Crime contra Sociedade de Economia Mista: Competência na Justiça Federal?

Prezados,

O tema da postagem de hoje é bastante polêmico e, tenho certeza, será objeto de indagação nas provas de processo penal dos concursos públicos de 2015, uma vez que reflete inovação casuística em um tema até então pacífico na doutrina e na jurisprudência dos Tribunais Superiores.

Consoante sempre alertamos em nossas aulas, para uma compreensão das hipóteses de competência da Justiça Federal e, de maneira residual, Estadual, a leitura do artigo 109 da Constituição se revela imprescindível. Nesse cenário, convém colacionar especialmente o inciso IV do referido normativo, vejamos:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: IV – os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

Sempre prevaleceu o entendimento de que houve, no inciso supratranscrito, verdadeiro “silêncio eloquente” no que tange às sociedades de economia mista, razão pela qual, a partir da ausência de previsão constitucional, os crimes contra elas (em detrimento aos bens, serviços e interesses) cometidos não se sujeitariam à competência da Justiça Federal, ainda que se tratasse de S.E.M. federal!

Confirmando esse entendimento, interessante trazer à baila os verbetes sumulados do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal:

Súmula 42 do STJ –  Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar as causas cíveis em que é parte sociedade de economia mista e os crimes praticados em seu detrimento.

Súmula nº 556 do STF – É competente a justiça comum para julgar as causas em que é parte sociedade de economia mista.

Apesar do entendimento pacificado exposto acima, em nossas aulas, desde 2012, chamávamos a atenção ao julgamento da 1ª Turma do STF do AgR. RE 614.115, que se encontrava suspenso em razão de um pedido de vista da Ministra Carmen Lúcia. Nesse julgado, o que se discutia era a competência da Justiça Federal ou Estadual para a apreciação de crime perpetrado contra o interesse da Sociedade de Economia Mista Companhia Docas do Pará.

Naquela ocasião, em decisão monocrática, o Ministro Dias Toffoli havia assinalado a competência da Justiça Federal e, o julgamento do agravo regimental interposto contra tal decisão, encontrava-se como 2 votos a favor (Toffoli e Rosa Weber) e 2 votos contrários (Luiz Fux e Marco Aurélio), até o mencionado pedido de vista!

Após mais de 2 anos de julgamento suspenso, finalmente a Ministra Carmem Lúcia liberou seu voto e acompanhou o Relator para asseverar a competência da Justiça Federal, não obstante se tratar de crime praticado contra interesse de Sociedade de Economia Mista. Assim foi publicado no recente Informativo 759 do STF:

Competência: sociedade de economia mista e ação penal – 3

Compete à justiça federal processar e julgar ação penal referente a crime cometido contra sociedade de economia mista, quando demonstrado o interesse jurídico da União. Esse o entendimento da 1ª Turma, que, em conclusão de julgamento e por maioria, desproveu agravo regimental para acolher recurso extraordinário no qual se discutia a justiça competente para apreciar causa em que figurava como parte a sociedade de economia mista Companhia Docas do Pará — v. Informativo 661. A Turma consignou que a mencionada companhia, cuja maior parcela de seu capital seria composta por verba pública federal, teria por ofício administrar e explorar as instalações portuárias do Estado do Pará, atividades exclusivamente atribuídas à União, conforme o disposto no art. 21, XII, f, da CF. Asseverou que, em princípio, os crimes praticados contra sociedade de economia mista, em geral, não se submeteriam à competência da justiça federal. (…) RE 614115 AgR/PA, rel. Min. Dias Toffoli, 16.9.2014. (RE-614115).

Naturalmente, não se pode dizer que o entendimento atual passou a ser de que a Justiça Federal terá competência para julgar crimes perpetrados por Sociedade de Economia Mista federal! NÃO! Até porque a decisão foi bastante casuística e peculiar, haja vista se tratar a Companhia Docas do Pará de uma SEM cuja maior parte do capital é composta de verba pública federal e ter por atribuição administrar e explorar instalações portuárias (exclusividade da União de acordo com o artigo 21, XII, f , da CF), fato esse que, de acordo com o STF, envolveria “diferenciado e peculiar interesse da União”, apto a justificar a competência da Justiça Federal.

As Súmulas 42 do STJ e 556 do STF permanecem plenamente em vigor, mas já não mais podemos dizer que é absoluta a afirmação de que os crimes praticados em face de sociedade de economia mista desafiarão a competência do juízo estadual! Muita atenção, pois isso SERÁ questão de prova em 2015!

Vamos em frente!

Grande abraço,

Pedro Coelho – Defensor Público Federal.

Obs: Se dúvidas houver sobre o tema ou sobre o processo penal, comentem na página da EBEJI ou diretamente no meu FB https://www.facebook.com/pedro.pmcoelho.

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