E aí pessoal, tudo certo?

Seguindo a tradição, selecionei os 07 julgados de direito processual penal, extraídos dos informativos do Superior Tribunal de Justiça, ao longo do segundo semestre de 2017.

Abaixo, em um sistema de perguntas e respostas, tento reproduzir as principais ideias consolidadas nos excertos da referida Corte.

Não tenho a menor dúvida de que, dos comentários tecidos abaixo, será possível resolver e extrair uma série de questões as quais estarão, indubitavelmente, nas provas de concurso público, ao longo desse ano de 2018!

Dessa maneira, espero contribuir para que muitos de vocês garantam a pontuação nas provas de processo penal, certo?

Espero que gostem! Vamos em frente.

(1) Quando haverá justa causa apta a legitimar a invasão domiciliar pelos agentes de segurança pública? A intuição da autoridade policial é legítima para tal finalidade?

6ª Turma – Não configura justa causa apta a autorizar invasão domiciliar a mera intuição da autoridade policial de eventual traficância praticada por indivíduo, fundada unicamente em sua fuga de local supostamente conhecido como ponto de venda de drogas ante iminente abordagem policial. De acordo com o texto constitucional, a inviolabilidade domiciliar somente poderá ser violada em hipóteses excepcionais, como é o caso (a) se o morador consentir; (b) em flagrante delito; (c) em caso de desastre; (d) para prestar socorro; (e) durante o dia, por determinação judicial. Aliás, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO, com repercussão geral previamente reconhecida, assentou que “a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados” (Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010). Em relação ao flagrante de crime permanente, devemos atentar para um certo temperamento interpretativo a partir do entendimento do STF. Na hipótese em que o acusado encontra-se em local supostamente conhecido como ponto de venda de drogas, e, ao avistar o patrulhamento policial, empreende fuga até sua residência (por motivos desconhecidos) e, em razão disso, é perseguido por policiais, sem, contudo, haver um contexto fático do qual se possa concluir (ou, ao menos, ter-se fundada suspeita), que no interior da residência também ocorre uma conduta criminosa, a questão da legitimidade da atuação policial, ao invadir o domicílio, torna-se extremamente controversa. Uma mera intuição acerca de eventual traficância praticada pelo recorrido, o que, embora pudesse autorizar abordagem policial, em via pública, para averiguação, não configurou, por si só, “fundadas razões” a autorizar o ingresso em seu domicílio, sem o seu consentimento e sem determinação judicial. REsp 1.574.681-RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, por unanimidade, julgado em 20/4/2017, DJe 30/5/2017.

(2) Legislações especiais que tragam previsão de interrogatório como primeiro ato da instrução devem prevalecer em face do artigo 400 do CPP, que o aponta como derradeiro ato instrutório?

 6ª Turma – Os procedimentos regidos por leis especiais devem observar, a partir da publicação da ata de julgamento do HC 127.900/AM do STF (11.03.2016), a regra disposta no art. 400 do CPP, cujo conteúdo determina ser o interrogatório o último ato da instrução criminal. Há muito, o STJ e a 2ª Turma do STF posicionavam-se pela prevalência do postulado da especialidade em detrimento do disposto no CPP, mantendo a previsão do interrogatório como 1º ato da instrução processual. Contudo, houve revisão expressa dessa tese a partir do julgamento do HC n. 127.900/AM, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 3/8/2016, a Suprema Corte, por seu Plenário, realizou uma releitura do artigo 400 do CPP, à luz do sistema constitucional acusatório e dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Reconheceu-se, em razão de mostrar-se mais compatível com os postulados que informam o estatuto constitucional do direito de defesa, uma evolução normativa sobre a matéria, de forma que, por ser mais favorável ao réu e por se revelar mais consentânea com as novas exigências do processo penal democrático, a norma contida no art. 400 do CPP, na redação dada pela Lei n. 11.719/08, deveria irradiar efeitos sobre todo o sistema processual penal, ramificando-se e afastando disposições em sentido contrário, mesmo em procedimentos regidos por leis especiais. Importante ressaltar que, em atenção ao princípio da segurança jurídica, foi realizada a modulação dos efeitos da decisão da Corte Suprema, pelo que a nova interpretação dada somente teria aplicabilidade a partir da publicação da ata daquele julgamento, ocorrida em 11.03.2016 (DJe n. 46, divulgado em 10/3/2016). A partir desse marco, portanto, incorreriam em nulidade os processos em que o interrogatório fosse o primeiro ato da instrução. HC 397.382-SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, por unanimidade, julgado em 3/8/2017, DJe 14/8/2017.

