João Paulo Cachate

Defensor Público Federal e Professor da EBEJI

EBEJI

Olá a todos(as) os(as) leitores(as) do blog!

Segundo o wikipédia,

Dâmocles é protagonista de uma anedota moral que figurou originalmente na história perdida da Sicília por Timeu de Tauromênio (c. 356 -260 a.C.). Cícero pode tê-la lido em Diodoro Sículo. Ele fez uso dela em suas Tusculan Disputationes V.61 – 62. Dâmocles era um cortesão bastante bajulador na corte do tirano Dionísio, de Siracusa. Ele dizia que, como um grande homem de poder e autoridade, Dionísio era verdadeiramente afortunado. Dionísio ofereceu-se para trocar de lugar com ele por um dia, para que ele também pudesse sentir o gosto de toda esta sorte, sendo servido em ouro e prata, atendido por garotas de extraordinária beleza, e servido com as melhores comidas. No meio de todo o luxo, Dionísio ordenou que uma espada fosse pendurada sobre o pescoço de Dâmocles, presa apenas por um fio de rabo de cavalo. Ao ver a espada afiada suspensa diretamente sobre sua cabeça, perdeu o interesse pela excelente comida e pelas belas garotas e abdicou de seu posto, dizendo que não queria mais ser tão afortunado. A espada de Dâmocles é uma alusão freqüentemente usada para remeter a este conto, representando a insegurança daqueles com grande poder (devido à possibilidade deste poder lhes ser tomado de repente) ou, mais genericamente, a qualquer sentimento de danação iminente.

Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/D%C3%A2mocles

Esse sentimento de “danação iminente”, de “espada de Dâmocles na cabeça”, sempre rondou todos aqueles que cometeram ilícitos contra o Erário, pois, uma interpretação literal teimava em pairar sobre o art. 37, § 5º, da CRFB/1988, entendendo-se que toda e qualquer ação de ressarcimento ao erário era imprescritível.

A jurisprudência dos Tribunais Superiores seguia essa interpretação literal:

STJ. ACP. PLEITO RESSARCITÓRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. É pacífico no STJ que as sanções previstas no art. 12 e incisos da Lei n. 8.429/1992 prescrevem em cinco anos, o que não ocorre com a reparação do dano ao erário por ser imprescritível a pretensão ressarcitória nos termos do art. 37, § 5º, da CF/1988. Assim, quando autorizada a cumulação do pedido condenatório e do ressarcitório em ação por improbidade administrativa, a rejeição do pedido condenatório abarcado pela prescrição não impede o prosseguimento da demanda quanto ao segundo pedido em razão de sua imprescritibilidade.Precedentes citados: AgRg no REsp 1.038.103-SP, DJe 4/5/2009; REsp 1.067.561-AM, DJe 27/2/2009; REsp 801.846-AM, DJe 12/2/2009; REsp 902.166-SP, DJe 4/5/2009, e REsp 1.107.833-SP, DJe 18/9/2009. REsp 1.089.492-RO, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 4/11/2010.

 PROCESSUAL CIVIL E  ADMINISTRATIVO.  AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. RESSARCIMENTO DE DANO AO ERÁRIO PÚBLICO. IMPRESCRITIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. 1. O prequestionamento não exige que haja menção expressa dos dispositivos infraconstitucionais tidos como violados, entretanto, é imprescindível que no aresto recorrido a questão tenha sido discutida e decidida fundamentadamente, sob pena de não preenchimento do requisito do prequestionamento, indispensável para o conhecimento do recurso. Incidência da Súmula 211/STJ. 2. É pacífico o entendimento desta Corte Superior  no sentido de que a pretensão de ressarcimento por prejuízo causado ao erário, manifestada na via da ação civil pública por improbidade administrativa, é imprescritível. Daí porque o art. 23 da Lei n. 8.429/92 tem âmbito de aplicação restrito às demais sanções prevista no corpo do art. 12 do mesmo diploma normativo. 3. Nesse sentido: AgRg no AREsp 388.589/RJ, 2ª Turma, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe 17/02/2014; REsp 1268594/PR, 2ª Turma, Rel. Ministra Eliana Calmon, DJe 13/11/2013; AgRg no REsp 1138564/MG, 1ª Turma, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, DJe 02/02/2011. 4. Os recorrentes não cumpriram os requisitos recursais que comprovassem o dissídio jurisprudencial nos termos do art. 541, parágrafo único, do CPC e do art. 255 e parágrafos, do RISTJ, pois  há a necessidade do cotejo analítico entre os acórdãos considerados paradigmas e a decisão impugnada, sendo imprescindível a exposição das similitudes fáticas entre os julgados. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1442925 / SP, Rel.Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma,julgado em 16/09/2014)

Porém, o RE 669.069, felizmente, (re)visitou a interpretação que se dava ao art. 37, § 5º, da Constituição Federal, ousando ir além da literalidade da norma constitucional, e deu fim ao malfadado “in claris cessat interpretativo”.

Na quarta-feira, 3/2/2016, os ministros do STF firmaram tese de repercussão geral no sentido de que “é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil”.

