Olá pessoal, tudo certo com vocês?

Final do ano chegando e não podemos esmorecer! Dessa maneira, trataremos na coluna de hoje de um tema especial, pois certamente será enfrentado nas próximas provas! Aliás, facilmente é possível vislumbrar uma série de questões nas provas de processo penal, tanto no tema “provas em espécie”, como também (especialmente) nas assertivas relacionadas ao procedimento do Tribunal do Júri (eita assunto complicado em prova, hein?).

Antes de analisar um recente entendimento acerca da possibilidade (ou não) de pronúncia calcada exclusivamente em “testemunha de ouvir dizer”, temos que saber o que danado essa expressão significa, não é mesmo?

Testemunha de ouvir dizer ou “hearsay testimony se verifica quando determinada pessoa vem, no curso da instrução processual, prestar depoimento acerca de fatos direta ou indiretamente relacionados à prática delitiva, sem, contudo, ter visto ou presenciado qualquer situação relacionada ao caso concreto, sem contato direto com os fatos, mas a fim de retratar e/ou “explicar” o que tomou conhecimento “através de terceiros”.

Pedro, isso pode no sistema processual penal brasileiro?

PODE! Particularmente, não tenho a menor simpatia por esse instrumento, mas por dever de ofício tenho obrigação de consignar que prevalece o entendimento quanto à admissibilidade. No entanto, em uma prova de Defensoria Pública (ATENÇÃO), se você quiser questionar a legitimidade dessa prova, o melhor argumento para tanto é a violação concreta ao contraditório via “exame cruzado das provas testemunhais (art. 212 CPP)”, já que restará inviabilizado o pleno confrontamento dos fatos, já que aquela testemunha “nada sabe, apenas ouviu dizer”, certo?

Anote-se, ademais, que normativamente a testemunha deveria prestar depoimento acerca do que sabe per proprium sensum et non per sensum alterius, fato esse que impede, em alguns sistemas – como o norte-americano – o depoimento da testemunha indireta, por ouvir dizer (hearsay rule). Já vimos, acima, que não é o caso do Brasil, em que se admite (ao menos excepcionalmente) tal modalidade de prova. Ainda assim, vale registrar a pertinente crítica de Hélio Tornaghi, que assevera que esse tipo de depoimento “não se pode tolerar que alguém vá a juízo repetir a vox publica .Testemunha que depusesse para dizer o que lhe constou, o que ouviu, semapontar seus informantes, não deveria ser levada em conta” (TORNAGHI,Hélio. Instituições de processo penal. v. IV. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p.461).Vamos avançando!

No Recurso Especial 1.373.356/BA, o STJ se deparou com interessantíssima situação envolvendo a “testemunha de ouvir dizer”. Tratava-se de caso em que, em procedimento do Júri, houve decisão de pronúncia exclusivamente calcada em uma “testemunha de ouvir dizer”, cuja oitiva se dera exclusivamente na fase inquisitorial das investigações preliminares! E o que decidiu o STJ?

Nesse caso concreto, fora cunhada a conclusão de que não se pode admitir a pronúncia do réu, dada a sua carga decisória, sem qualquer lastro probatório colhido em juízo, fundamentada exclusivamente em prova colhida na fase inquisitorial, mormente quando essa prova se encontra isolada nos autos.

Pedro, quer dizer que aquela regra do CPP (art. 155) que indica não ser possível condenação com base EXCLUSIVAMENTE em elementos de informação (extraídos da investigação preliminar) também é aplicado para a pronúncia?

NÃO! Cuidado! Em alguns julgados recentes, aliás, a 5ª e 6ª Turmas do STJ firmaram orientação em sentido oposto, ou seja, que, muito embora não seja possível sustentar uma condenação com base em prova produzida exclusivamente na fase inquisitorial, não ratificada em juízo, TAL ENTENDIMENTO NÃO SE APLICA À DECISÃO DE PRONÚNCIA (v.g. HC n. 314.454-SC, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, 5ª T; DJe 17/2/2017; AgRg no REsp 1.582.122-RS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, 6ª T, DJe 13/6/2016).

Oxe, peraí! Então houve mudança de entendimento? Não… digamos que houve um entendimento adaptado à especificidade do caso concreto! Calma que eu vou explicar melhor!

Segundo bem anotou o Relator (Ministro Ricardo Schietti), apesar dos entendimentos sufragados acima pelas Turmas Criminais do STJ, no caso ora analisado pode-se inferir que, além de a pronúncia não ter supedâneo em qualquer “prova judicializada” (apenas em testemunha de ouvir dizer ouvida na investigação), há o agravante de que os únicos testemunhos judiciais produzidos não apontam os recorrentes como autores do delito. Na verdade, o Tribunal estadual destaca que mesmo os depoimentos produzidos na fase inquisitorial são “relatos baseados em testemunho por ouvir dizer, […] que não amparam a autoria para efeito de pronunciar os denunciados”.

Vamos ajustar, ok?

As últimas manifestações do STF e STJ não refutam por completo a possibilidade de a pronúncia se dar com base exclusivamente em elementos de informação da investigação inquisitiva, mas tal fato deve ser evitado.

No caso concreto mais recente, porém, essa orientação NÃO SE APLICA à hipótese em que testemunhos produzidos na fase judicial não apontem os acusados como autores do delito e os depoimentos colhidos na fase inquisitorial sejam “relatos baseados em testemunho por ouvir dizer”.

Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido!

Vamos em frente!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal

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