente transferidor, bem como quanto à prestação de contas de recursos anteriormente dele recebidos;

Assim, resta claro que, pelo art. 25, parágrafo 1º, IV, a da Lei Complementar 101/2000, a não prestação de contas determina o cancelamento das transferências voluntárias.

A 1ª pergunta que se estabelece: é justo que a nova administração municipal deixe de receber os recursos voluntários necessários ao bem-estar do ente federado em razão de inadimplência registrada em nome de outro gestor, o gestor anterior? Contrariando essa ideia, há quem defenda tratar-se de dívida do Município para coma a União, ou seja, quem deve é o ente, não o gestor que o administra, razão pela qual até que o ente resolva a inadimplência, independentemente do seu gestor, não deve receber as transferências voluntárias.

Veja parte de um julgado do STF a sustentar a ideia contrária:

O Colegiado asseverou que a inscrição do nome do Estado-Membro em cadastro federal de inadimplentes em face de ações e/ou omissões de gestões anteriores não configura ofensa ao princípio da intranscendência. Acrescentou que vigora, no âmbito da Administração Pública, o princípio da impessoalidade, previsto no artigo 37 da CF. A relação jurídica envolve a União e o ente federal, e não a União e certo governador ou outro agente. O governo se alterna periodicamente nos termos da soberania popular, mas o Estado é permanente. A mudança de comando político não exonera o Estado das obrigações assumidas. ACO 732/AP, rel. Min. Marco Aurélio, 10.5.2016. (ACO-732)

De fato, não se trata de exonerar o Município da obrigação, mas suspender sua inscrição do SIAFI a fim de que possa continuar recebendo transferências voluntárias.

Contudo, percebe-se, pelas súmulas já informadas, como a AGU e o STJ responderam o questionamento. Contudo, a construção não é meramente jurisprudencial, vejamos.

A Lei 10.522 de 2002 que dispõe sobre o CADIN (Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais) dispõe, em seu art. 7º e 26, o seguinte:

Art. 7o Será suspenso o registro no Cadin quando o devedor comprove que:

I – tenha ajuizado ação, com o objetivo de discutir a natureza da obrigação ou o seu valor, com o oferecimento de garantia idônea e suficiente ao Juízo, na forma da lei;

II – esteja suspensa a exigibilidade do crédito objeto do registro, nos termos da lei.

Art. 26. Fica suspensa a restrição para transferência de recursos federais a Estados, Distrito Federal e Municípios destinados à execução de ações sociais ou ações em faixa de fronteira, em decorrência de inadimplementos objetos de registro no Cadin e no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal – SIAFI. (Redação dada pela Lei 12.810/2013).

Perceba que a lei estabelece situações em que se suspende o registro no Cadin ou, pelo menos, seus efeitos (em casos de recursos destinados a ações sociais ou ações em faixa de fronteira).

A Lei 12.810/2013, incluindo o art. 26-A na Lei 10.522/2002, disse:

Art. 26-A. O órgão ou entidade que receber recursos para execução de convênios, contratos de repasse e termos de parcerias na forma estabelecida pela legislação federal estará sujeito a prestar contas da sua boa e regular aplicação, observando-se o disposto nos §§ 1º a 10 deste artigo.

(…)

Cabe ao prefeito e ao governador sucessores prestarem contas dos recursos provenientes de convênios, contratos de repasse e termos de parcerias firmados pelos seus antecessores.

Na impossibilidade de atender ao disposto no § 7o, deverão ser apresentadas ao concedente justificativas que demonstrem o impedimento de prestar contas e solicitação de instauração de tomada de contas especial.

Adotada a providência prevista no § 8o, o registro de inadimplência do órgão ou entidade será suspenso, no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas, pelo concedente.

Em síntese, os requisitos a serem observados para a suspensão da inadimplência são os seguintes:

a) ter o município outro administrador que não o faltoso;

b) encaminhar o prefeito sucessor ao concedente:

(I) justificativas que demonstrem o impedimento de prestar as contas e

(II) solicitação de instauração de tomada de contas especial (TCE).

Perceba que a Súmula da AGU 46 bem como a Súmula do STJ 615 exigem providências cabíveis à reparação/ressarcimento ao erário.

Assim, acrescente-se como dever municipal, além daqueles listados pelo art. 26-A da Lei 10.522/2002:

a) representação do gestor anterior ao Ministério Público;

b) ingresso de ACP por ato de improbidade ou ação de ressarcimento do Município em face do gestor anterior.

Tomadas todas essas providências (todas em vermelho), de fato, o entendimento administrativo da AGU e jurisprudencial do STJ é pela suspensão do registro do Município do SIAFI (CAUC/CADIN).

O tema pode ser cobrado no concurso com os nomes: intranscendência subjetiva das sanções ou exceção ao princípio da impessoalidade. Explico!

1. O Supremo Tribunal Federal entende que as limitações jurídicas decorrentes do descumprimento de obrigação por entidade da administração indireta não podem ser atribuídas ao ente federal da qual participam e, pelo mesmo motivo, quando o desrespeito for ocasionado pelo Poder Legislativo ou pelo Poder Judiciário, as consequências não podem alcançar o Poder Executivo. (RE 768.238-AgR/PE, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI). Assim, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções impede que sanções atinjam pessoas que não participaram do ato ou que não tinham como evitá-lo, o que acontece justamente no caso analisado.

2. Quanto à exceção ao princípio da impessoalidade, a tese afasta justamente a ideia de que o ente federado, não importa o gestor, deve responder pela inadimplência e se manter no cadastro de devedores até que a obrigação seja efetivada. Pela impessoalidade, assim deveria agir a União, razão pela qual o afastamento da suspensão do Município nas condições acima explicadas representa exceção ao princípio da impessoalidade.

Excelente questão para ser cobrada em provas da Advocacia Pública em todas as fases!

Espero ter ajudado e não erre na prova!

É isso, forte abraço a todos! Ubirajara Casado

 

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