Hitala Mayara é Advogada da União

e Coach EBEJI PGE

EBEJI

Algumas decisões, mesmo não tão recentes, são de extrema importância para o candidato ao concurso da AGU ou da PFN, principalmente quando adotadas sob a sistemática da repercussão geral/recurso repetitivo e quando versam sobre as atribuições da AGU.

Um exemplo típico dessas decisões refere-se ao tema atinente à legitimidade para a execução das condenações patrimoniais aplicadas pelo Tribunal de Contas da União.

Segundo previsão do art. 71, §3º, da Constituição, as decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo.

Pelo princípio da simetria, definiu o STF que a norma seria aplicável também em relação às decisões proferidas pelas Cortes de Contas Estaduais.

Ocorre que, apesar de prever a eficácia de título executivo para tais decisões, a Constituição silenciou a respeito do órgão legitimado a promover tais execuções, tendo o STF, desde o princípio, fixado posição no sentido de que não seria o próprio TCU legitimado a tanto:

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SERGIPE. COMPETÊNCIA PARA EXECUTAR SUAS PRÓPRIAS DECISÕES: IMPOSSIBILIDADE. NORMA PERMISSIVA CONTIDA NA CARTA ESTADUAL. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. As decisões das Cortes de Contas que impõem condenação patrimonial aos responsáveis por irregularidades no uso de bens públicos têm eficácia de título executivo (CF, artigo 71, § 3º). Não podem, contudo, ser executadas por iniciativa do próprio Tribunal de Contas, seja diretamente ou por meio do Ministério Público que atua perante ele. Ausência de titularidade, legitimidade e interesse imediato e concreto. 2. A ação de cobrança somente pode ser proposta pelo ente público beneficiário da condenação imposta pelo Tribunal de Contas, por intermédio de seus procuradores que atuam junto ao órgão jurisdicional competente. 3. Norma inserida na Constituição do Estado de Sergipe, que permite ao Tribunal de Contas local executar suas próprias decisões (CE, artigo 68, XI). Competência não contemplada no modelo federal. Declaração de inconstitucionalidade, incidenter tantum, por violação ao princípio da simetria (CF, artigo 75). Recurso extraordinário não conhecido. (RE 223037, Relator(a):  Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 02/05/2002, DJ 02-08-2002 PP-00061 EMENT VOL-02076-06 PP-01061)

Na mesma oportunidade, o STF, além de ter fixado a ilegitimidade do próprio Tribunal de Contas para promover a execução de suas condenações, seja diretamente ou por meio do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, fixou também o entendimento de que a legitimidade seria exclusiva do ente público beneficiário da condenação imposta, que deveria executa-la através de seus procuradores.

Trazendo a questão para o âmbito federal, portanto, ter-se-ia que as condenações impostas pelo TCU deveriam, assim, ser executadas pela União Federal, através da Advocacia Geral da União.

A questão parecia simples e já uniformizada.

Ocorre que, como o tema não havia sido decidido de forma objetivada, a questão passou a ser arguida também perante o Superior Tribunal de Justiça, que passou a discutir a respeito da legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento de tais execuções.

Assim é que, em 2009, a Primeira Seção do STJ fixou posição no sentido de que o Ministério Público possuiria legitimidade para promover a execução de título executivo extrajudicial oriundo de Tribunal de Contas:

PROCESSUAL CIVIL – MINISTÉRIO PÚBLICO –  LEGITIMIDADE PARA PROMOVER EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL ORIUNDO DO TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL – CONCEITO DE PATRIMÔNIO PÚBLICO QUE NÃO COMPORTA SUBDIVISÃO APTA A ATRIBUIR EXCLUSIVAMENTE À FAZENDA PÚBLICA A LEGITIMIDADE PARA PROMOVER A EXECUÇÃO.

