Pedro Coelho é Defensor Público Federal
Professor da EBEJI
EBEJ
Prezados leitores,
Como de hábito, a cada final de semestre trago aqui no blog da EBEJI a coletânea dos principais julgados das matérias criminais, bem como breves resumos dos entendimentos relevantes exarados no âmbito do STF e STJ.
É de ciência de todos que a preparação dos estudantes, quando voltada aos concursos públicos, deve obedecer a tríade fundamental da lei, doutrina e jurisprudência atualizada, sobretudo nos certames mais disputados. Estar atualizado e atento às modificações das posições dos Tribunais Superiores sobre as diversas matérias é uma exigência cada vez mais frequente feita pelos examinadores.
Dessa maneira, resolvi separar os julgados que reputo mais importantes em âmbito criminal e, por consequência, com maior probabilidade de serem cobrados, dentre os publicados nos informativos do STJ e STF nesse 2ª semestre de 2015.
Em breve, publicarei aqui no blog a coletânea selecionada acerca dos principais julgados de processo penal, mas abaixo aponto os 14 principais entendimentos do Direito Penal que vocês devem revisar!
Aproveito e, após a indicação do julgado, apresento também uma apertada síntese das conclusões dos Tribunais e aponto peculiaridades importantes para a preparação especificamente voltada às provas! Espero que gostem. Vamos à lista:
(1) Princípio da insignificância: reincidência e crime qualificado – 6 – HC 123108/MG, rel. Min. Roberto Barroso, 3.8.2015. (HC-123108) HC 123533/SP, rel. Min. Roberto Barroso, 3.8.2015. (HC-123533) HC 123734/MG, rel. Min. Roberto Barroso, 3.8.2015. (HC-123734)
Plenário do STF – A incidência do princípio da insignificância deve ser feita caso a caso. No HC 123.108/MG, o paciente fora condenado à pena de um ano de reclusão e dez dias-multa pelo crime de furto simples de chinelo avaliado em R$ 16,00. No HC 123.533/SP, a paciente fora condenada pela prática de furto qualificado de dois sabonetes líquidos íntimos avaliados em R$ 40,00. Por fim, no HC 123.734/MG, o paciente fora sentenciado pelo furto de 15 bombons caseiros, avaliados em R$ 30,00. O Plenário decidiu a necessidade de verificação do caso concreto para aferir a presença ou não da insignificância em caso de reincidência e delito qualificado uma vez que negar a tipicidade de uma conduta, formal ou materialmente, é dizer que do ponto de vista penal ela é lícita. Desse modo, a aferição da insignificância como requisito negativo da tipicidade, mormente em se tratando de crimes contra o patrimônio, envolveria juízo muito mais abrangente do que a simples expressão do resultado da conduta. Importaria investigar o desvalor da ação criminosa em seu sentido amplo, traduzido pela ausência de periculosidade social, pela mínima ofensividade e pela ausência de reprovabilidade, de modo a impedir que, a pretexto da insignificância do resultado meramente material, acabasse desvirtuado o objetivo do legislador quando formulada a tipificação legal.
(2) Estelionato e extinção de punibilidade – RHC 126917/SP, rel. Min. Teori Zavascki, 25.8.2015. (RHC-126917)
2a Turma – A causa especial de extinção de punibilidade prevista no § 2º do art. 9º da Lei 10.684/2003, relativamente ao pagamento integral do crédito tributário, não se aplica ao delito de estelionato (CP, art. 171), razão pela qual o ressarcimento integral do dano causado à vítima do estelionato não implica extinção da punibilidade do agente!
(3) Maus antecedentes e período depurador – 2 – HC 126315/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 15.9.2015. (HC-126315)
2ª Turma – As condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos não poderão ser caracterizadas como maus antecedentes para efeito de fixação da pena, conforme previsão do art. 64, I, do CP. Asseverou-se que o período depurador de cinco anos teria a aptidão de nulificar a reincidência, de forma que não poderia mais influenciar no “quantum” de pena do réu e em nenhum de seus desdobramentos. Observou que seria assente que a “ratio legis” consistiria em apagar da vida do indivíduo os erros do passado, já que houvera o devido cumprimento de sua punição, de modo que seria inadmissível atribuir à condenação o “status” de perpetuidade, sob pena de violação aos princípios constitucionais e legais, sobretudo o da ressocialização da pena. Nessa perspectiva, por meio de cotejo das regras basilares de hermenêutica, constatar-se-ia que, se o objetivo primordial fosse o de se afastar a pena perpétua, reintegrando o apenado no seio da sociedade, com maior razão dever-se-ia aplicar esse raciocínio aos maus antecedentes.
