PGE ACRE. APELAÇÃO EM DIREITO TRIBUTÁRIO: ESTORNO PROPORCIONAL DOS CRÉDITOS DE ICMS NO CASO DE ISENÇÃO PARCIAL E O PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE.

 

 

Colegas do Blog do Ebeji,

 

Trago comentário sobre a proposta de apelação do concurso da PGE Acre.

 

O enunciado expôs o seguinte contexto processual:

 

– Concessão por Estado-membro de benefício fiscal de redução em 20% da base de cálculo do ICMS na saída da mercadoria do estabelecimento, contendo ainda a necessidade de as empresas estornarem, proporcionalmente à redução da base de cálculo, o crédito de ICMS relativo à entrada da mercadoria – cuja saída posterior estivesse sobre o abrigo do referido favor fiscal.

 

– A redução acima, acompanhada do estorno proporcional, tem autorização do CONFAZ.

 

– A sistemática é simples (alertando ao leitor do Blog que estou desconsiderando a sistemática de cálculo do ICMS “por dentro”, porque fica mais fácil de entender; além disso, a sistemática de inclusão do tributo na sua própria base de cálculo é irrelevante para compreender o estorno proporcional em termos percentuais): o ICMS é um tributo que incide sobre o valor agregado em cada operação da cadeia. Se a mercadoria é vendida por R$ 100,00 ao consumidor, o tributo incidirá sobre R$ 80,00 reais (pois há benefício fiscal de redução em 20% da base de cálculo). Considerando que a alíquota seja hipoteticamente 10%, o tributo recolhido será R$ 8,00 (na prática, o valor do tributo compõe a base de cálculo, de forma que seriam devidos R$ 8,80).

 

– Entretanto, pode o contribuinte abater desses R$ 8,00 os valores recolhidos de ICMS na cadeia anterior. Então, suponhamos que esse produto comercializado por R$ 100,00 tenha sido adquirido por R$ 60,00. O valor agregado na cadeia (lucro do comerciante) é de R$ 40,00. Neste caso, a ideia é que o tributo incida apenas sobre este valor. Considere que ao vender a mercadoria por R$ 60,00, o contribuinte de direito da cadeia anterior tenha recolhido 10% de ICMS, ou seja, R$ 6,00.

 

– Esses R$ 6,00 reais podem ser aproveitados pelo contribuinte da cadeia seguinte, na chamada “conta corrente fiscal”.

 

– Contudo, em virtude da necessidade de “ESTORNO PROPORCIONAL”, não existirá R$ 6,00 de crédito. Ora, se a redução da base de cálculo foi em 20%, o aproveitamento do crédito anterior deve observar essa mesma proporção.

 

– Assim, ao invés de recolher a diferença de R$ 8,00 menos R$ 6,00, o contribuinte deverá estornar proporcionalmente o crédito.

 

– A fórmula será a seguinte: R$ 8,00 menos R$ 4,80 (estorno proporcional de 20% no crédito). O CONTRIBUINTE DE DIREITO RECOLHE, PORTANTO: R$ 3,20.

 

– Percebam algo interessante: acaso não existisse a redução da base de cálculo em 20% (benefício fiscal), o contribuinte deveria realizar a seguinte conta: na cadeia anterior foi recolhido R$ 6,00, na seguinte serão recolhidos R$ 10,00 menos R$ 6,00, totalizando um tributo de R$ 4,00 (que é exatamente a incidência da alíquota sobre o valor agregado – base de cálculo de R$ 40,00).

 

– Vejam que a diferença entre recolher R$ 3,20 e R$ 4,00 é justamente de 20% (percentual de redução da base de cálculo – benefício fiscal).

 

– Acaso o contribuinte não realizasse o estorno proporcional, recolheria apenas R$ 2,00 de tributo – o que foge da intenção de redução apenas de 20% da alíquota.

 

 

Assim, o enunciado da questão mencionava que a sentença teria julgado procedente o pleito do contribuinte para: 1 – não aplicar o estorno proporcional, em virtude do princípio da não-cumulatividade; 2 – aproveitar todos os créditos dos últimos 10 anos, mediante o lançamento imediato na sua conta fiscal dos valores.

 

A apelação deveria frisar os pontos:

 

A – o estorno proporcional não fere a não cumulatividade do tributo que incide em cadeia. Pelo contrário, se não houver o estorno o contribuinte será indevidamente beneficiado, recolhendo tributo a menor e ultrapassando a intenção da redução da base de cálculo (no exemplo acima fica clara a diferença entre recolher R$ 2,00 ou R$ 3,20).

 

B – O afastamento do estorno proporcional fere os temos exatos do convênio aprovado pelo CONFAZ (mencionado na questão e cuja redução de 20% estava atrelada ao estorno dos créditos) e, portanto, é inconstitucional fugir – em termos de benefícios fiscais em ICMS – do que definido nessa assentada.

 

C – STJ e STF entendem, de forma pacífica, que o estorno proporcional não fere a não cumulatividade:

 

STF. RE 478605

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ICMS. ESTORNO PROPORCIONAL. BASE DE CÁLCULO REDUZIDA. 1. O Supremo fixou entendimento no sentido de que não ofende o princípio da não-cumulatividade a exigência de estorno proporcional de crédito de ICMS relativo à entrada de mercadorias que, posteriormente, tem sua saída tributada com base de cálculo ou alíquota inferior [RE n. 174.478, Redator para o acórdão o Ministro Cezar Peluso, DJ de 30.9.05]. Agravo regimental a que se nega provimento.

 

RMS 39554. STJ:

TRIBUTÁRIO. ICMS. REDUÇÃO DE BASE DE CÁLCULO. ISENÇÃO PARCIAL. ESTORNO PROPORCIONAL DO CRÉDITO. JURISPRUDÊNCIA DO STF. MULTA. LEI SUPERVENIENTE. RETROATIVIDADE BENIGNA. 1. O benefício fiscal de redução da base de cálculo equivale à isenção parcial, sendo devido o estorno proporcional do crédito de ICMS, nos termos do art. 155 , § 2º , II , b , da CF , não havendo falar em ofensa ao princípio da não-cumulatividade. Precedentes do STF. 2. Os convênios do ICMS têm a função de uniformizar, em âmbito nacional, a concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais pelos Estados (art. 155 , § 2º , XII , g , da CF/1988 ). Em última análise, trata-se de instrumento que busca conferir tratamento federal uniforme em matéria de ICMS, como forma de evitar a denominada guerra fiscal.

 

D – A apelação deveria, ainda, dizer que é indevido o aproveitamento dos créditos pelo contribuinte.

 

C – A título subsidiário, caso o Tribunal entendesse devido o aproveitamento, que o restringisse aos últimos cinco anos – em virtude da prescrição que alcança os valores, nos termo do CTN e do entendimento do STJ – que (considerando a data de impetração MS) afasta a aplicação da tese dos cinco mais cinco.

 

 

 

Essas eram as considerações brevíssimas sobre essa sistemática do “estorno proporcional de ICMS”, úteis a todos os frequentadores do Blog que prestam concurso para as procuradorias, especialmente as estaduais.

 

Ressalto mais uma vez que para a exemplificação numérica do estorno proporcional desconsiderei a sistemática (um tanto complexa, declarada constitucional pelo STF) do cálculo “por dentro” do ICMS (o valor do tributo compõe a sua própria base de cálculo).

 

Abraços e bons estudos! Fiquem com Deus!

 

 

Renato Cesar Guedes Grilo