  1. No caso concreto, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo entendeu ser indevido o aumento salarial concedido ao vereador – ora recorrido.
  2. O Tribunal de origem, após subdividir o conceito de patrimônio público em patrimônio público-privado e patrimônio do povo, entendeu que o direito tratado no caso é meramente patrimonial público, cujo exclusivo titular é a Fazenda Municipal. Segundo a decisão recorrida, em tais condições, não tem o Ministério Público legitimidade processual para promover ação civil pública de caráter executório já que a legitimidade exclusiva seria da Fazenda Pública Municipal.
  3. A subdivisão adotada pela Corte de origem é descabida. Não existe essa ordem de classificação. O Estado não se autogera, não se autocria, ele é formado pela união das forças e recursos da sociedade. Desse modo, o capital utilizado pelo ente público com despesas correntes, entre elas a remuneração de seus agentes políticos, não pode ser considerado patrimônio da pessoa política de direito público, como se ela o houvesse produzido.
  4. Estes recursos constituem-se, na verdade, patrimônio público, do cidadão que, com sua força de trabalho, produz a riqueza sobre a qual incide a tributação necessária ao estado para o atendimento dos interesses públicos primários e secundários.
  5. A Constituição Federal, ao proibir ao Ministério Público o exercício da advocacia pública, o fez com a finalidade de que o parquet melhor pudesse desempenhar as suas funções institucionais – dentre as quais, a própria Carta Federal no art. 129, III, elenca a defesa do patrimônio público – sem se preocupar com o interesse público secundário, que ficaria a cargo das procuradorias judiciais do ente público.
  6. Por esse motivo, na defesa do patrimônio público meramente econômico, o Ministério Público não poderá ser o legitimado ordinário, nem representante ou advogado da Fazenda Pública. Todavia, quando o sistema de legitimação ordinária falhar, surge a possibilidade do parquet, na defesa eminentemente do patrimônio público, e não da Fazenda Pública, atuar como legitimado extraordinário.
  7. Conferir à Fazenda Pública, por meio de suas procuradorias judiciais, a exclusividade na defesa do patrimônio público, é interpretação restritiva que vai de encontro à ampliação do campo de atuação conferido pela Constituição ao Ministério Público, bem como leva a uma proteção deficiente do bem jurídico tutelado. 8. Por isso é que o Ministério Público possui legitimidade extraordinária para promover ação de execução do título formado pela decisão do Tribunal de Contas do Estado, com vistas a ressarcir ao erário o dano causado pelo recebimento de valor a maior pelo recorrido. (Precedentes: REsp 922.702/MG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 28.4.2009, DJe 27.5.2009; REsp 996.031/MG, Rel. Min.

Francisco Falcão, julgado em 11.3.2008, DJe 28.4.2008; REsp 678.969/PB, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 13.12.2005, DJ 13.2.2006; REsp 149.832/MG, Rel. Min. José Delgado, publicado em 15.2.2000 ) Recurso especial provido.

(REsp 1119377/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/08/2009, DJe 04/09/2009)

Como se observa da ementa, entendeu o STJ que o MP seria também legitimado, pelos seguintes fundamentos:

  • A condenação aplicada pelo Tribunal de Contas busca recuperar o patrimônio público, que não pode ser, no caso, interpretado de forma restrita, a impedir a atuação do MP;
  • Além disso, segundo a lei da ação civil pública, inclui-se entre as atribuições do MP a defesa do patrimônio público, o que evidenciaria sua legitimidade, decorrente, ainda, da previsão do art. 129, III, da CF/88;
  • A distinção entre o patrimônio público meramente econômico e o patrimônio do povo apenas deve operar para fins de afastar a legitimação ordinária do MP no caso, eis que essa legitimação compete às procuradorias judiciais do ente público;
  • Havendo inércia destas, porém, poderá o MP atuar como legitimado extraordinário, já que atuará em nome próprio defendendo direito alheio;
  • Essa é a interpretação que deve prevalecer por garantir proteção maior ao bem jurídico tutelado.

E foi essa interpretação que prevaleceu na Corte de Justiça por certo período, até que o STF afetasse a matéria como possuindo repercussão geral e a julgasse, ocasião em que reafirmou posição que já havia consolidado sobre o tema, no sentido de ser o MP ilegítimo para essas demandas:

Recurso extraordinário com agravo. Repercussão geral da questão constitucional reconhecida. Reafirmação de jurisprudência. 2. Direito Constitucional e Direito Processual Civil. Execução das decisões de condenação patrimonial proferidas pelos Tribunais de Contas. Legitimidade para propositura da ação executiva pelo ente público beneficiário. 3. Ilegitimidade ativa do Ministério Público, atuante ou não junto às Cortes de Contas, seja federal, seja estadual. Recurso não provido.

(ARE 823347 RG, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 02/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-211 DIVULG 24-10-2014 PUBLIC 28-10-2014)

Ao decidir o tema, o STF reafirmou a impossibilidade de se conferir interpretação ampliativa ao art. 129, III, da CF/88, retomando, com isso, a distinção entre o patrimônio do Poder Público e o patrimônio público em si.

Assim, explicitou que as condenações do TCU buscam exatamente garantir a devolução dos recursos que foram indevidamente utilizados pelos gestores, e que eram provenientes do patrimônio do Poder Público.