(3) É possível decretar prisão preventiva pelo simples fato de o agente ter descumprido ou frustrado acordo previamente realizado?

 6ª Turma – O descumprimento de acordo de delação premiada ou a frustração na sua realização, isoladamente, não autoriza a imposição da segregação cautelar. Adotando posição já agasalhada pelo STF, o STJ afirmou que a prisão preventiva deve sempre guardar respeito à hipóteses legais previstas no CPP e, portanto, deve ser necessária para garantir a ordem pública, a ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal. Nesse contexto, o simples fato de ter sido frustrado acordo de colaboração premiada, ou mesmo o seu descumprimento, por si só, não justifica a imposição do cárcere (Nesse sentido: HC 138.207, 2ª Turma, Rel. Min. Edson Fachin). A prisão provisória não pode ser utilizada como “moeda de troca” ou punição antecipada àquele que, réu em processo penal, celebra ou está em vias de celebrar o mencionado acordo, até porque a revogação da prisão preventiva não é prevista como benefício da colaboração premiada nos termos da Lei 12.850/13 e tampouco seu restabelecimento deve ser causado pelo descumprimento do acordo. HC 396.658-SP, Rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, por unanimidade, julgado em 27/6/2017, DJe 1/8/2017.

(4) O prazo de 3 (três) dias úteis do artigo 479 do CPP é para a juntada de documento ou para a ciência da parte contrária, no procedimento do Júri?

 6ª Turma – O prazo de 3 dias úteis a que se refere o art. 479 do Código de Processo Penal deve ser respeitado não apenas para a juntada de documento ou objeto, mas também para a ciência da parte contrária a respeito de sua utilização no Tribunal do Júri. Segundo a Turma, de nada adiantaria que a parte juntasse documento no prazo legal previsto e o lado contrário tomasse conhecimento às vésperas ou no próprio dia do julgamento, sem que tenha tempo para colher elementos a fim de refutá-lo. Nesse contexto, a doutrina ratifica que “não se trata de mera juntada do documento aos autos, mas sim a efetiva ciência da parte contrária, no mínimo três dias úteis antes do julgamento”. Sendo assim, considerando que a intensão do legislador é garantir o julgamento justo, permitindo às partes (defesa e acusação) conhecer de documento relevante para o julgamento e, em tempo hábil, se manifestar sobre ele, é de suma importância que a ciência da parte contrária e a juntada do documento ou exibição de objeto se dê no tríduo legal. REsp 1.637.288-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Rel. para acórdão Min. Sebastião Reis Júnior, por unanimidade, julgado em 8/8/2017, DJe 1/9/2017

(5) O início do prazo processual para a Defensoria Pública (e MP) é contado da intimação em audiência ou da efetiva entrada dos autos na instituição? E se a decisão tiver sido proferida na presença do Defensor?

 3ª Seção: A data da entrega dos autos na repartição administrativa da Defensoria Pública é o termo inicial da contagem do prazo para impugnação de decisão judicial pela instituição, independentemente de intimação do ato em audiência. O CPC/2015 (art. 269) conceitua intimação como “ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo“. Por sua vez, o prazo processual tem relação com o espaço de tempo de que as partes ou os terceiros interessados dispõem para a prática válida de atos processuais que darão andamento ao processo. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, notadamente pela defesa, em todos os graus de jurisdição, dos necessitados (art. 134 da CF) e, para bem desincumbir-se de suas atribuições constitucionais, assegurou-se à Defensoria Pública um extenso rol de prerrogativas, direitos, garantias e deveres, de estatura constitucional (art. 134, §§ 1º, 2º e 4º, da CF) e legal (arts. 370, § 4º, do CPP, 5º, § 5º, da Lei n. 1.060/1950, 4º, V e 44, I, da Lei Complementar n. 80/1994), permeados diretamente por princípios que singularizam tal instituição, dois dos quais – a unidade e a indivisibilidade – interferem na compreensão do tema objeto de análise. Observa-se também a existência de legislação específica que assegura à Defensoria Pública a remessa dos autos com vista (art. 4º, V, da LC n. 80/1994). Assim, certamente nas hipóteses em que há ato judicial decisório proferido em audiência, haverá, em tal momento, a intimação pessoal das partes presentes (defesa e acusação). Então, a melhor exegese parece ser a que considera poder a intimação pessoal realizar-se em audiência, mas dependente, para engendrar a contagem do prazo recursal, da remessa dos autos à Defensoria Pública. HC 296.759-RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, por maioria, julgado em 23/8/2017, DJe 21/9/2017.

