Olá, leitores! Cronograma de estudos em dia?

No texto de hoje vou abordar o reconhecimento implícito do pedido como consequência da intervenção móvel do Poder Público. Inicialmente, vou falar um pouco sobre a intervenção móvel para que possam rememorar o tema e, em seguida, abordarei um julgado do STJ que trata da problemática, o qual provavelmente você desconhece, uma vez que não foi objeto de informativo, mas possui grandes chances de estar em sua prova, haja vista a importância do assunto.

Como cediço, a Administração tem como uma de suas obrigações zelar pelo interesse público e corrigir, a qualquer momento, atos editados sem a observância dos requisitos normativos. Nesse sentido, pode contestar ou encampar o pedido veiculado em Ação Civil Pública, desde que útil à defesa do patrimônio público e do interesse da coletividade, conforme art. 6º, § 3º, da Lei 4.717/1965, in verbis:

Art. 6º A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referidas no art. 1º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo.

[…]

§ 3º A pessoas jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente.

Com efeito, justamente por permitir a migração do Poder Público do polo passivo para o ativo, o instituto previsto pelo supratranscrito artigo recebeu denominação pela doutrina de “intervenção móvel do Poder Público”.

A propósito, a conformação dada à intervenção móvel pela Lei de Ação Popular se cuida de contorno mínimo, na medida em que a jurisprudência do  STJ, tomando como ponto de partida o regime da referida lei, encaminhou-se no sentido de admitir a migração do polo passivo para o ativo também em sede de Ação Civil Pública.

De acordo com a Corte, a Ação Civil Pública e a Ação Popular compõem um microssistema de defesa do patrimônio público na acepção mais ampla do termo, por isso regulam a legitimatio ad causam de forma especialíssima[1].

Sem embargo, consoante o Tribunal da Cidadania, ajuizada ação impugnando ato administrativo, a migração da entidade de direito público contra a qual se move a demanda para o polo ativo não se dá livremente.

Com efeito, consoante o STJ, o juiz somente deve admitir a ampliação do polo ativo em virtude da intervenção móvel, caso demonstrado pelo ente público, de maneira concreta e indubitável, que de boa-fé e eficazmente tomou as necessárias providências saneadoras da ilicitude, bem como medidas disciplinares contra os servidores ímprobos, omissos ou relapsos.

Isso porque, para o Superior Tribunal de Justiça, a opção por figurar no polo ativo da ação implica RECONHECIMENTO IMPLÍCITO DO PEDIDO, sobretudo os de caráter unitário (p. ex., anulação dos atos administrativos impugnados), razão pela qual não pode vir dissociada de postura extraprocessual no sentido de sanar a lesividade.

Sob esse prisma, o referido entendimento é de suma importância para concursos e restou exarado na ementa a seguir, proferida em sede de Recurso Especial em Ação Civil Pública Ambiental:

AÇÃO  CIVIL  PÚBLICA.  NULIDADE  DE AUTORIZAÇÃO E LICENÇA AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE  DO  ESTADO.  LITISCONSÓRCIO  PASSIVO  FACULTATIVO. MIGRAÇÃO  DE  ENTE  PÚBLICO  PARA  O  POLO ATIVO. INTERESSE PÚBLICO. POSSIBILIDADE. 1.  Trata-se,  na  origem,  de  Ação  Civil  Pública  ajuizada  pelo Ministério  Público  do Estado de São Paulo contra a Fazenda Pública do  mesmo  Estado para discutir a declaração de nulidade de licenças ambientais  expedidas  pelo  DEPRN  que  autorizaram, ilegalmente, a intervenção em Área de Preservação Permanente. 2.  A  jurisprudência  do  STJ é no sentido de que o deslocamento de pessoa  jurídica  de Direito Público do polo passivo para o ativo na Ação Civil Pública é possível quando presente o interesse público, a juízo do representante legal ou do dirigente, nos moldes do art. 6º, §  3º,  da  Lei 4.717/1965, combinado com o art. 17, § 3º, da Lei de Improbidade Administrativa. 3.  O  Estado  responde – em regime jurídico de imputação objetiva e solidária, mas de execução subsidiária – pelo dano ambiental causado por  particular  que  se valeu de autorização ou licença ilegalmente expedida,  cabendo ao autor da Ação Civil Pública, como é próprio da solidariedade  e  do  litisconsórcio passivo facultativo, escolher o réu   na  relação  processual  em  formação.  Se  a  ação  é  movida simultaneamente  contra  o particular e o Estado, admite-se que este migre  para  o  polo  ativo  da  demanda. A alteração subjetiva, por óbvio, implica reconhecimento implícito dos pedidos, sobretudo os de caráter   unitário   (p.  ex.,  anulação  dos  atos  administrativos impugnados), e só deve ser admitida pelo juiz, em apreciação ad hoc, quando o ente público demonstrar, de maneira concreta e indubitável, que  de  boa-fé  e  eficazmente  tomou  as  necessárias providências saneadoras  da  ilicitude,  bem como medidas disciplinares contra os servidores ímprobos, omissos ou relapsos. 4.  No  presente caso ficou assentado pelo Tribunal de Justiça que o Estado  de São Paulo embargou as obras do empreendimento e instaurou processo  administrativo  para apurar a responsabilidade dos agentes públicos  autores  do irregular licenciamento ambiental. Também está registrado que houve manifesto interesse em migrar para o polo ativo da demanda. 5. Recurso Especial provido. (REsp 1391263/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 07/11/2016)

Desse modo, na Ação Popular e na Ação Civil Pública, com fundamento no interesse público envolvido, a pessoa jurídica cujo ato é questionado pode optar por:

(i) atuar no polo passivo, em defesa do ato impugnado;

(ii) abster-se de contestar o pedido;

(iii) atuar ao lado do demandante, contra os réus, caso em que haverá o reconhecimento implícito do pedido de nulidade de ato administrativo,  devendo ser demonstrada a adoção de postura extraprocessual no sentido de sanar a lesividade.

Por fim, aproveitando o ensejo para revisar o assunto, lembre-se que, acerca do momento da migração de polo, assentou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pela ausência preclusão, podendo se dar a qualquer tempo, inclusive, após a contestação pelo ente de direito público, na medida em que a Lei 4.717/65 não traz limitação quanto ao momento em que deve ser realizada a migração e seu art. 17[2] preceitua que a entidade pode, ainda que tenha contestado a ação, proceder à execução da sentença na parte que lhe caiba, ficando evidente a viabilidade de composição do polo ativo a qualquer tempo[3].

Bons estudos!

[1] REsp 791.042/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ 09/11/2006, p. 261.

[2] Art. 17. É sempre permitida às pessoas ou entidades referidas no art. 1º, ainda que hajam contestado a ação, promover, em qualquer tempo, e no que as beneficiar a execução da sentença contra os demais réus.

[3] REsp 945.238/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 20/04/2009