Por conta disso, havendo um interesse econômico na espécie, cabe ao ente público beneficiado com a restituição dos valores a legitimidade para atuar, por ser ele o interessado na hipótese.

Não há, portanto, que se falar em interesse do MP ou em sua legitimidade, pois, no caso, não se está tratando do patrimônio público como sinônimo de patrimônio do povo.

Apenas após essa decisão é que o STJ reviu sua jurisprudência, passando a sustentar mesma posição consolidada pelo STF:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE PARA A EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL PROVENIENTE DE DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS.

A execução de título executivo extrajudicial decorrente de condenação patrimonial proferida por tribunal de contas somente pode ser proposta pelo ente público beneficiário da condenação, não possuindo o Ministério Público legitimidade ativa para tanto. De fato, a Primeira Seção do STJ pacificou o entendimento no sentido de que o Ministério Público teria legitimidade, ainda que em caráter excepcional, para promover execução de título executivo extrajudicial decorrente de decisão de tribunal de contas, nas hipóteses de falha do sistema de legitimação ordinária de defesa do erário (REsp 1.119.377-SP, DJe 4/9/2009). Entretanto, o Pleno do STF, em julgamento de recurso submetido ao rito de repercussão geral, estabeleceu que a execução de título executivo extrajudicial decorrente de decisão de condenação patrimonial proferida por tribunal de contas pode ser proposta apenas pelo ente público beneficiário da condenação, bem como expressamente afastou a legitimidade ativa do Ministério Público para a referida execução (ARE 823.347-MA, DJe 28/10/2014). Além disso, a Primeira Turma do STJ também já se manifestou neste último sentido (REsp 1.194.670-MA, DJe 2/8/2013). Precedentes citados do STF: RE 791.575-MA AgR, Primeira Turma, DJe 27/6/2014; e ARE 791.577-MA AgR, Segunda Turma, DJe 21/8/2014. REsp 1.464.226-MA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 20/11/2014.

É interessante observar que, ao reformular sua posição, o STJ destacou pontos relevantes:

Primeiro, acolheu a interpretação mais restritiva conferida ao art. 129, III, da CF pelo STF. Além disso, considerou que ampliar essa interpretação acabaria por tornar letra morta a previsão do art. 12, incisos I e II, do CPC, que trata da representação judicial das pessoas jurídicas de direito público.

Mas, o ponto mais relevante da posição do STJ refere-se à aplicabilidade que foi garantida ao art. 81 da Lei 8.443/92, que dispõe sobre a Lei Orgânica do TCU.

Segundo esse dispositivo, caberá ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas promover junto à AGU a execução das condenações impostas pela Corte de Contas e não pagas voluntariamente.

Assim, segundo frisou o STJ, essa previsão legal afasta a própria legitimidade do MP no caso, principalmente porque interpretação em sentido diverso afrontaria a previsão constitucional a respeito de suas atribuições institucionais, que não mais inclui a representação judicial de entidades públicas.

Com isso, portanto, os Tribunais superiores fixaram o entendimento de que as condenações impostas pelas Cortes de Contas devem ser executadas exclusivamente pelo ente público que delas se beneficia, através de seus órgãos de representação judicial, carecendo de legitimidade para tanto o próprio Tribunal de Contas e o MP.

Um ponto relevante, porém, surgiu a partir da posição fixada pelo Supremo. Para que possamos compreendê-lo, vamos imaginar a seguinte situação:

Determinado prefeito está sendo investigado por ter desviado verbas públicas municipais destinadas à realização de uma licitação. Como o município não possui Corte de Contas – considerando que, pela CF, apenas aqueles municípios que já possuíam suas Cortes deveriam mantê-las, o que, no caso, afetou apenas São Paulo e Rio de Janeiro -, portanto, a questão foi analisada pelo Tribunal de Contas Estadual, que lhe condenou a devolver ao erário os valores desviados.

Na hipótese, portanto, tem-se que o ente público prejudicado foi o Município, mas a decisão foi proferida pelo Tribunal de Contas do Estado.

Quem será, na hipótese, o órgão responsável por executar a condenação imposta pelo TCE: a procuradoria do Município atingido ou a Procuradoria Estadual, por ser ela a responsável pela representação judicial do TCE?