(6) Colaboração Premiada e Teoria do Juízo Aparente: atenção ao deliberado pela Corte Especial do STJ!

Corte Especial – A homologação de acordo de colaboração premiada por juiz de primeiro grau de jurisdição, que mencione autoridade com prerrogativa de foro no STJ, não traduz em usurpação de competência desta Corte Superior. Consoante já repisado pelo STF, ao homologar o acordo de colaboração premiada, realizando o juízo de delibação do art. 4º, § 7º, da Lei n. 12.850/2013, o juiz “se limita a aferir a regularidade, a voluntariedade e a legalidade do acordo “, não existindo “emissão de qualquer juízo de valor sobre as declarações do colaborador” (STF, HC 127.483, Tribunal Pleno, DJe de 4/2/2016). Sabe-se que a colaboração premiada é um instrumento de cooperação processual, cuja natureza jurídica é de meio de obtenção de elementos de convicção, razão pela qual as informações prestadas pelo colaborador podem se referir até mesmo a crimes diversos daqueles que dão causa ao acordo, configurando-se, nessa situação, a hipótese da serendipidade ou descoberta fortuita de provas. Uma das consequências admitidas e extraídas do encontro fortuito de provas incide na ideia da Teoria do Juízo Aparente, segundo a qual é legítima a obtenção de elementos relacionados a pessoa que detenha foro por prerrogativa de função por juiz que até aquele momento era competente para o processamento dos fatos. Aliás, a tese foi ratificada pela Suprema Corte, segundo a qual: “as provas colhidas ou autorizadas por juízo aparentemente competente à época da autorização ou produção podem ser ratificadas a posteriori, mesmo que venha aquele a ser considerado incompetente, ante a aplicação no processo investigativo da teoria do juízo aparente” (HC 106.152, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 24/5/2016 e HC 128.102, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 23/6/2016). No caso concreto, as investigações não se debruçavam sobre pessoas com prerrogativa de foro, sendo a informação de possível envolvimento de autoridade surgida apenas com o acordo de colaboração, razão pela qual se entendeu que o juízo de primeiro grau seria competente para a homologação. Rcl 31.629-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 20/09/2017, DJe 28/09/2017.

(7) É possível requerer incidente de falsidade em relação à prova antiga, após a prolação de sentença condenatória por parte do sentenciado?

 5ª Turma – Não há nulidade na decisão que indefere pedido de incidente de falsidade referente à prova juntada aos autos há mais de 10 anos e contra a qual a defesa se insurge somente após a prolação da sentença penal condenatória, uma vez que a pretensão está preclusa. No caso em tela, a parte se insurgia quanto à negativa de incidente de falsidade e pedido de perícia em face de arquivos extraídos de interceptação telefônica. De acordo com a Turma, apesar de os artigos 145 e seguintes do CPP não delinearem prazo para a instauração do referido incidente, considerando o longo prazo e o fim da instrução probatória, é válida a negativa judicial sem que incorra em cerceamento de defesa, restando ao magistrado do caso concreto analisar o deferimento ou não do incidente. Ademais, reconheceu-se a ausência de prova do prejuízo, o que reflete o postulado do pas de nilluté sans grief, do artigo 563 do CPP. RHC 79.834-RJ, Rel. Min. Felix Fischer, por unanimidade, julgado em 07/11/2017, DJe 10/11/2017.