Prezados alunos e leitores do blog da EBEJI,

O tema a ser tratado no blog essa semana é um instituto de direito administrativo que objetiva, sobretudo, a proteção do meio-ambiente, no que tange aos seus aspectos do patrimônio cultural, histórico e artístico.

O primeiro ponto a ser logo destacado é que o tombamento busca efetivamente proteger o meio ambiente. Devemos lembrar que o meio ambiente possui diversas acepções, não se limitando apenas aos elementos naturais, mas abrangendo também os elementos artificiais e culturais. Vejamos breve passagem de José Afonso da Silva sobre este tema:

“O conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda a natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico.

O meio ambiente é, assim, a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas. A integração busca assumir uma concepção unitária do ambiente, compreensiva dos recursos naturais e culturais.[…]

Merece referência em separado o meio ambiente do trabalho, como o local em que se desenrola boa parte da vida do trabalhador, cuja qualidade de vida está, por isso, em íntima dependência da qualidade daquele ambiente. É um meio que se insere no artificial, mas digno de tratamento especial, tanto que a Constituição o menciona explicitamente no art. 200, VIII”. (SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 7ª ed. Malheiros: São Paulo. 2009. p. 20.)

Este instituto de direito administrativo aqui tratado configura-se como uma intervenção não supressiva do Estado na propriedade privada, retirando o caráter absoluto desta, impondo ao particular algumas limitações ao exercício do direito de propriedade, definindo regras de forma a evitar a destruição ou descaracterização do bem de forma a comprometer obras com relevante valor cultural.

E vocês sabem onde está a regulamentação normativa do tombamento?

A fonte de validade primária é a própria Constituição da República que na Seção referente à Cultura prevê o tombamento como uma das formas do Poder Público promover e proteger o patrimônio cultural brasileiro. A menção expressa ao instituto está no parágrafo 1º do artigo 216:

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I – as formas de expressão;

II – os modos de criar, fazer e viver;

III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;

V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

  • 1º O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.

Na esfera federal o instituto é regulamentado pelo antigo Decreto-Lei 25/37 que Organiza a Proteção do patrimônio histórico e artístico nacional e trata do tombamento a partir do seu artigo 4º trazendo a regulamentação geral desta modalidade de intervenção do Estado na propriedade privada.

O tombamento pode recair sobre bens MÓVEIS ou bens IMÓVEIS desde que estes possuam aspectos relevantes de natureza histórica, artística ou cultural que justifiquem esta intervenção estatal na propriedade do particular.

 E em relação aos bens públicos? Estes estão sujeitos ao tombamento?

 Na seara da doutrina administrativista pende controvérsia sobre o tema. A parcela minoritária se divide entre duas posturas restritivas: a primeira veda este tipo de restrição à propriedade, enquanto outra parte entende que é possível o tombamento devendo, entretanto, ser preservada a hierarquia federativa.

Por sua vez, a doutrina majoritária entende indevida a restrição, admitindo que é possível o tombamento de um bem público, não havendo necessidade de respeito à hierarquia federativa. O argumento dominante desta corrente majoritária é que o tombamento não retira a propriedade do bem, sendo irrelevante ao interesse público e ao meio ambiente cultural quem é o proprietário do bem.

Esta corrente majoritária foi acolhida pelo Superior Tribunal de Justiça em precedente antigo, mas que reflete a posição da Corte sobre a matéria, a saber:

ADMINISTRATIVO – TOMBAMENTO – COMPETÊNCIA MUNICIPAL.

  1. A Constituição Federal de 88 outorga a todas as pessoas jurídicas de Direito Público a competência para o tombamento de bens de valor histórico e artístico nacional.
  2. Tombar significa preservar, acautelar, preservar, sem que importe o ato em transferência da propriedade, como ocorre na desapropriação.
  3. O Município, por competência constitucional comum – art. 23, III –, deve proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos.
  4. Como o tombamento não implica em transferência da propriedade, inexiste a limitação constante no art. 1º, § 2º, do DL 3.365/1941, que proíbe o Município de desapropriar bem do Estado.
  5. Recurso improvido. (RMS 18952 / RJ – Ministra Eliana Calmon – Segunda Turma – 30/05/2005)

E quais são as obrigações que decorrem do Tombamento?

O tombamento, intervenção permanente na propriedade (não confundir com a figura do “tombamento provisório”, medida assecuratória efetivada com a intenção de garantir o resultado prático do processo) gera algumas obrigações para o proprietário, sendo as mesmas divididas da seguinte forma:

(i) Obrigação de Tolerar:

– Fiscalização: o proprietário do bem deve permitir a fiscalização pelo Poder Público se o bem está sendo adequadamente conservado, mantendo-se as características que justificaram a intervenção estatal;

(ii) Obrigação de não fazer:

– Não Destruição: o proprietário não pode modificar o bem tombado, nem destruir ou mutila-lo, sendo que qualquer reforma a ser realizada na propriedade demanda autorização do Estado;

-Retirada do país: não é possível retirar o bem móvel tombado do país, salvo por curtos períodos de tempo a juízo da autoridade estatal competente;

(iii) Obrigação de fazer:

– Dever de Conservação: obrigação atribuída ao proprietário do bem tombado de conserva-lo da forma como se encontra de modo a manter as características que justificaram a intervenção estatal. Caso o proprietário não tenha condições financeiras de realizar a conservação deverá informar ao poder público, alterando assim o seu dever de conversar, para um dever de informar (art. 19 do Decreto-Lei nº 19/37);

Dever de Comunicação em Caso de Extravio: caso ocorra o extravio ou o furto de qualquer bem tombado, o respectivo proprietário deverá dar conhecimento do fato ao Poder Público.

Anteriormente à entrada em vigor do novo Código de Processo Civil havia também a obrigação de dar preferência ao Poder Público no caso de alienação do bem tombado. Acontece que o NCPC (art. 1.072, I) expressamente revogou o artigo 22 do Decreto-Lei nº 25/37 que justamente tratava desta obrigação de dar a preferência no caso de venda do bem.

Desta forma, após a vigência do novo Código de Processo Civil fica extinto o direito de preferência anteriormente atribuído ao Estado, podendo o particular livremente dispor do seu bem, devendo o adquirente conversa-lo nas exatas condições definidas no ato de tombamento.

O conhecimento deste instituto de direito administrativo, sobretudo da alteração legislativa aqui tratada, é importante para os concursos públicos, especialmente para as carreiras da Advocacia Pública.

Bons estudos!!