No âmbito do STF, a questão permanece sem resposta, tendo sido reconhecida a repercussão geral da matéria:

LEGITIMIDADE – EXECUÇÃO DE MULTA APLICADA PELO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO – DANOS AO ERÁRIO MUNICIPAL – MATÉRIA CONSTITUCIONAL – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL VERIFICADA. Possui repercussão geral a controvérsia acerca da legitimidade para promover a execução de multa aplicada pelo Tribunal de Contas estadual a agente político, por danos causados ao erário municipal – se do estado ou do município no qual ocorrida a irregularidade.

(ARE 641896 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 11/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-085 DIVULG 07-05-2013 PUBLIC 08-05-2013 )

Veja que nos julgados anteriormente mencionados, em que o STF reconheceu a legitimidade apenas do ente público beneficiado pela decisão da Corte de Contas, o Supremo não buscou distinguir os contornos desse “benefício”.

Assim, tratou de modo genérico da legitimidade, apenas para afasta-la em relação ao MP e ao próprio Tribunal de Contas.

Uma solução para o tema, então, foi buscada pelo STJ, que, para tanto, distinguiu duas situações:

  • 1ª) se o Tribunal de Contas Estadual estiver determinando o ressarcimento ao erário à nesse caso, a legitimidade será do ente público que efetivamente sofreu o prejuízo. No caso que estamos tratando, portanto, a execução ficaria a cargo da Procuradoria Municipal, eis que as verbas desviadas pertenciam à municipalidade;
  • 2ª) Se o Tribunal de Contas Estadual estiver determinando o pagamento de multa à no caso, a legitimidade será do ente público de que faz parte a Corte de Contas, já que se trata do recolhimento de penalidade que busca reforçar a atividade fiscalizatória do Tribunal. Em sendo a multa aplicada pelo Tribunal de Contas Estadual, portanto, a legitimidade será da Procuradoria Geral do Estado.

A matéria foi uniformizada pela Primeira Seção nos seguintes termos:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MULTA APLICADA POR TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL A GESTOR MUNICIPAL. RECEITA DO ENTE FEDERATIVO A QUE SE VINCULA O ÓRGÃO SANCIONADOR. LEGITIMIDADE DO ESTADO PARA AJUIZAR A COBRANÇA.

  1. A controvérsia diz respeito à titularidade da cobrança de crédito decorrente de multa aplicada a gestor municipal por Tribunal de Contas estadual. O acórdão embargado consignou que a cobrança compete ao próprio município, enquanto o paradigma entende que a legitimidade para a execução é do Estado a que se vincula a Corte de Contas.
  2. Ambas as Turmas da Primeira Seção adotavam o mesmo posicionamento, no sentido do acórdão embargado, até o julgamento do REsp 1.181.122/RS, no qual a Segunda Turma reviu sua jurisprudência.
  3. Devem-se distinguir os casos de imputação de débito/ressarcimento ao Erário – em que se busca a recomposição do dano sofrido, e, portanto, o crédito pertence ao ente público cujo patrimônio foi atingido – dos de aplicação de multa, que, na ausência de disposição legal específica, deve ser revertida em favor do ente a que se vincula o órgão sancionador.
  4. Não foi outra a solução preconizada pelo Tribunal de Contas da União, em cujo âmbito as multas, mesmo que aplicadas a gestores estaduais ou municipais, sempre são recolhidas aos cofres da União.
  5. Este mesmo raciocínio deve ser aplicado aos Tribunais de Contas estaduais, de modo que as multas deverão ser revertidas ao ente público ao qual a Corte está vinculada, mesmo se aplicadas contra gestor municipal.
  6. Dessa forma, a legitimidade para cobrar os créditos referentes a multas aplicadas por Tribunal de Contas é do ente público que mantém a referida Corte – na espécie, o Estado do Rio Grande do Sul -, por intermédio de sua Procuradoria.
  7. Embargos de Divergência providos.

(EAg 1138822/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/12/2010, DJe 01/03/2011)

Interessante observar que um dos argumentos utilizados pelo STJ para reforçar sua argumentação refere-se justamente à orientação existente no âmbito do TCU, que faz a distinção para atribuir a legitimidade para a execução de suas multas sempre à AGU, sendo que a execução das condenações de ressarcimento ao erário dependerá do ente público prejudicado.

Sobre esse primeiro ponto, portanto, é preciso lembrar que, embora a questão não tenha sido ainda pacificada no âmbito do STF, onde aguarda julgamento sob a sistemática da repercussão geral, no entendimento do STJ a competência para a execução das condenações impostas pelo Tribunal de Contas variará de acordo com a natureza da verba: se relativa ao ressarcimento ao erário dos valores irregularmente empregados, a legitimidade será do ente público prejudicado com a ilegalidade cometida; se relativa à multa, a legitimidade será do ente público do qual faz parte a Corte de Contas, eis que essa penalidade servirá para ratificar a competência fiscalizatória do Tribunal.

