Prezado aluno EBEJI,

ebeji

Esse post terá a finalidade de forma breve, direta e sucinta, analisar como deve se operar a leitura do contraditório sob a lente do novo CPC, focando em como se dará a sua aplicação nos concursos públicos.

O contraditório possui base constitucional no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal. Constitui garantia de ciência dos atos e termos processuais com a consequente faculdade de falar sobre eles de modo que possa, efetivamente, influenciar o(s) membro(s) do órgão julgador nas suas decisões. A aplicação desse preceito pode ser lida, em proporções reduzidas, como exercício da democracia participativa, onde se otimiza a participação dos interessados no processo e alcança-se a legitimidade da prestação da tutela jurisdicional.

Vislumbra-se o contraditório sobre dois ângulos: formal e substancial. O primeiro possui um viés estático e restringe-se a garantir a comunicação dos atos e a consequente possibilidade de as partes falarem e se manifestarem no processo. Portanto, o conteúdo do contraditório formal restringe-se ao binômio: informação + possibilidade de reação.

O elemento informação será garantido por intermédio da comunicação dos atos processuais. O Código fornece duas formas: a citação, ato pelo qual o réu, executado, ou interessado, é convocado para integrar a relação processual e a intimação, que é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e dos termos do processo.

Vejam como pode se dá a cobrança desse tema:

(FGV. Agente Público. TCE/BA. 2013 – ADAPTADO): Suponha que em determinado processo de conhecimento que tramitava pelo rito comum tenha havido a juntada de importante documento pela parte autora sem que o Juiz, em momento seguinte, tenha intimado a parte adversa para que esta, tomando conhecimento da existência do documento, pudesse sobre ele se manifestar.

Assinale a alternativa que expressa o princípio processual de forma direta e efetiva violado pela hipótese descrita:

a) Princípio do Contraditório.

b) Princípio do Juiz Natural.

c) Princípio da Motivação das Decisões Judiciais.

d) Princípio da Tempestividade da Tutela Jurisdicional.

e) Princípio da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional.

RESPOSTA: LETRA A, pois a juntada de documento sem a intimação da parte adversa inquina a decisão de nulidade por violação do contraditório.

Já a possibilidade de reação é o segundo passo e remete a um ônus processual da parte em reagir ou não ao ato do qual tomou ciência. O contraditório é respeitado desde que se oportunize a reação, sendo possível que a parte concretamente não reaja.

Assim, esse binômio (informação + possibilidade de reação) é o núcleo mínimo do contraditório, que deve ser inicialmente garantido em todo processo devido.

Destaca-se que eventual assertiva de concurso que prescreva que o contraditório se esgota no direito de informação e no direito de reação a respeito das alegações de fato e das provas produzidas pelas partes ou que remeta o contraditório a necessidade unicamente de ciência bilateral deve ser considerada INCORRETA pelo aluno EBEJI.

Vejamos:

(FMP-RS. Juiz de Direito. TJ-MT. 2014 – ADAPTADO): Quanto ao direito ao contraditório no processo civil, é CORRETO afirmar que:

a) esgota-se no direito de informação e no direito de reação a respeito das alegações de fato e das provas produzidas pelas partes. INCORRETO

b) também chamado de bilateralidade da instância, é um princípio que tem por titulares e destinatários apenas as partes no processo. INCORRETO

Sigamos adiante:

O primeiro vetor do contraditório no CPC é o art. 9º, que prescreve: “não se proferirá sentença ou decisão contra uma das partes, sem que esta seja previamente ouvida”.

De logo, identifica-se uma atecnia no texto normativo, pois, em tese, é possível que uma decisão judicial respeite o contraditório mesmo que uma das partes não tenha sido previamente ouvida. Isso porque o elemento reação é um ônus processual da parte, que pode ser exercido ou não. Assim, por exemplo, é possível que a parte seja citada, tenha oportunidade de reação, mas não o faça, e, mesmo assim, o juiz decida, o que fará sem prejuízo algum ao contraditório.

Foi exatamente este o teor da questão para auditor federal do TCU de 2011 que foi considerada CORRETA: “o princípio do contraditório é uma garantia constitucional ligada ao processo, mas não impõe que as partes se manifestem de maneira efetiva em relação aos atos do processo, bastando que a elas seja concedida essa oportunidade”.

