João Paulo Lawall Valle é Advogado da União

Professor da EBEJI

ebeji

Prezados,

Preparei para vocês um texto sobre um tema que tem chance reais de ser cobrado pela ESAF na prova de Procurador da Fazenda Nacional, como pelo CESPE na prova de Advogado da União. O processo civil é cobrado pelas duas bancas com profundidade e estar atualizado é fundamental para a obtenção de uma boa nota.

Vamos ao que interessa.

O interesse recursal (viés do interesse de agir aplicado à fase recursal) é estudada e definida pela doutrina processual a luz da existência da sucumbência. A sucumbência deve ser entendida como a frustração, a derrota, da expectativa inicial do Autor ao ajuizar uma demanda. Segundo a locução expressa do artigo 499 do CPC “o recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público”. A dicção legal, nos termos da doutrina processual e da jurisprudência do STJ, é muito simplista, não dizendo todo o necessário sobre a sucumbência e a questão do interesse de agir para o recurso.

 Ponto fundamental é diferenciar a chamada sucumbência material da sucumbência formal.

– Sucumbência Material: é fenômeno processual referente a aspecto material do processo, ocorrendo sempre que a parte deixe de obter no mundo dos fatos a totalidade do que poderia ter conseguido com o processo (Ex: condenação em extensão menor da que for requerida na petição inicial);

– Sucumbência Formal: esta, por sua vez, é a situação processual na qual a frustração da parte ocorre apenas em termos processuais. A parte deixa de obter com o processo tudo aquilo que ela pretendeia obter em virtude do pedido que formulou na sua pretensão (Ex: parte ré que na contestação reconhece um dos pedidos e requer a improcedência dos demais. Se for proferida uma sentença de total procedência o réu sucumbiu formalmente, visto que a sua posição processual restou frustrada – pretendia a procedência parcial).

Cabe destacar que nos casos em que ocorra a sucumbência formal, também ocorrerá a sucumbência material, entretanto é possível vislumbrar situação na qual a sucumbência formal não ocorra, mas a sucumbência material se faça presente.

O interposição de recurso na modalidade adesiva pressupõe a chamada sucumbência recíproca. Assim traz o CPC:

“Art. 500. Cada parte interporá o recurso, independentemente, no prazo e observadas as exigências legais. Sendo, porém, vencidos autor e réu, ao recurso interposto por qualquer deles poderá aderir a outra parte. O recurso adesivo fica subordinado ao recurso principal e se rege pelas disposições seguintes”.

O STJ, no informativo de jurisprudência nº 562, trouxe a publicação da decisão do REsp 1.102.479-RJ (25/05/2015) julgado pela sistemática dos recursos repetitivos, onde ficou definido que é possível o manejo de recurso na modalidade adesiva quando estiver configurada a sucumbência material recíproca. No caso o Tribunal julgava caso no qual a parte ré foi condenada a pagar indenização a título de danos morais, mas esta condenação se deu em montante inferior ao requerido na exordial. Neste julgado o Superior Tribunal de Justiça definiu que o interesse recursal do autor, no caso de pedido de indenização por danos morais existe na situação na qual o recurso pode ampliar, no mundo dos fatos, o valor que o mesmo receberá a título de indenização.

Destaco, ainda, que o Tribunal se manifestou expressamente pela não aplicação da Súmula 326 no presente caso, visto que a mesma foi editada com base em decisões que tratava de sucumbência recíproca sob as perspectivas econômica e formal, referente às despesas processuais e honorários advocatícios.

Segue o julgado conforme veiculado no informativo:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ADESIVO PARA MAJORAR QUANTIA INDENIZATÓRIA DECORRENTE DE DANO MORAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 459.

