Olá pessoal, tudo bem?

O post de hoje é especialmente relevante, pois se trata de uma das minhas “apostas” de temas centrais que serão questionados em fases mais avançadas de concursos públicos na matéria do direito processual penal! Se, desde 2014, a audiência de custódia era o “tema do momento”, a minha principal aposta (e já venho trabalhando isso com os nossos alunos) é exatamente a QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA. Conversando com um amigo aprovado no último exame oral para a magistratura federal do TRF 5ª Região, ele me relatou que a parte significativa dos candidatos não sabia do que se tratava quando foram arguidos!

Se você também não sabe, sem problemas! Vamos tentar compreender esse importantíssimo tema que, desde já é bom ressaltar, nada tem a ver com a audiência de custódia!

Cadeia de Custódia é o processo de documentar a história cronológica da evidência, esse processo visa a garantir o rastreamento das evidências utilizadas em processos judiciais, registrar quem teve acesso ou realizou o manuseio desta evidência. No que diz respeito à preservação das informações coletadas a cadeia de custódia possibilita documentar a cronologia das evidências, quem foram os responsáveis por seu manuseio, garantir a inviolabilidade do material, lacrar as evidências, restringir acesso, tudo isso visando à perda da confiança do elemento (com)probatório, seja em qual área for.

No processo penal, como não poderia deixar de ser, por envolver instrumento processual que pode culminar com a restrição da liberdade de locomoção do cidadão, o tema preservação das fontes de prova ganha ainda maior importância e, nesse contexto, a preservação da cadeia de custódia probatória segue mesma sorte. A sua preservação, em verdade, é erigida a verdadeira “condição de validade da prova”.

É fato que o Brasil não ostenta uma regulamentação normativa acerca da manutenção da cadeia de custódia probatória, mas nem por isso podemos afastar o dever e imprescindibilidade de sua higidez. A cadeia de custódia exige o estabelecimento de um procedimento regrado e estruturado previamente, documentando toda a cronologia existencial de determinada prova, viabilizando a diferida validação judicial.

Um dos principais expoentes doutrinários do processo penal, Geraldo Prado é, sem dúvidas, o ponto de destaque na vanguarda da análise da (quebra da) cadeia de custódia probatória dentro da persecução penal. O desembargador carioca aponta que o “rastreamento das fontes de prova será uma tarefa impossível se parcela dos elementos probatórios colhidos de forma encadeada vier a ser destruída. Sem esse rastreamento, a identificação do vínculo eventualmente existente entre uma prova aparentemente lícita e outra, anterior, ilícita, de que a primeira é derivada, dificilmente será revelado. Os suportes técnicos, pois, têm uma importância para o processo penal que transcende a simples condição de ferramentas de apoio à polícia para execução de ordens judiciais”[1].

Tudo bem, Pedro! Deu para entender que se trata de um tema doutrinário interessante e moderno. Mas isso não tem relevância em âmbito jurisprudencial nos Tribunais pátrios, correto? Não, ERRADO!

Esse tema é relevante para concurso público (tanto que foi cobrado na recente prova oral da  Magistratura Federal do TRF 5ª Região) exatamente porque já ostenta reflexos precisos e importantes em julgados do Superior Tribunal de Justiça! Vamos entender o problema versado no HC 160.662/RJ, julgado pela 6ª Turma do STJ em 18 de fevereiro de 2014, cuja relatoria foi atribuída à Ministra Assusete Magalhães!

No referido caso concreto, houve decretação judicial e legal de interceptação das comunicações telemáticas. Posteriormente, fora franqueado o acesso aos autos para a defesa, mas, no que tange às provas obtidas a partir da interceptação autorizada pelo juízo competente, parcela delas teria sido extraviada, inviabilizando o acesso à integralidade dos áudios captados, perfazendo registros descontínuos das conversas, além da omissão de determinados áudios.

Com base na evidente quebra da cadeia de custódia verificada, algumas conclusões podem ser extraídas do excelente voto da Ministra Relatora! Tomei o cuidado de selecionar e esquematizar as principais. Vejamos abaixo:

(a) Apesar de ter sido franqueado o acesso aos autos, parte das provas obtidas a partir da interceptação telemática foi extraviada, ainda na Polícia, e o conteúdo dos áudios telefônicos não foi disponibilizado da forma como captado, havendo descontinuidade nas conversas e na sua ordem, com omissão de alguns áudios.

(b) A prova produzida durante a interceptação não pode servir apenas aos interesses do órgão acusador, sendo imprescindível a preservação da sua integralidade, sem a qual se mostra inviabilizado o exercício da ampla defesa.

(c) Mostra-se lesiva ao direito à prova, corolário da ampla defesa e do contraditório – constitucionalmente garantidos -, a ausência da salvaguarda da integralidade do material colhido na investigação, repercutindo no próprio dever de garantia da paridade de armas das partes adversas.

(d) É certo que todo o material obtido por meio da interceptação telefônica deve ser dirigido à autoridade judiciária, a qual, juntamente com a acusação e a defesa, deve selecionar tudo o que interesse à prova, descartando-se, mediante o procedimento previsto no art. 9º, parágrafo único, da Lei 9.296/96, o que se mostrar impertinente ao objeto da interceptação, pelo que constitui constrangimento ilegal a seleção do material produzido nas interceptações autorizadas, realizada pela Polícia Judiciária, tal como ocorreu, subtraindo-se, do Juízo e das partes, o exame da pertinência das provas colhidas.

(e) Decorre da garantia da ampla defesa o direito do acusado à disponibilização da integralidade de mídia, contendo o inteiro teor dos áudios e diálogos interceptados.

Como bem assinalaram os professores Aury Lopes Jr e Alexandre de Morais da Rosa, o zelo e a justa ponderação e condicionamento de validação das provas e fontes de prova em face da higidez da cadeia de custódia se justifica para impedir a (triste, porém existente) manipulação indevida do arcabouço de convencimento, visando sempre à melhor decisão judicial. Avançando, afirmam ainda que “não se limita a perquirir a boa ou má-fé dos agentes policiais/estatais que manusearam a prova. Não se trata nem de presumir a boa-fé, nem a má-fé, mas sim de objetivamente definir um procedimento que garanta e acredite a prova independente da problemática em torno do elemento subjetivo do agente. A discussão acerca da subjetividade deve dar lugar a critérios objetivos, empiricamente comprováveis, que independam da prova de má-fé ou ‘bondade e lisura’ do agente estatal”[2].

O tema é novo, um pouco “carregado de doutrina”, mas é extremamente importante e, não tenham dúvidas, é o tema da moda no processo penal! Se não tiverem entendido, releiam, pois isso vai cair na sua prova!

Quaisquer dúvidas, estou à disposição através das redes sociais da Escola e da minha página no Facebook!

Vamos em frente! Grande abraço!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal

https://www.facebook.com/Profpedrocoelho/

[1] PRADO, Geraldo. Prova penal e sistema de controle epistêmicos: a quebra da cadeia de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. São Paulo. 2014, p.79;

[2] https://www.conjur.com.br/2015-jan-16/limite-penal-importancia-cadeia-custodia-prova-penal