Entenda o caso:

A União propôs ação de ressarcimento contra uma empresa de transporte rodoviário e um de seus motoristas por entender que houve culpa exclusiva do condutor do ônibus em batida contra uma viatura da Companhia da Divisão Anfíbia da Marinha, ocorrida no dia 20 de outubro de 1997 em uma rodovia no Estado de Minas Gerais. Naquele ano ainda vigorava o Código Civil de 1916, que estabelecia prazo para efeito de prescrição das pretensões reparatórias de natureza civil. No entanto, a ação foi ajuizada pela União em 2008, quando vigorava o Código Civil de 2002.

O RE foi interposto pela União contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) que aplicou o prazo prescricional de cinco anos para confirmar sentença que extinguiu a ação de ressarcimento por danos causados ao patrimônio público, decorrente do acidente.

O que a AGU defende:

A União alegava a imprescritibilidade do prazo. Basicamente, os fundamentos são:

  • a-) interpretação literal do art. 37, § 5º, da CRFB/1988;
  • b-) onde a Constituição não distingue, não cabe ao intérprete distinguir;
  • c-) a parte final do dispositivo constitucional em comento veicularia, sob a forma da imprescritibilidade, uma ordem de bloqueio destinada a conter eventuais iniciativas legislativas displicentes com o patrimônio público.

O que entendeu o STF:

A maioria dos Ministros acompanhou o voto do relator, Ministro Teori Zavascki, que negou provimento ao recurso, bem como a tese proposta pelo ministro Luís Roberto Barroso no sentido de que, em se tratando de ilícitos civis, há a incidência da prescrição.

Para o Supremo, não seria adequado embutir na norma de imprescritibilidade um alcance ilimitado. De acordo com o sistema constitucional, o qual reconheceria a prescritibilidade como princípio, se deveria atribuir um sentido estrito aos ilícitos previstos no § 5º do art. 37 da CF. Uma interpretação ampla da ressalva final conduziria à imprescritibilidade de toda e qualquer ação de ressarcimento movida pelo erário, mesmo as fundadas em ilícitos civis que não decorram de culpa ou dolo.

A (re)interpretação da norma em comento levaria à conclusão de que a imprescritibilidade diria respeito apenas às ações de ressarcimento de danos decorrentes de ilícitos tipificados como de improbidade administrativa e como ilícitos penais.

Portanto, nos casos de ilícitos de cunho civil, há de se aplicar o prazo prescricional comum para as ações de indenização por responsabilidade civil em que a Fazenda figurasse como autora, ou seja, 5 (cinco) anos, com base no decreto n.º 20.910/1932.

O alcance da decisão:

A tese de que é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil não alcança prejuízos que decorram de ato de improbidade administrativa, tema não discutido no RE em pauta.

Segundo o Ministro Dias Tofolli, “não há no tema de fundo discussão quanto à improbidade administrativa nem mesmo de ilícitos penais que impliquem em prejuízos ao erário ou, ainda, das demais hipóteses de atingimento do patrimônio estatal nas suas mais variadas formas”, destacou. “Portanto, não há como se debater sobre todo o comando jurídico do artigo 37, parágrafo 5º”, completou o Ministro.

O que você defenderá nos concursos:

Tenho a plena convicção que esse assunto vai cair na sua prova… Sendo assim, recomendo a leitura do julgado RE 669.069.

Porém, para facilitar sua vida, eis as teses que você defenderá:

a-) AGU, por exemplo: Dizer o entendimento exarado pelo STF no RE em questão. Porém, deverá criticá-lo, fundamentando sua resposta, pelo menos, nos seguintes argumentos:

  • Interpretação literal do art. 37, § 5º, da CRFB/1988;
  • Onde a Constituição não distingue, não cabe ao intérprete distinguir;
  • A parte final do dispositivo constitucional em comento veicularia, sob a forma da imprescritibilidade, uma ordem de bloqueio destinada a conter eventuais iniciativas legislativas displicentes com o patrimônio público.

b-) DPU, MPF, TRF:

  • Há uma nova interpretação ao art. 37, § 5º, da Constituição Federal.
  • De acordo com o STF, em decisão julgada sobre a sistemática de Repercussão Geral, a ressalva contida na parte final do parágrafo 5º do artigo 37 da Constituição Federal, que remete a lei a fixação de prazos de prescrição para ilícitos que causem prejuízos ao erário, mas excetua respectivas ações de ressarcimento, deve ser entendida de forma estrita.
  • Há prescrição em danos à Fazenda Pública decorrentes de ilícito civil.
  • A imprescritibilidade a que se refere a aludida norma constitucional diria respeito apenas a ações de ressarcimento de danos decorrentes de ilícitos tipificados como de improbidade administrativa e como ilícitos penais.
  • A prescrição visa impedir que o cidadão viva eternamente com uma “espada de Dâmocles na cabeça”.
  • Segundo o jurista Clóvis Beviláqua, “o fundamento da prescrição é a necessidade de se assegurar a ordem e a paz na sociedade”. 
  • Há de se garantir, por meio da prescrição, certeza e segurança nas relações sociais, sobretudo no campo patrimonial.

Beleza?! 

Despeço-me desejando excelentes e proveitosas horas de estudo…

João Paulo Cachate

__

Fonte: https://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=309262