Voltando agora o nosso estudo especificamente para a atividade do TCU, surge aqui o segundo ponto relevante: no caso de execução a ser promovida pela AGU considerando a distinção acima estudada, a competência será da Procuradoria Geral da União, isto é, dos Advogados da União, ou da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, que atuará através dos Procuradores da Fazenda Nacional?

Esse é um ponto muito relevante para o candidato aos concursos da AGU, pois envolve interpretação acerca da LC 73/93.

Diferentemente do que ocorre em relação à Procuradoria-Geral da União, que não tem suas atribuições enumeradas na referida LC, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional possui suas atribuições especificadas no texto legal, que as elenca em quatro incisos do art. 12 (já que o inciso III foi vetado), da seguinte forma:

Art. 12 – À Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, órgão administrativamente subordinado ao titular do Ministério da Fazenda, compete especialmente:

I – apurar a liquidez e certeza da dívida ativa da União de natureza tributária, inscrevendo-a para fins de cobrança, amigável ou judicial;

II – representar privativamente a União, na execução de sua dívida ativa de caráter tributário;

III –  (VETADO)

IV – examinar previamente a legalidade dos contratos, acordos, ajustes e convênios que interessem ao Ministério da Fazenda, inclusive os referentes à dívida pública externa, e promover a respectiva rescisão por via administrativa ou judicial;

V – representar a União nas causas de natureza fiscal.

Mais adiante, o parágrafo único vem descrever quais seriam essas causas de natureza fiscal:

Parágrafo único – São consideradas causas de natureza fiscal as relativas a:

I – tributos de competência da União, inclusive infrações à legislação tributária;

II – empréstimos compulsórios;

III – apreensão de mercadorias, nacionais ou estrangeiras;

IV – decisões de órgãos do contencioso administrativo fiscal;

V – benefícios e isenções fiscais;

VI – créditos e estímulos fiscais à exportação;

VII – responsabilidade tributária de transportadores e agentes marítimos;

VIII – incidentes processuais suscitados em ações de natureza fiscal.

Como se observa, no momento em que a LC 73/93 especificou quais seriam as atribuições da PGFN, garantiu à PGU atribuição para exercer a representação judicial da União Federal em todas as demais causas, a partir de um juízo de exclusão.

Além disso, observando o disposto no art. 12, inclusive com as especificações contidas em seu parágrafo único, é possível observar que as condenações impostas pelo TCU, seja para ressarcimento ao erário seja para o pagamento de multa, não estão incluídas naquele dispositivo, o que afasta, portanto, a competência da PGFN no caso, garantindo esta atribuição à PGU, de forma residual.

Conclui-se, assim, que competirá à Procuradoria-Geral da União a execução judicial das decisões proferidas pelo Tribunal de Contas da União sempre que a União Federal for por elas beneficiada, o que ocorrerá nas hipóteses de execução de multa – vez que o TCU é órgão federal – e nas hipóteses de ressarcimento ao erário quando o ente público prejudicado pela aplicação irregular de verbas for a própria União.

Revisando todos os pontos aqui analisados, portanto, temos o seguinte:

  • A legitimidade para a cobrança judicial das condenações impostas por Tribunais de Contas não é atribuída nem ao MP nem à própria Corte de Contas, cabendo, exclusivamente, ao ente público beneficiário da decisão, através do seu órgão de representação judicial;
  • Para averiguar qual ente público será beneficiado com a decisão da Corte de Contas, contudo, o STJ faz uma distinção a partir da natureza da condenação:
  • Se voltada a garantir o ressarcimento ao erário de valores indevidamente empregados, a legitimidade caberá ao ente público que foi prejudicado com a aplicação irregular de seus recursos;
  • Se voltada a garantir o pagamento de multa imposta pelo Tribunal de Contas, a legitimidade caberá ao ente público de que faça parte a Corte, já que a multa tem por finalidade reforçar a sua atividade fiscalizatória; 
  • A matéria, contudo, ainda não foi pacificada pelo STF, onde aguarda posição final a ser adotada sob a sistemática da repercussão geral;
  • Em todo caso, em sendo a União Federal o ente público beneficiado, a execução caberá à PGU, e não à PGFN, eis que tal atribuição não se encontra dentre aquelas legalmente listadas como de atribuição deste último órgão, o que reclama a atuação residual da PGU no tema.

Bons estudos, Hitala Mayara.

EBEJI

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