Nada obstante, atente-se para as mitigações a essa regra geral que são tuteladas pelo Código. O contraditório é uma garantia processual que visa a escudar as partes durante todo iter processual contra eventuais abusos, não havendo sentido útil na sua ativação, nos casos em que a decisão favoreça a parte que não participou do contraditório. Nessa perspectiva, apresenta-se a teoria do contraditório inútil ou infrutífero, ao acentuar que a dispensa do contraditório em desfavor da parte vencedora não pode ensejar a decretação de invalidade de atos processuais.

Afinal qual o sentido em ativar o contraditório se a parte será beneficiada com a decisão judicial?

Por isso que o legislador admite determinados procedimentos sem ativação inicial do contraditório para a parte favorecida, como no caso do indeferimento da petição inicial (art. 330, CPC) e da improcedência liminar do pedido (art. 332, CPC), situações cujas decisões judiciais são favoráveis à parte que não é citada.

No entanto, se a parte autora vencida recorrer da decisão, surgirá o dever da imediata ativação do contraditório, somado ao importante instrumento do juízo de retratação (possibilidade de o juiz modificar sua decisão em razão do empréstimo de efeito regressivo ao recurso), que viabilizará que a parte contrária exerça o seu contraditório de forma postergada (contraditório postecipado) na mesma instância em que foi proferida a decisão.

O contraditório postecipado não significa alijamento da referida garantia processual, mas apenas uma inversão do procedimento, a deslocar o contraditório para momento superveniente. As tutelas provisórias são campos férteis para sua aplicação. Elas podem ser conferidas por intermédio do contraditório padrão[1], mas, podem também ser concedidas liminarmente desde que preenchidos determinados requisitos, caso em que o contraditório será diferido[2].

O contraditório postergado pode ocorrer, por exemplo, nas situações dos três incisos do parágrafo único do art. 9º do CPC, quais sejam: nas tutelas provisórias de urgência; nas hipóteses de tutela de evidência dos incisos II e III do art. 311; na decisão prevista no art. 701 do CPC (espécie de tutela de evidência liminar).

Feita tais considerações acerca do aspecto formal, concentram-se, agora, as atenções à faceta dinâmica ou substancial do contraditório.

A partir de tal enfoque, o juiz deve ativar o contraditório a todo momento, dando oportunidades reais e efetivas de influência sobre o âmago de sua decisão e sobre o seguimento do processo, parificando as chances das partes no curso do processo. Esse viés relaciona-se ao poder das partes de influenciar, efetivamente, na formação da convicção do julgador, contribuindo na descrição dos fatos, produção de provas e debate das questões de direito, a potencializar uma decisão jurídica substancializada.

Daí inferir-se que o contraditório não se resume especificamente a um binômio, mas a um trinômio formado por: informação + possibilidade de reação + poder de influência. Essa nova arquitetura de diálogo possibilita o aprimoramento da cognição, ao tornar a decisão judicial mais democrática, mais comparticipativa, menos propensa a compreensões pré-concebidas e essencialmente apta a neutralizar as pretensões recursais das partes.

Com a previsão contida no art. 10º, o Código inaugura uma nova face ao contraditório, por intermédio do diálogo afirmado pela cooperação, que impõe ao juiz o dever de consulta. É desse ponto de interseção que se extrai a vedação às decisões por emboscada (surpresa).

Assim, o juiz passa a ser a inserido como sujeito do contraditório, de modo a se criar uma verdadeira mesa redonda de diálogo entre o trium personarum (partes e juiz). O contraditório passa a se revelar como o direito de ser informado, de reagir e de influenciar.

O Código rompe, então, a clássica divisão estanque de tarefas entre o juiz e as partes, em que estas se preocupavam, exclusivamente, em provar os fatos afirmados, ao passo que aquele se restringia a fazer a subsunção do material fático ao texto normativo considerado por ele como sendo o juridicamente adequado ao caso. Tal realidade não se justifica num terreno em que se afirma o contraditório dinâmico e a cooperação.

Portanto, é nesse passo que o art. 10 preconiza que, “em qualquer grau de jurisdição, o órgão jurisdicional não pode decidir com base em fundamento a respeito do qual não se tenha oportunizado manifestação das partes, ainda que se trate de matéria apreciável de ofício”. O modelo apresentado pela redação do texto legal incentiva a ativação do contraditório prévio, a impedir (ou pelo menos inibir) que o juiz decida, com base em algum fundamento de fato ou de direito, que não tenha havido participação das partes.

