O STJ aprovou a nova Súmula 611 que tem o seguinte teor:
“Desde que devidamente motivada e com amparo em investigação ou sindicância, é permitida a instauração de processo administrativo disciplinar com base em denúncia anônima, em face do poder-dever de autotutela imposto à administração.”
Vamos “picotar” a Súmula em três partes para entendermos melhor o seu alcance.
Primeira parte “é permitida a instauração de processo administrativo disciplinar com base em denúncia anônima”.
O art. 144 da Lei 8.112/90 parece não sustentar essa ideia quando diz: As denúncias sobre irregularidades serão objeto de apuração, desde que contenham a identificação e o endereço do denunciante e sejam formuladas por escrito, confirmada a autenticidade.
Assim, parece que está claro que o Administrador só pode apurar irregularidades quando as denúncias forem formuladas com a devida identificação do denunciante.
Contudo, o que levou o STJ a, analisando friamente, afastar o art. 144 da Lei 8.112/90? Entramos com isso na segunda parte, qual seja, o poder-dever de autotutela imposto à administração, especialmente em razão dos dispostos na Lei 9.784/99, vejamos:
Art. 5º. O processo administrativo pode iniciar-se de ofício ou a pedido de interessado.
Art. 29. As atividades de instrução destinadas a averiguar e comprovar os dados necessários à tomada de decisão realizam-se de ofício ou mediante impulsão do órgão responsável pelo processo, sem prejuízo do direito dos interessados de propor atuações probatórias.
Assim, analisando o art. 144 da Lei 8.112/90 com o disposto nos artigos 5º e 29 da Lei 9.784/99, o STJ entendeu que a Administração não pode simplesmente ignorar uma denúncia anônima, que existe poder-dever de agir, contudo, esse agir é que não pode ser desmedido, levando em conta, exponencialmente, a presunção de inocência do servidor público. No dizer da doutrina[1]:
“No processo administrativo disciplinar originário, o ônus de provar que o indiciado é culpado de alguma irregularidade que a Administração lhe imputa pertence evidentemente a esta. Sendo a Administração a autora do processo a ela cabe o ônus da prova, na medida em que ao autor de qualquer ação ou procedimento punitivo sempre cabe provar o alegado.”
Esse entendimento nos leva a terceira parte de nosso “picote” da Súmula quando diz “desde que devidamente motivada e com amparo em investigação ou sindicância”, ou seja, a instauração do PAD depende, previamente, de dois elementos:
a) motivação; b) proveniente de investigação preliminar formal ou sindicância.
Registre-se que a investigação preliminar formal é procedimento anterior à apuração propriamente dita, com o objetivo único de formar o convencimento da autoridade administrativa sobre a existência ou não de indícios de autoria e materialidade que justifiquem a eventual apuração de irregularidade por meio próprio. Assim, ocorre normalmente sem a presença de acusados ou interessados. Configura o instituto, como apresentado, momento de convencimento de juízo de admissibilidade prévio aos procedimentos de apuração que se encontram descritos na Lei nº 8.112/90 em seu art. 143, ou seja, sindicância ou processo administrativo disciplinar, quando diz “a autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar, assegurada ao acusado ampla defesa”.
Assim, o que a Súmula 611 do STJ nos ensina, portanto, é que a denúncia anônima provoca o poder-dever de agir da Administração, contudo, eventual PAD nela embasado deve ser precedido de investigação ou sindicância devidamente fundamentada.
Picotando ficou mais fácil de entender!
Forte abraço a todos!
Ubirajara Casado
[1](Ivan Barbosa Rigolin, Comentários ao Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis, Saraiva)
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