Daniela CarvalhoProcuradora Federal

Aprovada na 10a colocação no concurso da AGU em 2013

EBEJI

Boa tarde, amigos! Notícia Publicada na página oficial da AGU dá destaque aos requisitos do benefício de prestação continuada. Vamos conferir e relembrar o benefício?

O benefício de prestação continuada previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, é devido à pessoa portadora de deficiência ou ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais e que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Assim, para a obtenção do benefício objeto da presente demanda, é necessária a comprovação pela parte autora de dois requisitos cumulativos:

  • 1) incapacidade para a vida independente e para o trabalho e
  • 2) renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo vigente.

Quanto a este último critério, ressalto que o STF julgou-o inicialmente constitucional, contudo, em sede de Reclamação, a Corte Suprema reviu seu próprio posicionamento, reconhecendo a inconstitucionalidade superveniente do dispositivo, vejamos:

“Rcl – 4374

Aduziu-se ser possível que o STF, via julgamento da presente reclamação, pudesse revisar o que decidido na ADI 1232/DF e exercer nova compreensão sobre a constitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93. Obtemperou-se que, hodiernamente, o STF disporia de técnicas diversificadas de decisão para enfrentar problemas de omissão inconstitucional. Se fosse julgada hoje, a norma questionada na ADI 1232/DF poderia ter interpretação diversa, sem necessidade de se adotar posturas de autocontenção por parte da Corte, como ocorrera naquele caso. Frisou-se que, no atual contexto de significativas mudanças econômico-sociais, as legislações em matéria de benefícios previdenciários e assistenciais teriam trazido critérios econômicos mais generosos, com consequente aumento do valor padrão da renda familiar per capita. Consignou-se a inconstitucionalidade superveniente do próprio critério definido pelo § 3º do art. 20 da Loas. Tratar-se-ia de inconstitucionalidade resultante de processo de inconstitucionalização em face de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado). Pontuou-se a necessidade de se legislar a matéria de forma a compor um sistema consistente e coerente, a fim de se evitar incongruências na concessão de benefícios, cuja consequência mais óbvia seria o tratamento anti-isonômico entre os diversos beneficiários das políticas governamentais de assistência social. Vencido o Min. Teori Zavascki, que julgava o pleito procedente. Sublinhava que a decisão proferida na ADI teria eficácia erga omnes e efeitos vinculantes. Considerava que, ao se mudar o quanto decidido, estar-se-ia a operar sua rescisão. Ponderava não caber, em reclamação, fazer juízo sobre o acerto ou o desacerto das decisões tomadas como parâmetro. Arrematava que, ao se concluir sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade em âmbito de reclamação, atuar-se-ia em controle abstrato de constitucionalidade. Vencidos, ainda, os Ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa, Presidente, que não conheciam da reclamação. Rcl 4374/PE, rel. Min. Gilmar Mendes, 18.4.2013. (Rcl-4374)”

Ainda que o STF tenha decidido pela inconstitucionalidade do critério da renda per capita de até ¼ do salário mínimo em cada núcleo familiar, a miserabilidade é requisito previsto no próprio texto da Constituição, e que não pode ser afastado. Isto por ser um benefício assistencial, e não previdenciário. Ou seja, não existem contribuições previdenciárias hábeis a custeá-lo. Logo, deve ser considerado excepcional e pago tão somente a quem realmente lhe faça jus, sob pena de agravar o déficit do Tesouro.

É preciso entender a Previdência como um sistema contributivo, que só se mantém em razão do equilíbrio atuarial. A assistência social, ao contrário da Previdência, não é um sistema contributivo. Não há contraprestação paga pelo beneficiário da assistência social. Logo, pelo fato de o custeio não decorrer de sistema contraprestacional, impõe-se uma rígida análise de seus requisitos por parte do Poder Público e, do Poder Judiciário, nas ações em que o mesmo é pleiteado.