A vedação às decisões-surpresa há de englobar tanto as questões de fato quanto as de direito. No primeiro plano, exige-se que todo substrato fático processual (comportamento da parte) levado em consideração pelo juiz, deve ser previamente posto em contraditório dinâmico, antes do processo de subsunção, sob pena de tornar defeituosa (com possível decretação de invalidade) da decisão proferida.

Já no plano do direito, ganha relevância a análise da máxima do iura novit curia, que autoriza ao juiz levar em consideração questões de direito que lhe pareçam apropriadas, apesar de não suscitadas, e julgar a causa, sem estar confinado à alegação de direito apresentada pelas partes, desde que respeite aos limites fáticos delineados.

A vedação às decisões surpresa não elimina ou atenua essa liberdade do juiz de identificar a disposição jurídica aplicável ao caso concreto, como se depreende do enunciado 281 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “o enquadramento normativo dos fatos não é requisito da petição inicial e, uma vez existente, não vincula o órgão julgador”.

No entanto, a atividade do juiz recebe uma nova conformação prática, por meio do redimensionamento do iura novit curia, a fazer com que o juiz consulte previamente as partes e colha suas manifestações a respeito do assunto, antes de aplicar a norma jurídica ao caso concreto.

Sobre o tema, a questão do CESPE, de advogado do Banco da Amazônia de 2007, considerou como CORRETA a assertiva a seguir: “como o julgador não se encontra adstrito a decidir de acordo com os fundamentos legais apontados nos autos, não há decisão extra petita quando o juiz examina o pedido e aplica o direito de acordo com normas jurídicas diferentes das apontadas nos autos. Essa liberdade conferida ao julgador também deve compatibilizar-se com o princípio do contraditório”.

Sigamos:

O art. 10 veda que o juiz, sem ativação do contraditório, agregue à sua decisão questão de direito, que não foi ventilada por nenhuma das partes. Tal dispositivo é mais um corolário do julgamento justo e impõe ao juiz o dever de chamar a atenção das partes para qualquer fator que avalie de forma díspar, a proteger as partes contra decisões desconcertantes. Nesse sentido, orienta o enunciado 282 do FPPC: “para julgar com base em enquadramento normativo diverso daquele invocado pelas partes, ao juiz cabe observar o dever de consulta, previsto no art. 10”.

Atente-se para o fato de o sistema brasileiro estender a proibição de surpresa, inclusive, às decisões de ofício do juiz[3]. Portanto, sempre que o magistrado for decidir de ofício (acerca de questões de fato ou de direito), antes, ele deve garantir a manifestação das partes a influenciar a decisão jurisdicional.

Veja-se o exemplo em que o juiz, de ofício, decreta prescrição da pretensão, cuja exigibilidade estava a ser tempestivamente exercida, a considerar fator interrupção. A intimação das partes, aí, para se pronunciarem a respeito de uma terceira via elegida pelo juiz, poderia evitar todo um iter processual desnecessário, sem contar que traria o diálogo e a comparticipação como elementos atenuadores da irresignação das partes e da propensão a interpor recursos.

Enfeixa-se uma última dimensão ao contraditório. Ela liga-se à necessidade de fundamentação da decisão jurisdicional, a qual permite aos jurisdicionados o controle da atuação do juiz e que atesta que os argumentos por ele colacionados tenham sido realmente analisados e levados a sério pelo juiz.

Prossiga-se.

A violação ao contraditório tem, em regra, como sanção, a nulidade. Contudo, é preciso atentar para as limitações à decretação da invalidade dos atos processuais, como o princípio da boa fé objetiva (nulidades de algibeira) e pas de nullité sans grief, positivado no § 1º do art. 282do CPC, que determina que o ato não será repetido, nem sua falta será suprida, quando não prejudicar a parte, tema que trataremos mais detidamente nos próximos posts.