O recurso adesivo pode ser interposto pelo autor da demanda indenizatória, julgada procedente, quando arbitrado, a título de danos morais, valor inferior ao que era almejado, uma vez configurado o interesse recursal do demandante em ver majorada a condenação, hipótese caracterizadora de sucumbência material. O CPC trata do recurso adesivo em seu art. 500, do qual se depreende, pela interpretação teleológica, que o cabimento do recurso adesivo pressupõe a constatação da “sucumbência recíproca”, expressão a ser compreendida sob o enfoque da existência de interesse recursal da parte. O interesse recursal exsurge em face da constatação da utilidade da prestação jurisdicional concretamente apta a propiciar um resultado prático mais vantajoso ao recorrente. Nessa ordem de ideias, considerar-se-á vencida a parte que tenha obtido prestação jurisdicional aquém do que pretendia, tanto quanto aquelas efetivamente prejudicadas ou colocadas em situação desfavorável pela decisão judicial. A propósito, importante destacar lição doutrinária acerca da existência de distinção entre “sucumbência formal” e “sucumbência material” para fins de aferição do interesse recursal das partes: (a) “Por sucumbência formal se entende a frustração da parte em termos processuais, ou seja, a não obtenção por meio da decisão judicial de tudo aquilo que poderia ter processualmente obtido em virtude do pedido formulado ao órgão jurisdicional. Nesse sentido, será sucumbente formal o autor se este não obtiver a procedência integral de seu pedido e o réu se não obtiver a improcedência integral do pedido do autor. Na parcial procedência do pedido haverá sucumbência formal recíproca”; e (b) “A sucumbência material, por sua vez, se refere ao aspecto material do processo, verificando-se sempre que a parte deixar de obter no mundo dos fatos tudo aquilo que poderia ter conseguido com o processo. A análise nesse caso nada tem de processual, fundando-se no bem ou bens da vida que a parte poderia obter em virtude do processo judicial e que não obteve em razão da decisão judicial. Essa discrepância entre o desejado no mundo prático e o praticamente obtido no processo gera a sucumbência material da parte”. A doutrina ainda conclui que: “Verificando-se a sucumbência formal, em regra, também haverá sucumbência material, sendo presumível que, não obtendo processualmente tudo o que o processo poderia lhe entregar, a parte também não obterá tudo o que poderia obter no plano prático. É até possível estabelecer uma regra de que, sempre que exista sucumbência formal, haverá também a material, mas essa vinculação entre as duas espécies de sucumbência nem sempre ocorrerá, havendo casos excepcionais nos quais não haverá sucumbência formal, mas ocorrerá a material”. Assim, a procedência integral da pretensão deduzida na inicial, conquanto configure a sucumbência formal apenas da parte ré, pode vir a consubstanciar a chamada sucumbência material inclusive do autor da demanda, quando obtido provimento jurisdicional em extensão inferior a tudo aquilo que se almejava obter do ponto de vista prático. É o que ocorre nos casos de pretensão indenizatória calcada em dano moral. Isto porque a procedência da demanda configura, sem sombra de dúvidas, sucumbência formal e material do réu. Contudo, o arbitramento judicial de quantumindenizatório tido por irrisório, porque inferior aos parâmetros jurisprudenciais ou ao pedido constante da inicial, caracteriza frustração da expectativa do autor, sobressaindo seu interesse em ver majorada a condenação, hipótese caracterizadora, portanto, da sucumbência material viabilizadora da irresignação recursal. Dada a premissa anteriormente lançada, cumpre afastar a aparente dissonância com a orientação jurisprudencial cristalizada na Súmula 326 do STJ, segundo a qual: “Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca”. Deveras, o aludido verbete sumular funda-se em jurisprudência voltada à definição da responsabilidade pelo pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios devidos em razão da procedência de ação de indenização por danos morais, quando fixada quantia inferior à desejada pelo autor, tendo em vista os critérios delineados notadamente nos arts. 20 e 21 do CPC. Desse modo, a exegese consolidada na Súmula 326 do STJ não pode servir de amparo para a verificação da existência de interesse recursal do autor da demanda ressarcitória, porque adstrita ao exame da sucumbência recíproca sob as perspectivas formal e econômica, vale dizer, tão-somente tornando defesa a imputação do ônus sucumbencial à parte que obteve provimento jurisdicional de procedência da pretensão deduzida. Assim, constatado o interesse recursal do autor da ação de indenização por danos morais, quando arbitrada quantia inferior ao valor desejado, a decisão será apelável, embargável ou extraordinariamente recorrível. Consequentemente, uma vez cabida a interposição de recurso independente pelo autor materialmente sucumbente (a despeito da ausência de sucumbência formal), não se pode tolher seu direito ao manejo de recurso adesivo em caso de impugnação principal exclusiva da parte adversa. Outrossim, como reforço de argumento, cumpre assinalar a afirmação doutrinária de que “o interesse em recorrer adesivamente afere-se à luz da função processual do recurso adesivo, que é a de levar à cognição do órgão ad quem matéria ainda não abrangida pelo efeito devolutivo do recurso principal, e que, portanto, ficaria preclusa em não ocorrendo a adesão”. Precedentes citados: AgRg no AREsp 189.692-MG, Terceira Turma, DJe 7/11/2012; AgRg no Ag 1.393.699-MS, Quarta Turma, DJe 28/3/2012; e REsp 944.218-PB, Quarta Turma, DJe 23/11/2009. REsp 1.102.479-RJ, Rel. Min. Marco Buzzi, Corte Especial, julgado em 4/3/2015, DJe 25/5/2015.

Este tema tem grande relevância para as provas que ocorreram para a Advocacia Pública, sendo fundamental aos candidatos da PFN como da AGU estudar e conhecer o conceito exposto neste texto.

Bons estudos!!!

Grande abraço a todos, João Paulo Lawall Valle.