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De acordo com o art. 134, caput, da CF/1988, a Defensoria Pública (DP) é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.

A atribuição de “promover direitos humanos” requer, de certa e responsável forma, urgente revisitação dos conceitos de “necessitados”, no sentido de sua ampliação, necessariamente. É aqui que se fala em assistência jurídica expansiva.

O critério de acesso à Defensoria Pública basicamente limitava-se ao aspecto financeiro. Até hoje, infelizmente, a Defensoria Pública é conhecida como “advogada de pobre”. Entretanto, a doutrina (mais) moderna reconhece uma tríade da vulnerabilidade: a hipossuficiência econômica, jurídica e organizacional. Portanto, os critérios de acesso à Defensoria Pública passam, inevitavelmente, pela análise da vulnerabilidade, que se desdobra na análise da hipossuficiência econômica, jurídica e organizacional.

Seguindo a destinação fundamental da Defensoria Pública, delineada pelo mínimo constitucional contido no art. 134 c/c art. 5º, LXXIV da CRFB, são consideradas funções típicas aquelas exercidas com o objetivo de tutelar direitos titularizados por hipossuficientes econômicos. Sempre que a atividade funcional da Defensoria Pública restar direcionada para a defesa dos interesses das pessoas desprovidas de recursos financeiros, estaremos diante de uma função estritamente típica. A interpretação literal do termo “necessitados” (art. 134 da CRFB), em conjugação com a expressão “insuficiência de recursos” (art. 5º, LXXIV, da CRFB) revela a função constitucional típica da Defensoria Pública, voltada para aqueles que não possuem condições econômicas de arcar com o pagamento das despesas necessárias ao pleno e adequado acesso à justiça.

Além da análise do perfil socioeconômico, é mister registrar que a hipossuficiência não se resume tão somente a esse aspecto. Há determinados casos em que a hipossuficiência deriva diante de uma relação jurídica. Cite-se, a título ilustrativo, o exemplo da defesa em processo penal, em que o acusado está em posição de vulnerabilidade frente à acusação. Emerge, assim, a denominada vulnerabilidade sob o enfoque da hipossuficiência jurídica.

A doutrina de vanguarda, além disso, enuncia a existência da hipossuficiência organizacional para albergar todos aqueles que são socialmente vulneráveis: os consumidores, os usuários de serviços públicos, os usuários de planos de saúde, os que queiram implementar ou contestar políticas públicas, como as atinentes à saúde, à moradia, ao saneamento básico, ao meio ambiente etc. É no campo da hipossuficiência organizacional que a Defensoria Pública deflagra as ações coletivas.

Em suma, serão funções atípicas todas aquelas que não se relacionarem com a deficitária condição econômica do sujeito, sendo desempenhadas pela Defensoria Pública independentemente da verificação da hipossuficiência do destinatário. Nesses casos, o fator econômico é irrelevante para que a Defensoria Pública possa exercer regularmente suas funções, bastando apenas que a hipótese legal de intervenção institucional esteja configurada. Com a entrega dessas funções à Defensoria Pública, o legislador pretendeu preservar o equilíbrio do sistema processual e garantir a tutela daqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade jurídica ou de fragilidade organizacional. Por isso, ao desempenhar as funções atípicas, mais do que representar pessoas, a Defensoria Pública atua defendendo valores.

Em outras palavras:

a-) A atribuição tradicional (função típica) está fundada no paradigma do individualismo, a qual compreende as atribuições ligadas “à carência/hipossuficiência econômica (equiparada a carência ‘jurídica’ da Lei n. 1.060/50)”.

b-) Já as atribuições “não tradicionais” (função atípica) se fundamentam no paradigma solidarista, estando ou não ligadas à carência/hipossuficiência econômica. São exemplos:

  • i-) atribuições nas quais se tem, concomitantemente, a proteção de pessoas carentes e não carentes, como acontece em uma ação civil pública relativa a direitos difusos;
  • ii-) atribuições que beneficiam de forma nominal pessoas não necessariamente carentes, repercutindo porém a favor de pessoas carentes, como, por exemplo, a representação judicial de um casal abastado que visa à adoção de uma criança internada;
  • iii-) atribuições direcionadas a sujeitos protegidos especialmente pela ordem jurídica, possuidores de outras carências que não a econômica, a exemplo de um portador de deficiência; e
  • iv-) atribuições em favor primacialmente de valores relevantes do ordenamento, como a da defesa do réu sem advogado na área criminal e da curadoria especial na área cível.

Além dessa tríade (hipossuficiência econômica, jurídica e organizacional), ALUÍSIO IUNES MONTI RUGGERI RÉ já reconhece uma quarta vertente da hipossuficiência/necessidade – a hipossuficiência circunstancial:

“A partir dessa dinâmica, o mero conceito de necessitado socio-econômico deixou, há muito, de ser suficiente para justificar a intervenção da Defensoria Pública, sendo indispensável a expansão para os campos organizacional e circunstancial. De fato, considerando a ampliação das suas funções institucionais, acrescentamos a situação dos “necessitados circunstanciais” (vulnerabilidade circunstancial) que, independentemente das condições econômicas que ostentam, ou suas famílias, por circunstâncias fáticas, geralmente provisórias, estão impedidos de custear os serviços de advocacia privada ou ainda de acessar tais serviços, em estado de violação de direitos humanos mínimos”

Em suma:

a-) Função típica (atribuição tradicional): ligada à hipossuficiência/vulnerabilidade econômica/financeira;

b-) Função atípica (atribuição não tradicional): ligada à hipossuficiência/vulnerabilidade organizacional, jurídica e circunstancial.

Beleza?

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Despeço-me desejando excelentes e prazerosas horas de estudo!

João Paulo Cachate, Defensor Público Federal, Mediador do GEDPU e Professor da EBEJI

Fontes fundamentais para elaboração desse artigo:

Adriana Fagundes Burger, Patrícia Kettermanm e Sérgio Sales Pereira Lima (organização). Defensoria Pública: O reconhecimento constitucional de uma metagarantia. ENADEP e ANADEP (livro digital), em especial as páginas 14/36 e 176/247.

LIMA, Frederico Rodrigues Viana de. Defensoria Pública. 4ª Edição. Editora Juspodivm, 2015.

RÉ, Aluísio Iunes Monti Ruggeri. Manual do Defensor Público – Teoria e Prática. 3ª edição. Editora Juspodivm, 2016.

Roger, Franklin. Princípios institucionais da defensoria pública : De acordo com a EC 74/2013 (Defensoria Pública da União) / Franklin Roger, Diogo Esteves. – Rio de Janeiro : Forense, 2014

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