Torna-se oportuno lembrar que, em situações como esta, deve-se ter em mente que a prestação sob análise possui caráter excepcional, já que o Estado somente custeará o deficiente e o idoso se a família não dispuser de meios para fazê-lo. O dever primário de prover o idoso e o deficiente é da família, vejamos o artigo 203, V da Constituição:

“V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”

Assim, aquele idoso ou deficiente que puder ser mantido por sua família, ainda que sem luxo, não faz jus ao benefício. A prestação continuada não é complementação de renda. Vejamos um trecho de uma sentença muito didática do Magistrado Dr. Luciano Beltran, no uso da competência delegada, em caso concreto reexaminado pelo TRF da 3ª região:

“No que toca ao laudo social, embora este seja favorável à autora, quanto à renda per capita, nota-se que a situação não autoriza a procedência da ação. É que seus filhos com idades de 23, 22 e 17 anos, os quais integram seu núcleo familiar, estão atualmente desempregados, por motivos desconhecidos, embora se encontrem em idade economicamente ativa. Ou seja, podem perfeitamente trabalhar e auxiliar no sustento do lar, mormente pelos parcos rendimentos auferidos pelo marido da autora. Não se pode dizer, assim, que a autora não tem condições de ter sua subsistência provida por sua família! Desculpe. Não se está aqui a desmerecer a situação da autora, vive com dificuldade, é certo. Apenas estou a tentar mostrar que ela vive como a maioria da população e não pode fazer uso do benefício assistencial. A situação envolvendo seu filhos chama a atenção! Assim a autora não possui condições de manter seu próprio sustento, contudo, sua família possui. Se a ela for dado algum benefício, nesse momento, a meu alvedrio o instituto estará subvertido, em detrimento de tantos outros que a ele fazem jus. 3. Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE A AÇÃO.Vencida, a requerente arcará com as custas e despesas processuais, mais honorários advocatícios de R$ 700,00, com fundamento no art. 20, § 4º, do CPC, observada a Lei nº. 1.060/50. – Autos número: 0007933-54.2012.8.26.0438

A conclusão a que chegamos é que o benefício de prestação continuada não deve ser deferido a toda e qualquer pessoa humilde, mas, tão somente aqueles idosos ou deficientes que forem miseráveis de fato, e não puderem manter-se ou contar com o auxílio de familiares. Um desses casos, ganhou destaque na página da AGU esta semana, vamos ver a íntegra da notícia?

“A Advocacia-Geral da União (AGU) demonstrou a validade de decisão administrativa do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que rejeitou pedido de pagamento de benefício assistencial a uma moradora de Itaueira (PI) cuja família não era miserável, como a lei exige para a concessão do auxílio. A atuação ocorreu após a mulher, inconformada com a rejeição da solicitação pela autarquia e com decisão de primeira instância que também negou o pedido, recorrer ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) para obter o benefício.

A autora alegou que deveria receber o benefício de prestação continuada, auxílio de um salário mínimo pago pelo INSS, porque tinha deficiência física que a incapacitava para o trabalho e pertencia a família miserável, que não possuía condições financeiras de sustentá-la.

Contudo, os procuradores federais que atuaram no caso destacaram que a norma que disciplina o pagamento do benefício, a Lei nº 8.742/1993 (Lei Orgânica de Assistência Social-Loas), deixa claro que, para ter direito ao auxílio, o segurado deve estar incapacitado para o trabalho de maneira permanente e pertencer a família cujo rendimento per capita seja inferior a um quarto do salário mínimo. De acordo com as unidades da AGU que atuaram no processo, como este não era o caso da autora da ação, não restou ao INSS nenhuma outra opção a não ser rejeitar o pedido, já que a administração pública é regida pelo princípio da legalidade, ou seja, é obrigada a observar o que está definido pela lei.

Os advogados públicos também afirmaram não ser possível alegar, como fizera a autora da ação, que ela pertencia a família pobre de acordo com critérios estabelecidos por outras leis, como a que criou o programa Bolsa-Família, para obter direito regulamentado por uma norma específica, como a Loas no caso analisado.

Por unanimidade, a 2ª Turma do TRF1 julgou improcedente o recurso e manteve a decisão de primeira instância negando o pedido de pagamento do benefício. O relator do caso no tribunal, desembargador federal Candido Moraes, destacou em seu voto que a autora mora com os pais, proprietário de serraria e professora estadual aposentada, além de dois irmãos maiores de idade e com renda mensal fixa. “O estudo socioeconômico não autoriza o enquadramento da situação da autora na condição de miserabilidade justificadora do deferimento do benefício assistencial em exame. Assim, inexistindo a prova da condição de miserabilidade, não há como retificar o comando sentencial da origem”, concluiu.

Atuaram no caso as procuradorias Federal Especializada Junto ao INSS no Piauí e Regional-Federal da 1ª Região.

Ref.: Processo nº 0061972-68.2011.401.9199/PI – 2ª Turma do TRF1.”

Bons estudos!!!

Daniella Carvalho, Procuradora Federal