O que é a promessa esponsalícia? Quais as consequências jurídicas desta promessa?
EBEJI
Olá alunas e alunos da Ebeji!
A promessa esponsalícia é o mesmo que esponsais ou promessa de casamento. Popularmente, são conhecidos como noivado, algo bastante tradicional na nossa sociedade, que significa tornar pública a intenção de casar. Nos dizeres de Cristiano Chaves de Farias e Nelson Roselvald (Curso de Direito Civil – Contratos, Ed. Jus Podium), a promessa esponsalícia “É o ato pelo qual as partes interessadas prometem, recíproca e livremente, casar e, para tanto, assumem obrigações recíprocas”. Essas obrigações são referentes aos próprios custos envolvidos no casamento, como a habilitação e aquisição de móveis ou imóveis.
Visto então como uma fase anterior ao casamento, os esponsais são considerados como pré-contrato? Não. A promessa de matrimônio não é nem contrato nem pré-contrato, segundo a doutrina, pois dela não decorrem nem efeitos pessoais nem patrimoniais no Direito de Família. É dizer, não cabe falar em parentesco por afinidade, em dever de fidelidade, coabitação e mútua assistência. Ademais, é preciso destacar que não se exige qualquer forma pública, instrumento para sua celebração ou fixação de prazo para que ocorra o casamento.
Em verdade, como bem pontua Luciano Chaves de Farias (Teoria do risco desautorizando a indenização por danos morais nos casos de ruptura de noivado e das relações matrimoniais), “por ser pautada em sentimentos, a relação de noivado pode sofrer as consequências das oscilações sentimentais típicas da sociedade humana”.
Assim, sendo passível de sofrer as consequências das oscilações sentimentais, é possível, então, que uma delas seja a ruptura da relação, isto é, o fim do noivado. Isto porque há, no caso, apenas uma promessa de evento futuro e incerto, que é o casamento, ao qual não está obrigado nenhum dos noivos.
De regra, esta ruptura, ainda que imotivada, não gera a responsabilidade civil. No entanto, é possível que, em determinadas hipóteses, exista a obrigação de indenizar pelos eventuais danos materiais ou morais advindos deste fim de relação. E quais são estas hipóteses? Para que exista a responsabilidade é imprescindível a ocorrência de um ato ilícito. Isto porque o Código Civil de 2002 não regula os esponsais e nem delimita sua existência ou obrigações decorrentes. Desta maneira, a única forma de estar caracterizada a responsabilidade é na existência de ilicitude em uma das figuras previstas nos arts. 186 (ato ilícito) ou 187 (ato ilícito na forma de abuso de direito) do CC, donde inexoravelmente decorrerá o dever de indenizar se presentes todos os elementos, a saber, conduta, dano e nexo causal.
A jurisprudência pátria se firma exatamente neste sentido, somo se pode perceber dos julgados abaixo colacionados de alguns Tribunais do país:
TJRJ
005216-81.2012.8.19.0206 – APELAÇÃO
Des(a). PAULO SÉRGIO PRESTES DOS SANTOS – Julgamento: 13/08/2014 – SEGUNDA CÂMARA CÍVEL
Apelação cível. Responsabilidade civil. Direito de Família. Rompimento de esponsais. Noiva que pretende reparação de danos morais e materiais sofridos após descoberta de que o pretendente já era casado. Ruptura de esponsais que, em regra, não enseja reparação, salvo prova do nos autos que houve má-fé por parte de um dos nubentes. Responsabilidade civil objetiva. Abuso do direito, à inteligência do art. 187 do CC. Ao agente não é dado atuar de modo excessivo ou violador do direito alheio. Violação da cláusula geral de boa-fé objetiva. Tutela da confiança. Dever jurídico de manutenção de um comportamento ético e coerente. Réu que, sabendo que não poderia se casar, confessa ter iludido noiva por falta de coragem de lhe contar a verdade. Comportamento contraditório (venire contra factum proprium). Precedentes. Poder de agir de outro modo que justifica o dever de indenizar. Dano moral fundado na quebra de confiança advinda do comportamento antiético e incoerente do consorte. Verba indenizatória que deve ser mantida. Dano material consistente na repercussão patrimonial do desenlace. Despesas suportadas pela nubente que devem ser ressarcidas, à luz das provas dos autos. Pedido contraposto que se rejeita. Sentença merece reparo no tocante aos danos materiais. Provimento parcial do recurso.
TJDFT
APC -Apelação Cível
Relator(a): FLAVIO ROSTIROLA
Processo: 20080510118190APC
CIVIL. ROMPIMENTO DE NOIVADO. ESPONSAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. ATO ILÍCITO. DIREITO À LIBERDADE E À AUTONOMIA DA VONTADE. BOA-FÉ OBJETIVA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. DEVERES DOS CÔNJUGES.
