Olá queridos alunos e alunas da Ebeji! Vamos falar de direito de consumidor novamente?

Hoje o tema é vício do produto e o respectivo regime jurídico de proteção ao consumidor.

Como já tratamos no post sobre teoria da qualidade (o qual recomendo a releitura, para consolidar a compreensão – https://blog.ebeji.com.br/o-que-e-a-teoria-da-qualidade-no-direito-do-consumidor/), o direito do consumidor se preocupa, basicamente, com duas órbitas distintas de proteção, quais sejam, a incolumidade físico-psíquica do consumidor e a incolumidade econômica.

A primeira relacionada ao fato do produto ou serviço (arts. 12 a 14), e a segunda relacionada aos vícios do produto ou serviço (art. 18 a 25), que diz respeito ao que vamos abordar hoje.

 Os bens de consumo devem estar cobertos por duas espécies de garantias básicas, quais sejam, contra vícios de qualidade e vícios de quantidade. No que diz respeito aos vícios de qualidade como gênero amplo, esses podem ser vícios de qualidade por insegurança, relacionados ao fato do produto ou serviço, ou vícios de qualidade por inadequação, relacionados ao vício do produto. É dessa última espécie que vamos tratar.

Tais vícios por inadequação estão regulados a partir do art. 18 do CDC, que prevê o seguinte:

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

§1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:

 I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;

 II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III – o abatimento proporcional do preço.

[…]

§3° O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1° deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.

Pelo dispositivo em comento, notadamente a primeira parte do §1o, percebe-se que em caso de vício do produto (de qualidade por inadequação, relacionado a incidentes de consumo), o fornecedor terá o prazo de 30 dias para saná-lo.

Todavia, o consumidor pode, nas hipóteses elencadas no §3o, exigir imediatamente e à sua escolha uma das três opções elencadas primeiramente nos incisos I, II e III do §1o.

No entanto, em recente julgado do STJ veiculado no informativo 598, assentou-se a possibilidade de o fornecedor conceder o prazo de 3 dias para a troca de produto defeituoso:

Troca de mercadoria. Prazo em benefício do consumidor. Art. 18, § 1º, do CDC. Observância. É legal a conduta de fornecedor que concede apenas 3 (três) dias para troca de produtos defeituosos, a contar da emissão da nota fiscal, e impõe ao consumidor, após tal prazo, a procura de assistência técnica credenciada pelo fabricante para que realize a análise quanto à existência do vício. Incialmente, cumpre salientar que não há no CDC norma cogente que confira ao consumidor um direito potestativo de ter o produto trocado antes do prazo legal de 30 (trinta) dias. A troca imediata do produto viciado, portanto, embora prática sempre recomendável, não é imposta ao fornecedor. O prazo de 3 (três) dias para a troca da mercadoria é um plus oferecido pela empresa, um benefício concedido ao consumidor diligente, que, porém, não é obrigatório. Ademais, verifica-se que essa política de troca não exclui a possibilidade de o consumidor realizar a troca, na forma do art. 18 do CDC. Registre-se que o STJ, quando do julgamento do REsp 1.411.136-RS (DJe 10/3/2015), no qual se discutiu acerca da responsabilidade do comerciante quanto à sua obrigação de interceder perante a assistência técnica em favor do consumidor, concluiu que, “disponibilizado serviço de assistência técnica, de forma eficaz, efetiva e eficiente, na mesma localidade do estabelecimento do comerciante, a intermediação do serviço apenas acarretaria delongas e acréscimo de custos”. Ademais, de acordo com a legislação pátria, que deve ser aplicada à espécie, incumbe à empresa fornecedora, observados os prazos do art. 26 do CDC, cumprir o mandamento constante do artigo 18, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, o qual prescreve que se o vício do produto não for sanado no prazo máximo de 30 (trinta) dias pelo fornecedor, o consumidor poderá exigir, alternativamente e ao seu arbítrio, as seguintes opções: a) substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; b) a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos, ou c) o abatimento proporcional do preço. A exegese do artigo é clara: constatado o defeito, concede-se primeiro a oportunidade de sanar-se o vício no prazo máximo de 30 (trinta) dias, sendo certo que a assistência técnica possui melhores condições para buscar a reparação do vício. (REsp 1.459.555-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 14/2/2017, DJe 20/2/2017.).

Numa análise preliminar apressada, o entendimento esposado pelo STJ parece conflitar com os dispositivos consumeristas, mas não é o caso. Explico.

As normas protetivas do CDC determinam que, verificado o vício do produto, o consumidor deverá acionar o fornecedor, que terá o prazo de 30 dias para saná-lo. É o que se extrai do §1o do art. 18. Percebe-se, portanto, que a oportunidade de reparar o produto e resolver o vício é um direito do fornecedor.

No entanto, caso o reparo comprometa a qualidade ou características do produto, diminua-lhe o valor ou se trate de produto essencial (aferível mediante as circunstâncias concretas), o consumidor poderá se valer imediatamente das opções legais de substituição do bem, restituição do valor pago ou abatimento do preço. É dizer, nestas hipóteses, não terá o fornecedor o prazo de 30 dias para reparar.

Assim, se o fornecedor, ao vender o produto, concede o prazo de 3 dias após a emissão da nota fiscal para a imediata troca em caso de defeito, tal conduta, em verdade, valoriza e reforça os direitos e garantias do consumidor. Neste caso, o que se tem é que o fornecedor não é obrigado a, de pronto, efetuar a substituição. Em verdade, teria ele o direito de, no prazo de 30 dias, tentar sanar o vício. A troca imediata é apenas garantida nas situações do §3o, de produto essencial ou comprometimento de qualidade ou diminuição de valor do bem.

Assim, ao conceder ao consumidor o direito de, aparecendo defeito no prazo de 3 dias após a compra com emissão do documento fiscal, efetuar imediatamente a troca do produto, sem que haja análise do vício que o acomete, o fornecedor está, em verdade, atuando em prol do consumidor, assegurando os direitos garantidos pelo CDC. Após esse prazo, o consumidor deverá procurar a assistência técnica para que ela, então, realize a tentativa de reparo conforme autorizado pela lei.

Repise-se, portanto, que a troca imediata do produto viciado não é norma cogente constante do CDC, sendo necessário que, para tanto, esteja pressente uma das situações elencadas no §3o do art. 18.

O julgado é interessante porque numa análise superficial, parece contrariar o sistema de proteção consumerista. Daí a importância de entender a sistemática e o regime jurídico da responsabilidade civil no âmbito dos vícios do produto/serviço, para compreender que o que há no caso examinado é o reforço e a prevalência do direito do consumidor.

Bons estudos e até semana que vem!