(4) Substituição de pena e lesão corporal praticada em ambiente doméstico – HC 129446/MS, rel. Min. Teori Zavascki, 20.10.2015. (HC-129446)
2ª Turma – Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico (CP, art. 129, § 9º, na redação dada pela Lei 11.340/2006). A Turma destacou que a substituição da pena privativa de liberdade por sanções restritivas de direitos encontrar-se-ia condicionada ao preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos elencados no art. 44 do CP (“Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II – o réu não for reincidente em crime doloso; III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente”). Dessa maneira, percebe-se que se a conduta delitiva for efetivada, como no caso em tela, através de violência ou grave ameaça à pessoa, há impedimento legal ao benefício postulado.
(5) Tráfico de entorpecente e transposição de fronteira HC 122791/MS, rel. Min. Dias Toffoli, 17.11.2015. (HC-122791)
1ª Turma – De acordo com a 1ª Turma, a incidência da causa de aumento de pena prevista na Lei 11.343/2006 [“Art. 40. As penas previstas nos artigos 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se: (…) V – caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal”] não demanda a efetiva transposição da fronteira da unidade da Federação. É suficiente a reunião dos elementos que identificassem o tráfico interestadual, que se consumaria instantaneamente, sem depender de um resultado externo naturalístico. O fato de o réu ter sido preso dentro do mesmo estado em que adquirira a droga não é suficiente para afastar a aplicação da causa de aumento de pena em tela, sobretudo por haver provas robustas no sentido de apontar para a intenção de transpor a fronteira.
(6) DIREITO PENAL. REMIÇÃO DA PENA PELA LEITURA. HC 312.486-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 9/6/2015, Dje 22/6/2015.
6ª Turma – A atividade de leitura pode ser considerada para fins de remição de parte do tempo de execução da pena. Apesar do artigo 126 ou qualquer outra disposição da LEP não prever a leitura como modalidade apta a justificar a remição da pena (somente o trabalho e o estudo), a jurisprudência do STJ sempre caminhou nesse sentido, aplicando analogia em favor de reeducando (REsp 744.032-SP, Quinta Turma, DJe 5/6/2006). Diante da importância e da comprovada funcionalidade e eficácia da leitura no cumprimento dos objetivos ressocializadores e reintegradores da pena, a Justiça Federal e o Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça (Depen) assinaram a Portaria Conjunta 276, a qual disciplina o Projeto da Remição pela Leitura no Sistema Penitenciário Federal. E, em 26/11/2013, bem como fora editada, recentemente pelo CNJ, Recomendação 44, tratando das atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo e estabelecendo critérios para a admissão pela leitura.
(7) DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. DESNECESSIDADE DE DUPLA IMPUTAÇÃO EM CRIMES AMBIENTAIS. RMS 39.173-BA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 6/8/2015, DJe 13/8/2015.
5ª Turma – É possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome, ou seja, tal qual fora indicado anteriormente pelo STF (e pela 6ª Turma do STJ), não há mais que se falar em exigência e incidência da chamada Teoria da Dupla Imputação. É que o art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa (RE 548.181, Primeira Turma, DJe 29/10/2014).
(8) DIREITO PENAL. CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 918. REsp 1.480.881-PI, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 10/9/2015.
3ª Seção (Recurso Repetitivo) – Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos; o consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime. Conforme destacado ao longo do julgamento, não obstante a doutrina ainda se debruçar sobre discussões acerca da existência dicotômica de vulnerabilidade absoluta e vulnerabilidade relativa, o tipo penal do art. 217-A do CP não traz como elementar a expressão “vulnerável”, considerando como tal o menor de 14 anos, razão pela qual inviável resta a flexibilização desse critério objetivo desenhado pelo legislador pátrio.
(9) DIREITO PENAL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE INDEPENDENTEMENTE DO ADIMPLEMENTO DA PENA DE MULTA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 931. REsp 1.519.777-SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 10/9/2015.
3ª Seção (Recurso Repetitivo) – Nos casos em que haja condenação a pena privativa de liberdade e multa, cumprida a primeira (ou a restritiva de direitos que eventualmente a tenha substituído), o inadimplemento da sanção pecuniária não obsta o reconhecimento da extinção da punibilidade. É que, diante da redação conferida ao artigo 51 do CPB pela Lei 9.268/96, a pena de multa não mais possui o condão de constranger o direito à locomoção do sentenciado. Entendimento oposto, ou seja, a possibilidade de constrição da liberdade daquele que é apenado somente em razão de sanção pecuniária, consistiria em legitimação da prisão por dívida, em afronta, portanto, ao disposto no art. 5º, LXVII, da CF e, ainda, no art. 7º, 7, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). Após a alteração legislativa que considerou a pena de multa como dívida de valor, deve-se assinalar também a alteração da competência para a execução da sanção, exclusiva, então, da Fazenda Pública, conforme disposto no enunciado da Súmula 521 do STJ: “A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Fazenda Pública“.
