O Tribunal de Contas da União é o órgão constitucionalmente competente para, dentre outras, julgar as contas dos gestores de recursos públicos federais e aplicar-lhes as penalidades eventualmente cabíveis, nos precisos termos dos incisos II e VIII do art. 71 da Constituição Federal, in verbis:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:

(…)

II – julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;

(…)

VIII – aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário;

Quando no exercício desta competência de apuração do alcance dos responsáveis pelos dinheiros públicos, o Tribunal de Contas da União pratica ato insusceptível de revisão na via judicial, a não ser quanto ao seu aspecto formal ou quanto a existência de ilegalidades manifestas.

Com efeito, as decisões do Tribunal de Contas da União têm natureza jurídica de decisão técnico-administrativa e não são susceptíveis de modificação irrestrita pelo Poder Judiciário, cuja competência limita-se, como dito, aos aspectos formais ou às ilegalidades manifestas dessas decisões.

Em importante lição trazida por Rodolfo de Camargo Mancuso, remarca-se que a atuação do Poder Judiciário deve cingir-se às balizas da legalidade e da observância das garantias constitucionais por parte do Tribunal de Contas da União, sem, contudo adentrar no mérito da apreciação empreendida pela Corte de Contas, sob pena de transformá-la em mera instância formal:

Dado que nem mesmo a lei pode excluir do Poder Judiciário a apreciação de lesão ou ameaça a direito (CF, art. 5º, XXXV), e tendo presente, por outro lado, que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos órgãos públicos será exercida pelo Legislativo, com auxílio dos Tribunais de Contas (CF, art. 70 e 71) daí deflui que, se a decisão do Tribunal de Contas não extrapola esses lindes, ela é soberana e imune ao reexame pelo Poder Judiciário. Nem poderia ser de outra forma, caso contrário, teríamos o juiz togado substituindo, pelos seus, os critérios do juiz de contas, em evidente invasão de competência.

(in Ação Popular, 4. ed. Ed. Revista dos Tribunais, 2001, p. 111/112)

É este o entendimento do Supremo Tribunal Federal (RE 55821/PR), no sentido de que os atos da citada Corte de Contas sujeitam-se ao controle jurisdicional, apenas, nos casos de ocorrência de irregularidade formal grave ou manifesta ilegalidade, em obediência ao princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional, insculpido no art. 5°, inciso XXXV, da Carta Magna, hipóteses em que a natureza da decisão do Poder Judiciário é rescindente, mas não substitutiva, porquanto a Constituição Federal reservou somente ao TCU a competência para o julgamento dos processos de contas.

Sendo assim, somente nas hipóteses de irregularidade formal grave ou manifesta ilegalidade é que poderá o Poder Judiciário desconstituir a decisão do TCU que julga as contas dos gestores de recursos públicos federais.

Petrov Baltar, Advogado da União.