STF decidirá se Tribunal de Justiça pode criar cargos de Procurador dentro do seu quadro de carreira.
1. ENTENDA O CASO
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo criou, por meio de Lei Estadual nº 14.783/2012, dois cargos de Advogado inseridos no seu quadro próprio de pessoal. Ato contínuo, promoveu concurso público para o preenchimento dos cargos mencionados.
O edital do concurso, você encontra aqui: https://www.pciconcursos.com.br/concurso/tribunal-de-justica-sp-2-vagas-1004
Diante do fato, a Associação Nacional dos Procuradores do Estado (ANAPE) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5024) no Supremo Tribunal Federal contra a Lei estadual mencionada. Segundo a Anape, a lei é incompatível com o caput do artigo 132 da Constituição da República, que atribui aos procuradores, admitidos mediante concurso público, a representação judicial e a consultoria jurídica das unidades federadas.
CF. Art. 132 – Os Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica das respectivas unidades federadas.
Como é do conhecimento comum, o Tribunal de Justiça não tem personalidade jurídica própria, integrando a estrutura do Estado respectivo, apesar da independência do Poder Judiciário, escolheu a Constituição Federal, que a representação judicial e consultiva dos entes estatais ficassem a cargo de suas procuradorias estaduais.
Portanto, a questão jurídica posta é: pode, ou não, o TJ/SP, criar cargo próprio de Advogado, fora da carreira de Procurador do Estado de São Paulo. A questão secundária é: se sim, quais as atribuições desses novos advogados?
2. O QUE PENSA A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PROCURADORES DO ESTADO
2.1. USURPAÇÃO DE PRERROGATIVAS EXCLUSIVAS. AUSÊNCIA DE LIMITE DE ATUAÇÃO. CARREIRA TÍPICA DE ESTADO
A lei, em essência, desloca atribuições conferidas constitucionalmente aos Procuradores do Estado para uma estrutura paralela de representação judicial e extrajudicial de um dos órgãos do Estado de São Paulo, no caso, o TJ/PB.
O argumento encontra fundamento no art. 2º d lei guerreada que informa que a área de atuação dos advogados “será diversificada, podendo abranger todas as áreas do Direito”, com isso, não há limitação de atuação para os Procuradores do TJ/SP.
A associação diz, ainda, que os cargos foram criados para o exercício de funções típicas de carreira de Estado, diz, na ação que “fica patente que a lei paulista teve a clara intenção de acometer aos ocupantes desses cargos o exercício das tarefas que a Constituição da República reserva com exclusividade aos procuradores do estado”.
2.2. O ESTATUTO DA ORDEM E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Parece patente, inclusive, que a lei paulista viola o Estatuto da OAB e a Constituição Federal em outros dispositivos.
O EOAB veda o exercício da advocacia aos ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a qualquer órgão do Poder Judiciário.
Art. 28. A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes atividades:
IV – ocupantes de cargos ou funções vinculados direta ou indiretamente a qualquer órgão do Poder Judiciário e os que exercem serviços notariais e de registro;
Estamos, portanto, diante de um problema. Se o exercício da advocacia, ainda que pública, exige a inscrição na OAB e o Estatuto diz ser incompatível com essa inscrição ocupar cargo no Poder Judiciário, como admitir a existência de um Advogado do Poder Judiciário?
A Constituição Federal, por sua vez, diz:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
(…)
XVI – organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões;
O processo, no STF, está sob a relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso.
3. O QUE PENSA A AGU
Por comando constitucional, a AGU foi instada a se manifestar sobre a ADI 5024.
Ao contrário do que pensa a ANAPE, a AGU entende que a lei não possui vício de constitucionalidade. Em sua manifestação, em síntese, a AGU disse:
a. A lei paulista deve ser interpretada em sentido restrito, de forma que a atuação dos Advogados do TJ/SP deve se dar apenas em situações conflito judicial entre o órgão judiciário e outras entidades dos Três Poderes.
b. Destaca que o STF admite a existência de carreiras jurídicas especiais, que tenham a finalidade derepresentar judicialmente os Tribunais, nas hipóteses em que se evidencie conflitos entre a instituição jurídica e órgãos dos Três Poderes.
c. Diz que a lei não ofende a Constituição, apenas criou dois cargos de advogados para o quadro de servidores do TJ/SP, cuja função deve ser exercida em regime de dedicação exclusiva e apenas assessorar o Tribunal em questões de interesse institucional, observados os limites constitucionais previstos.
d. Em suma, a atuação de tais advogados resume-se à defesa da autonomia e independência do Tribunal estadual, permitindo o exercício de consultoria e de assessoramento jurídico dos órgãos inseridos na estrutura do Poder Judiciário do estado.
4. DOS REFLEXOS DO CONCEITO DE FAZENDA PÚBLICA
A ação direta de inconstitucionalidade, nesta data (26/1102013) está pendente de manifestação do Ministério Público Federal e o processo está sob a relatoria do Ministro Luis Roberto Barroso, ex-Procurador do Estado.
A depender da interpretação firmada pelo STF, precisaremos, em termos processuais, rever o conceito de Fazenda Pública em juízo, especialmente para nele albergar a representação judicial de órgãos em razão do exercício de sua autonomia em conflito com os demais poderes do Estado.
Se assim entender o STF, vários desdobramentos precisam ser esclarecidos, principalmente os que tratam das prerrogativas da Fazenda, aplicáveis ou não, a essa nova modalidade de defesa do Estado por meio de representação autônoma de um de seus órgãos.
Sem falar em todas as características especiais que envolvem a atuação da defesa do Estado.
A fim de evitar elucubrações que podem não ser confirmadas pela Corte máxima, aguardemos o parecer do MPF para atualização do presente post.
De nada adianta esmiuçar aqui todas as discordâncias deste Advogado Público acerca da criação de um figura estranha ao conceito de Fazenda Pública e a forma de sua representação, se o MPF e o STF discordarem da AGU, contudo, vale a pena acompanhar a presente ADI.
Forte abraço!
Ubirajara Casado
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