(10) DIREITO PENAL. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL DO CRIME PREVISTO NO ART. 2º, I, DA LEI 8.137/1990. RHC 36.024-ES, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/8/2015, DJe 1º/9/2015.
5ª Turma – O termo inicial do prazo prescricional da pretensão punitiva do crime previsto no art. 2º, I, da Lei 8.137/1990 (“fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo“) é a data em que a fraude é perpetrada, e não a data em que ela é descoberta. Tratando-se de crime formal e instantâneo, o mero emprego da fraude visando a eximir-se do pagamento de tributo é suficiente para a consumação do delito. O fato de a fraude ter sido empregada em momento determinado, ainda que irradie efeitos até ser descoberta, não revela conduta permanente, mas sim, crime instantâneo de efeitos permanentes – os quais perduraram até a descoberta do engodo.
(11) DIREITO PENAL. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. HC 328.021-SC, Rel. Min. Leopoldo de Arruda Raposo (Desembargador convocado do TJ-PE), julgado em 3/9/2015, DJe 15/9/2015.
5ª Turma – O fato de o denunciado por furto qualificado pelo rompimento de obstáculo ter confessado a subtração do bem, apesar de ter negado o arrombamento, é circunstância suficiente para a incidência da atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, do CP). De acordo com a jurisprudência consagrada no STJ, mesmo que o agente tenha confessado parcialmente os fatos narrados na exordial acusatória, deve ser beneficiado com a atenuante genérica da confissão espontânea.
(12) DIREITO PENAL. NÃO INCIDÊNCIA DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. HC 301.063-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 3/9/2015, DJe 18/9/2015.
5ª Turma – O fato de o denunciado por roubo ter confessado a subtração do bem, negando, porém, o emprego de violência ou grave ameaça, é circunstância que não enseja a aplicação da atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, “d”, do CP). O reconhecimento da autoria do fato típico é pressuposto da confissão espontânea e, no caso em tela, a Turma entendeu que se tratou em verdade de uma estratégia de desclassificação da conduta para roubo. Discordo drasticamente desse entendimento, sobretudo quando analisado em cotejo com o julgado anterior que também induziria a uma tentativa de abrandamento da pena em abstrato, mas se reconheceu a aplicação da atenuante.
(13) DIREITO PENAL. DIFERENÇA ENTRE ESTELIONATO E CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. REsp 1.405.989-SP, Rel. originário Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. para o acórdão Min. Nefi Cordeiro, julgado em 18/8/2015, DJe 23/9/2015.
6ª Turma – Configura o crime contra o Sistema Financeiro do art. 6º da Lei 7.492/1986 – e não estelionato, do art. 171 do CP – a falsa promessa de compra de valores mobiliários feita por falsos representantes de investidores estrangeiros para induzir investidores internacionais a transferir antecipadamente valores que diziam ser devidos para a realização das operações. Vejamos algumas diferenças existentes no crime contra o SFN retroindicado: (i) constitui crime formal, e não material. (ii) não prevê o especial fim de agir do sujeito ativo, (iii) não exige, como elemento obrigatório, o meio fraudulento e (iv) apenas a prestação de informação falsa ou omissão de informação verdadeira.
(14) DIREITO PENAL. GUARDA DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO COM REGISTRO VENCIDO. APn 686-AP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 21/10/2015, DJe 29/10/2015.
Corte Especial – Manter sob guarda, no interior de sua residência, arma de fogo de uso permitido com registro vencido não configura o crime do art. 12 da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento). Apesar de se amoldar ao tipo objetivo do dispositivo mencionado, deve-se destacar que em relação ao elemento subjetivo, não se pode asseverar a presenca do dolo do agente que procede ao registro e deixa expirar o prazo, ocasião em que é flagrado em tal circunstância. Conforme entendimento do STJ, trata-se de uma irregularidade administrativa; do contrário, todos aqueles que porventura tiverem deixado expirar prazo semelhante terão necessariamente de responder pelo crime, o que é absolutamente desproporcional.
Vamos em frente!
Grande abraço,
Pedro Coelho, Defensor Público Federal
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