Pedro Coelho é Defensor Público Federal

Professor da EBEJI

Prezados leitores do blog,

Tudo bem? Hoje irei escrever algumas considerações sobre interessante decisão veiculada no informativo de jurisprudência 575 do Superior Tribunal de Justiça, da lavra da sua 6ª Turma. São questões afetas aos efeitos na capitulação e dosimetria da pena envolvendo o chamado homicídio mercenário.

O que é homicídio mercenário? Nada mais é do que a conduta de ceifar a vida de outrem tendo a referida ação como motivação o recebimento de paga ou promessa de recompensa. Esse agir revela a tipificação de um crime de homicídio qualificado por motivo torpe (art. 121, parágrafo 2º, I do CPB).

O homicídio qualificado pelo motivo torpe consistente na paga ou na promessa de recompensa é um exemplar de delito de concurso necessário, uma vez que, necessariamente, de um lado, tem-se a figura do mandante, aquele que oferece a recompensa, e, de outro, há a figura do executor do delito, aquele que aceita a promessa de recompensa.

Compreendida a ideia do homicídio mercenário como um homicídio qualificado, imagine-se, agora, o seguinte exemplo. João, pai de Maria, contratou Antônio para matar José, que dias antes havia estuprado Maria. Para tanto, João prometeu pagar a importância de R$ 5.000,00 para Antônio, que veio efetivamente a retirar a vida de José.

Considerando a situação narrada, inexoravelmente se pode dizer que Antônio responderá criminalmente pelo homicídio qualificado (mercenário). A dúvida que se deve analisar é, ainda que haja um crime de concurso necessário, João, pai de Maria, que pagou para Antônio matar José também responderá pela qualificadora?

Em outras palavras, o reconhecimento da qualificadora da “paga ou promessa de recompensa” em relação ao executor do crime de homicídio mercenário qualifica ou não, de maneira automática, a conduta em relação ao mandante?

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.209.852-PR, asseverou que nem sempre a motivação do mandante será abjeta, desprezível ou repugnante, como ocorre nos homicídios privilegiados, em que o mandante, por relevante valor moral, contrata pistoleiro para matar o estuprador de sua filha.

Conforme destacado pelo Relator, Ministro Rogerio Schietti Cruz, o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça é de que a circunstância ligada à motivação do crime, consistente na paga ou na promessa de recompensa, não é elementar do crime – por se tratar de elemento acidental e não integrar o tipo básico ou fundamental do delito previsto no art. 121,caput, do Código Penal – e, portanto, cuidando-se de circunstância de caráter pessoal, não se comunica aos coautores do homicídio.

Ainda que se trate a “paga ou a promessa de recompensa” de circunstância acidental do delito de homicídio, de caráter pessoal e, portanto, incomunicável automaticamente aos coautores do homicídio, não há óbice que tal circunstância se comunique entre o mandante e o executor do crime, mas isso não ocorrerá de maneira automática, segundo o entendimento da Corte.

Pode, pois, o mandante responder por homicídio qualificado, caso o motivo que o tenha levado a empreitar o óbito alheio seja torpe, desprezível ou repugnante, como ocorre, por exemplo, na hipótese em que o mandante prometa recompensa ao executor, a fim de, com a morte da vítima, poder usufruir vantagens específicas advindas dessa morte.

Conclusão: De acordo com a 6ª Turma do STJ, em julgado recente, apesar de o reconhecimento da qualificadora da “paga ou promessa de recompensa” (inciso I do § 2º do art. 121) em relação ao executor do crime de homicídio mercenário NÃO PODER QUALIFICAR IMEDIATAMENTE o delito em relação ao mandante, por se tratar de circunstância acidental do delito de homicídio, de caráter pessoal, excepcionalmente, é sim possível a incidência no referido dispositivo caso o motivo que o tenha levado a empreitar o óbito alheio seja torpe[1].

Espero que tenham gostado! Atenção a esse importante precedente!

Vamos em frente!

[1] PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. JÚRI. MOTIVO TORPE. PAGA OU PROMESSA DE RECOMPENSA. CIRCUNSTÂNCIA SUBJETIVA. MANDANTE. COMUNICABILIDADE. ANÁLISE CASUÍSTICA. RECURSO PROVIDO. 1. Não obstante a paga ou a promessa de recompensa seja circunstância acidental do delito de homicídio, de caráter pessoal e, portanto, incomunicável automaticamente a coautores do homicídio, não há óbice a que tal circunstância se comunique entre o mandante e o executor do crime, caso o motivo que levou o mandante a empreitar o óbito alheio seja torpe, desprezível ou repugnante. 2. Na espécie, o recorrido teria prometido recompensa ao executor, a fim de, com a morte da vítima, poder usufruir vantagens no cargo que exercia na Prefeitura Municipal de Fênix. 3. Recurso especial provido, para reconhecer as apontadas violações dos arts. 30 e 121, § 2º, I, ambos do Código Penal, e restaurar a decisão de pronúncia, restabelecendo a qualificadora do motivo torpe, a fim de que o réu seja submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, pela prática do delito previsto no art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal.

(REsp 1209852/PR, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 02/02/2016)

Grande abraço,

Pedro Coelho – Defensor Público Federal

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