Caros leitores do blog, comentaremos neste post alguns aspectos da reclamação constitucional, tema importantíssimo não só na preparação para o próximo concurso, mas na vida prática dos membros da AGU.

Em princípio, destaca-se que a reclamação surgiu como expressão dos poderes implícitos dos tribunais, sendo positivada nos arts. 102 e 105 da CRFB-88, que versam, respectivamente, sobre a competência do STF e STJ. O CPC/73, por sua vez, nada dispunha a respeito da reclamação, cuja previsão, em seara infraconstitucional, era disciplinada nas Leis n° 8.038/90 (procedimento dos feitos originários do STF e STJ) e 11.417/06 (disciplina do enunciado de Súmula Vinculante).

A doutrina diverge quanto à natureza jurídica. Há quem defenda se tratar de correição parcial, recurso, ação, incidente processual, direito de petição e, até mesmo, sucedâneo recursal.

Sobre este aspecto, em provas abertas, é importante que o candidato demonstre familiaridade da controvérsia, com explicitação das possíveis naturezas do instituto e menção de que a corrente majoritária da doutrina segue a linha de que é ação constitucional, visto que: a) exige provocação de uma das partes ou do MP, em petição assinada por procurador, inscrito nos quadros da OAB, ou com legitimação ex lege, para fins de: c) preservar a competência do Tribunal; d) garantir a autoridade de suas decisões e do STF, em controle concentrado de constitucionalidade; e) a observância de enunciados de Súmula Vinculante; f) respeito a precedente consolidado em julgamento de casos repetitivos ou, ainda, em incidente de assunção de competência. As referidas hipóteses de cabimento estão positivadas no art. 988 do Novo Estatuto Processual.

Noutro giro, consigne-se que o STF não seguiu a tese defendida pela doutrina majoritária. Adotou a posição da professora Ada Pellegrini Grinover, por ocasião do julgamento da ADI n° 2212, julgado em 2003, no sentido de que a reclamação situa-se no âmbito do direito constitucional de petição, o que mereceu diversas críticas, ante a injustificável vedação do seu manejo perante os Tribunais Regionais Federais. Consoante o Pretório Excelso, o cabimento perante estes tribunais dependeria de previsão na Constituição Federal, que é silente neste aspecto. Diversa era a situação dos Tribunais de Justiça, bastando previsão nas respectivas Constituições Estaduais.

Ocorre que o candidato, hoje, deve estar atento à possibilidade de revisão deste entendimento, pelo STF e STJ (de que a reclamação é direito de petição), porquanto é possível defender que houve uma superação autêntica do posicionamento, na medida em que o CPC-15 inovou ao delegar a qualquer tribunal a competência para o conhecimento e julgamento de reclamações e, além disso, catalogou o instituto no capítulo pertencente às “ações”.

Seria possível o manejo após o trânsito em julgado?

Sobre o tema, registre-se que o NCPC, alinhado à jurisprudência do STF, obsta a adoção da reclamação após o trânsito em julgado do processo, sendo este o último marco de seu exercício:

“Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:
(…)
§ 5o É inadmissível a reclamação proposta após o trânsito em julgado da decisão.”

Temos que interpretar adequadamente a norma citada. Quer ela dizer que não cabe reclamação para combater determinada decisão proferida nos autos (decisão reclamada), que usurpa a competência ou ofende decisões vinculantes, quando consolidado o trânsito em julgado, na medida em que o remédio constitucional não é sucedâneo de coisa julgada. Não se pode confundir, contudo, a situação em que a reclamação é ajuizada para que, por exemplo, o juízo de origem respeite a decisão do STF proferida nos autos, que transitou em julgado e está sendo processada sem observância de seus critérios.

O STJ adota o mesmo posicionamento, ou seja, de que a reclamação não é sucedâneo de ação rescisória, conforme se extrai da ementa a seguir:

“RECLAMAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO.
CONTRATO FUNDADO EM CÉDULAS DE CRÉDITO COMERCIAL COM RECURSOS DO FUNDO CONSTITUCIONAL DO CENTRO-OESTE (FCO). QUESTÕES PRELIMINARES AFASTADAS. ENCARGOS DE INADIMPLEMENTO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS QUE FOI VEDADA NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DO TRIBUNAL ESTADUAL EM AÇÃO RESCISÓRIA QUE CONTRARIA A AUTORIDADE DA DECISÃO PROFERIDA POR ESTA CORTE. PEDIDO JULGADO PROCEDENTE.
1. A reclamação, nos termos do art. 105, I, f, da Constituição Federal e do art. 187 do RISTJ, é cabível para preservar a competência do Tribunal ou garantir a autoridade de suas decisões.
2. O terceiro interessado tem legitimidade para o ajuizamento de reclamação perante o STJ, na hipótese em que o resultado do julgamento proferido pela decisão impugnada vier a atingir interesse jurídico do qual é titular.
(…)
4.De acordo com precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal, a reclamação constitucional é instituto que não tem natureza jurídica de recurso, nem de incidente processual, mas sim de direito constitucional de petição, contemplado no art. 5º, XXXIV, da Carta Magna. Assim, a sua utilização está limitada apenas à não ocorrência do trânsito em julgado da decisão reclamada, nos termos da Súmula 734 do STF, o que não se verifica, na espécie, não havendo que se falar, portanto, em sua intempestividade.

(…) (Rcl 25.903/MS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/04/2016, DJe 19/04/2016). (grifo nosso)

Um alerta final se faz necessário. O CESPE abordou o assunto na prova para Procurador Federal de 2013, no item 200, que continha a seguinte assertiva:

“O STF veda o uso da reclamação quando tiver ocorrido o trânsito em julgado do ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do próprio STF, ao passo que, para o STJ, o uso da reclamação constitucional, que difere da correição parcial, pode ocorrer mesmo após o trânsito em julgado da decisão reclamada.”

O enunciado foi considerado correto o que, aparentemente, pode estar em conflito com a atual jurisprudência do STJ, consoante o precedente supracitado. Portanto, bastante atenção ao tema!

EBEJI

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