Para finalizar segue mais uma bateria de questões:

(FUNDATEC. Procurador do Estado. PGE/RS. 2015): A respeito do princípio do contraditório no processo civil, é INCORRETO afirmar que[4]:

a) O contraditório consiste em uma garantia de efetiva participação das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de influírem, em igualdade de condições, no convencimento do magistrado, contribuindo na descrição dos fatos, na produção de provas e no debate das questões de direito.

b) O contraditório não é necessário apenas para a prolação da sentença de mérito, devendo ser observado ao longo de todo o procedimento, relativamente a todas as questões, sejam de rito ou de mérito.

c) O contraditório guarda estreita relação com o princípio da isonomia, exatamente porque as partes devem dispor da possibilidade de expor suas versões, apresentar suas defesas e participar, enfim, do processo em idênticas oportunidades.

d) O juiz também é sujeito do contraditório, devendo submeter a debate entre as partes as questões jurídicas, aí incluídas as matérias que ele há de apreciar de ofício.

e) Em razão das máximas iura novit curia e da mihi factum dabo tibi ius, constitui tarefa privativa do juiz a aplicação do direito, independentemente da sua arguição pelas partes, cabendo a estas últimas apenas a alegação dos fatos. Quer isso dizer que o contraditório somente alcança as questões de fato, não sendo necessário para as questões de direito.

(PUC/PR. Procurador Municipal da Prefeitura de Maringá/PR. 2015): Segundo o artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.” Sobre o princípio constitucional do contraditório, é CORRETO[5] afirmar:

a) O princípio do contraditório, derivado do princípio do devido processo legal, tem incidência restrita aos processos de natureza jurisdicional e administrativa.

b) O contraditório no processo jurisdicional é plenamente satisfeito com a garantia de ser ouvido em todos os momentos do procedimento

c) Se uma das partes requerer a juntada de documento aos autos, o juiz poderá dispensar a oitiva da outra parte, desde que repute que tal documento não influenciará a futura sentença.

d) O julgamento de embargos declaratórios pode se dar sem contraditório, mesmo nos casos em que há eficácia infringente do recurso.

e) O exercício pleno do contraditório não se limita à garantia de alegação oportuna e eficaz a respeito de fatos, mas implica a possibilidade de ser ouvido também em matéria jurídica.

(CESPE. Analista-Advocacia. SEPRO. 2011)[6]: “conforme observa a melhor doutrina, para a concretização do princípio do contraditório, o juiz deve estabelecer constante e intenso diálogo com as partes no processo, a fim de assegurar decisões de melhor qualidade”

(CESPE. Auditor Federal de Controle Externo – Auditoria de Obras Públicas – TCU. 2011)[7]: “o princípio do contraditório consiste em um verdadeiro diálogo entre as partes do processo, ou seja, deve-se conceder a oportunidade de participar do procedimento a todo aquele cuja esfera jurídica possa ser atingida pelo resultado do processo”.

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Eduardo Madruga. Professor Universitário. Mestre em direito Processual pela Universidade de Coimbra. Advogado.

FONTE: PROCESSO CIVIL. Volume único (2016). 8° edição reescrita de acordo com o NOVO CPC. Autores: Rinaldo Mouzalas de Souza e Silva, Joao Otávio Terceiro Neto e Eduardo Madruga. Editora JusPodivm.  Link: https://www.editorajuspodivm.com.br/processo-civil-volume-unico-2016-8a-edicao-reescrita-de-acordo-com-o-novo-cpc

[1]. O contraditório padrão segue um procedimento base como regra geral: 1) petição inicial (pedido); 2) contraditório-comunicação (citação da parte contrária); 3) contraditório – possibilidade de influência (defesas do réu); 4) decisão judicial motivada. É essa arquitetura que é aplicada, indubitavelmente, na maioria dos casos.

[2]. O contraditório diferido segue o seguinte procedimento: 1) petição inicial; 2) decisão judicial provisória; 3) ativação do contraditório diferido (informação + poder de reação); 4) decisão judicial definitiva motivada.

[3]. É preciso diferenciar a decisão de ofício da decisão liminar. A primeira é quando o juiz atua sem a necessidade de inciativa das partes, como ocorre na inciativa probatória (art. 370 do CPC), já a decisão liminar é aquela em que o juiz profere decisão antes de ouvir as partes no regime do contraditório postecipado, como pode acontecer nas tutelas de urgência desde que preenchidos os requisitos.

[4]. Gabarito: Letra E.

[5]. Gabarito: Letra E.

[6]. Gabarito: Correto.

[7]. Gabarito: Correto.