1. O ordenamento jurídico pátrio nada dispõe sobre os esponsais, incumbindo à teoria da responsabilidade civil regular eventuais conflitos que se atinam à promessa de casamento. 2. A análise da responsabilidade civil deve perpassar por três elementos: conduta comissiva ou omissiva de ato ilícito, dano e nexo causal. 3. A ruptura da promessa de casamento, por si só, não configura ato ilícito, pois consiste em expressão do direito fundamental à liberdade e à autonomia da vontade, conforme art. 1.514, 1.535 e 1.538 do Diploma Civil de 2002. 4. Porém, o direito à liberdade e à autonomia da vontade não configura o único bem jurídico contido na promessa de casamento, devendo ser ponderado, à luz do princípio da boa fé objetiva, com eventuais direitos patrimoniais e morais lesados em razão de seu exercício. 5. O dano material consiste na lesão concreta que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem. No caso vertente, presumidas a capacidade civil, a normalidade do estado psíquico e a boa-fé e de ambas as partes, que consentiram, com antecipação, em contrair matrimônio, que não ocorreu em razão de decisão do Apelado por motivo de mero desentendimento, inconteste o abuso do direito de liberdade e de autonomia da vontade, e, portanto, a ilicitude do ato do Apelado, conforme art. 187 do Diploma Civil de 2002. Logo, em razão do benefício que ambas as partes iriam obter da festa do casamento e do apartamento em que iriam residir, mister que as despesas referentes ao matrimônio, à sua celebração e à vida conjugal, no período em que houve consenso, sejam compartilhadas entre as partes, sob pena de enriquecimento ilícito do Apelado 6. O dano moral consiste na ofensa injusta de bens jurídicos extrapatrimoniais da pessoa, ou seja, aqueles de valor patrimonial não quantificável, mas valores outros tutelados juridicamente, o que enseja indenização. 7. Não restam dúvidas sobre o sentimento de dor e de humilhação da Apelada. No entanto, tais sentimentos não configuram dano moral, mas estados de espírito consequentes do dano, variáveis em cada pessoa. Fazem jus à indenização por danos morais aqueles que demonstrarem haverem sido privados de um bem jurídico sobre o qual teriam interesse reconhecido juridicamente. 8. Mesmo após reconhecidas outras entidades familiares, como a união estável, a legislação infraconstitucional confere ao casamento segurança jurídica distinta, o que é observado, verbi gratia, no que diz respeito à sucessão mortis causa. Essa a razão por que se exige maior formalidade e se impõem obrigações aos noivos/casados, desde a constituição da sociedade conjugal, devendo apresentar habilitação para o casamento, até sua dissolução, devendo obedecer a períodos mínimos de separação de fato e outros requisitos para o divórcio. Tamanha importância jurídica justifica-se por exigir-se, de ambas as partes, capazes, máxima vontade e certeza da decisão de contrair matrimônio, instituto que possui implicações em todos os âmbitos da vida de cada indivíduo, até mesmo antes de concretizar. 9. Deu-se parcial provimento ao apelo, para condenar, com fundamento no princípio da boa-fé objetiva, o Recorrido ao pagamento da metade das despesas realizadas para a celebração do casamento e o início da vida conjugal pela Apelante. Em razão da procedência parcial do pedido, condenou-se o Apelado ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, atentando-se para os preceitos da Lei nº 1.060/50. No restante, manteve-se incólume a r. sentença.
TJSP
0036240-42.2011.8.26.0506 Apelação / Indenização por Dano Material
Órgão julgador: 20ª Câmara Extraordinária de Direito Privado
Data do julgamento: 14/12/2016
RESPONSABILIDADE CIVIL INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS Danos que, segundo a inicial, decorrem do rompimento do noivado, pelo demandado, não obstante a proximidade do casamento. Decreto de improcedência. Casamento que sequer havia sido agendado. Imóvel adquirido unicamente pelo demandado. Ausência de prova (a cargo da autora produzir) no sentido de que teria efetuado pagamentos para essa aquisição. Recibos/notas fiscais relativas à aquisição de bens móveis que não autorizam a restituição de qualquer valor (eis que pagamentos feitos pela genitora da autora). Ausência de legitimidade desta última para postular a devolução de valores despendidos por terceira pessoa. Despesas com a festa de noivado que não geram direito a reembolso – Ausência ainda, de comprovação de que a autora tenha despendido qualquer valor nesse sentido. Faturas de cartão de crédito em nome de terceiros. Dano moral. Inocorrência – A ruptura de relacionamento não gera indenização a esse título, não demonstrada má-fé do apelado, tampouco situação vexatória à autora Precedentes – Sentença mantida Recurso improvido.
O que se tem, portanto, é que na existência de ilicitude no momento da ruptura do relacionamento e em decorrência do postulado da boa fé que tenha sido violado por um dos noivos, ainda que o término seja expressão do direito de liberdade, remanescerá a responsabilidade pelos danos apurados, sejam eles de ordem moral ou material. Logo, na ruptura em si, sem que dela não se sobressaia qualquer ato ilícito causador de um dano, não haverá que se falar em obrigação de indenizar.
Bons estudos e até a próxima!
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